segunda-feira, 22 de abril de 2024

ENCARNAÇÃO

Texto de autoria de AustMathr com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.  LEIA O TEXTO AO SOM DA MÚSICA DO VÍDEO POSTADO NO FIM. Sem ela, a vida seria um erro (Friedrich Nietzsche)

Adiemus, Adiemus!
Aproximem-se todos
Vocês que são da Itália e de Portugal
Querem filhos franceses ou brasileiros?
Abram os olhos porque vocês já estão no paraíso
Abençoada seja esta terra que vos acolheu


Adiemus, Adiemus!
Entrem numa casa de espanhola sem a filha saber
Perguntem às mães, às avós e aos seus cães vivos e mortos
Querem ilusionismos houdinianos ou cândidas adivinhações?
Mantenham os olhos fechados porque vocês estão dentro de um sonho
Abençoado seja este sono que vos repousa


Adiemus, Adiemus!
Ousem intrometer-se num enterro da aristocracia negra em Paris
Peçam para deportar vosso caixão do velho para o novo mundo
Querem filhos submissos ou libertos?
Abram os olhos porque a escravidão foi abolida
Abençoada seja esta miscigenação que vos contemplou 


Adiemus, Adiemus!
Pasmem com o veludo púrpuro que forra todas as paredes
Digam adeus às aulas de balé e língua estrangeira
Querem filhos de reis ou de trabalhadores?
Fechem os olhos para os que vos deserdaram 
Abençoados sejam os que a vós se irmanaram


Adiemus, Adiemus!
Cantem com mãos erguidas ao céu
Façam estalar todas as castanholas das ciganas espanholas
Querem dançar flamenco e baião ao mesmo tempo?
Abram os olhos para o verde exuberante
Abençoado seja o amarelo de nossas bandeiras 


Adiemus, Adiemus!
Deixem os céus tempestuosos
Venham para os solos férteis
Seus filhos são todos estrangeiros
Embarquem nos mesmos navios negreiros
E aportem na água, na terra e no fogo prometido aos mortais


domingo, 21 de abril de 2024

PURPLE HAZE

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                                                                                           Texto de autoria de AustMathr com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.

I'm calisthenic, You're my Lucy in the Sky with Diamonds, My heroin, My tight leash has been released, Freed rein to my imagination, My social phobia and my shyness gone without a shrink, Now I inhale your purple haze, And mix it with mine, I reject all types of dilutions and overflow the canvas where you, Painter, Try to cloister me together with other nuances, I can make you a tameless beast, Make you travel to the next high, Cross the rabble that surrounds you, Bordered by flowering ins and outs, Jaunty on the wings of ferraginous kaleidoscope eyes, That's my gleaming yellow, That rapes your white corolla, Intensifies your crimson, Sharpens your dark red tending to violet, Blinds you like a flow of metal in fusion, All your heliotropes of fading suns, I can make you me ill, For you my nose stretches out, My hump doubles up, My belly swells up, My clothes multicolor, My utterance shakes and screeches, For you I'm a fake hero, With all the flashy braggadocio behaviour and senseless acts of a fool, Crafty and snaky, With no dignity, I can be your clown in the midst of any loneliness, Any multitude.

quinta-feira, 18 de abril de 2024

STONED MEDLEY

Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. LEIA O TEXTO AO SOM DA MÚSICA DO VÍDEO POSTADO NO FIM. Sem ela, a vida seria um erro (Friedrich Nietzsche);

Minhas ideias e pensamentos ocorrem ao acaso, Agem com indiferença e descaso, São muito convenientes e vêm a propósito, Elas referem a minha mente ao achado e à perda do meu juízo, Um desacerto infeliz, Com tremendo azar, Li o jornal hoje, Meu amor, Uma mulher morreu por um bala perdida no Rio, Embora a notícia fosse tão triste, Tive que sorrir, Meu amor, Antes ela do que uma embrionária democracia, Esta porra é como uma joia perdida, Uma carta extraviada, Humanidade pervertida, Gente viciada, Amizade destruída, Como um navio irrecuperável, Tudo sem esperança, Demência terminal, Aquela mulher era extremamente apaixonada por baladas, Navegava aflita pela internet, Num lugar distante, Privada de fortuna, Doía-lhe fundo a perda de seu marido, Doía-lhe fundo a falta de um macho ou fêmea, Era como extravio de documentos e dinheiro, Como aniquilamento de vida e matéria, Deixando de ganhar uma batalha, Um jogo, Uma oportunidade, Foi danação da alma, Seu credor sofre prejuízos em consequência da concreta diminuição do patrimônio dela, Pela cessação de lucros que os dois deviam ter recebido, Vi a foto de outra mulher no jornal hoje, Meu amor, Ela teve o corpo violentado até a morte, Ela não percebeu que o homem era um psicopata, Muita gente a conhecia, Mas ninguém tinha certeza se ela era esposa de algum juiz do STJ, Diligenciava inutilmente eleger-se senadora, Aos 40 anos, Diante da desolação paterna, Provocada pela orfandade, Procurava o suicídio, Com o que podia amealhar podia empreender a montagem de seu próprio negócio, Suas pupilas negras, Mortas e vivas na perdição, Pareciam pássaros dentirrostros exercitando as asas para voar, Você viu a insana fantasia dessa mulher, De arriscar-se num mar com vela e remo? De experimentar quatro roscas num parafuso e nenhum servir? É o coisa-à-toa quem instiga as boas almas para o mal, As felicidades oferecidas por ele não deveriam causar desejo à mulher, O tinhoso procurou seduzir o mitológico Jesus, Mas ele instaurou uma desautorizada ação de despejo do tinhoso em pleno deserto, O que ocorreu com aquela mulher foi uma medida da flutuação dos resultados das medidas iteradas de uma grandeza realizada por um processo isento de vício, Afinal, Quem se presta a indicar a conexão entre diversas corrupções, Porque estão presentes em mais de uma e são de natureza tal que seria improvável que diferentes corruptores pudessem nelas incorrer independentemente? Eles são excêntricos sistêmicos existentes nas graduações, Como nos círculos astronômicos, Por não serem coincidentes os centros dos círculos e das suas graduações, Eles são uma aproximação modular de diferença entre o limite de uma corrupção e o valor que se aceita para corromper, Assisti a um filme hoje, Meu amor, O governo brasileiro acabara de se moralizar, Muita gente deixou a sala do cinema, Mas eu precisava ver até o fim, Porque já tinha lido o livro, Como eu gosto de te deixar turned in, Meu amor!, O que aconteceu com aquela mulher foi um deslize que se comete num cálculo aproximado quando se efetua um arredondamento, Pois no julgamento de uma hipótese estatística, Ela rejeitou a hipótese por sendo ela verdadeira, Portanto, De primeira gravidade, Hoje acordei às cinco da matina, Meu amor, Me arrastei até o banheiro, Desci para queimar um pacau, Era cedo demais para curtir sozinho, Voltei logo para a cama, Mas você ainda roncava, Então tomei um azulzinho maravilha, Fiz um 5 contra 1, Você resmungou alguma coisa, Fiz a cobra cuspir e dormi novamente, O que ocorreu com aquela mulher foi que, No julgamento de uma hipótese estatística, Ela rejeitou a hipótese por sendo ela falsa, Portanto, De segunda gravidade, Pense na média dos valores absolutos de um conjunto de erros acidentais, Num desvio padrão de um conjunto de erros acidentais, Vou ver o noticiário hoje à noite, Meu amor, Haverá trilhões desviados dos cofres públicos, E embora será incalculável a quantidade de notas, Eles contarão uma por uma, Então eles saberão quanto mais dinheiro será necessário para exaurir a nação, Quando isto está presente numa corrupção mas não em outra, Se permite reconhece-las como independentes, Decorre de um vício num processo de medida, Não tendo, Por isso, Caráter aleatório, É constante, Pode ser um engano cometido pela mídia na abordagem original, Pode ser um piolho, Jamais vou cair no erro de te deixar turned off, Meu amor. 


MONOCROMIA DOS CÂNTAROS DE CRISTAIS




Texto de autoria de AustMathr com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.


É assim que quero que você me veja, Sou um pássaro que voa alto, E corta o solo numa rasante, Sem nunca precisar pousar, Sem nunca precisar plainar, E te arrebato em pleno ar, 

É assim que um homem como eu te almeja, Escalo até  o pico de um penhasco e me jogo no abismo, E você nunca me verá vacilando em queda livre, Nunca verá meus olhos com medo de se esborrachar, 

Não será suficiente para mim você me observar, Não será suficiente para mim você me enquadrar, Não será suficiente para mim você me fotografar, Não será suficiente para mim você me revelar, 

É assim que você quer que eu te veja, Você é um vento que sopra forte, Risca a noite com raios, Troveja e faz o céu estremecer, Ruge como uma tempestade de se enfurecer, E acerta em cheio o vazio de me querer, 

É assim a mulher que um homem deseja, Você salta do alto da vida para a morte, E nunca verei você fazer ensaios, Nunca verei você arrefecer, 

Não será suficiente para você um mundo sem mudança, Não será suficiente para você uma vida só de esperança, Não será suficiente para você um presente que não avança, Não será suficiente para você um futuro que não se alcança, 

É assim que quero viver, É assim que eu quero que você viva por nós, Sou um sol que brilha para iluminar, Sem precisar arder, Sem precisar proteger, É assim o homem que uma mulher quer ter, É assim que o mundo quer nos ver a sós, Subindo até o último degrau até nos desequilibrarmos, Até escorregarmos, Até cairmos e nos despedaçarmos, 

Não me basta ser apenas um homem sobrevivente, Não me basta ser apenas um animal inteligente, Não me basta apenas parecer valente, Não me basta  apenas te ser suficiente, 

É assim que quero minha mulher, É assim que quero que você me veja como uma miragem, Sou névoa de ansiedade para ver o dia raiar, Que cai da escuridão até a manhã orvalhar, Até o sol dissipar, 

É assim que você me quer, É assim que você quer registrar minha imagem, Na monocromia de seu olhar, É assim que você quer me amar, 

Não será suficiente para você não parar de fazer amor, Não será suficiente para você absorver todo meu calor, Não será suficiente para você me fartar com seu ardor, Não será suficiente para você fazer muito sexo mesmo com muita dor, 

É assim que você quer ser, É assim que você quer que eu te veja, Sou um cachorro vira lata longe da casa que me enxotou, E você nunca me verá voltar, Nunca me ouvirá ladrar, Nunca me verá mendigar, 

É assim que você quer me ter, É assim que uma mulher como você me almeja, Mergulho até o fundo do mar, E você  nunca me verá desmaiar, Nunca me verá me afogar, 

Não será suficiente para mim posar para o teu olhar, Não será suficiente para mim olhar para seu andar, Não será suficiente  para mim andar no seu caminhar, Não será suficiente para mim caminhar no seu lugar.

Somos cântaros de cristais, Quebramos fácil demais, A monocromia de nossos atos inconsequentes, Não desbotará as cores que ainda recobrem nossas almas incandecentes.

segunda-feira, 15 de abril de 2024

O QUE FALTA NO REINO DOS CÉUS


Texto de autoria de AustMathr com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. 

Era uma tarde de inverno. Da janela via-se o céu azulado, mas lá fora estava gelado. Oras, pensei, aqui não cai neve, as mãos sem luvas não congelam, e do estacionamento a qualquer estabelecimento o vento frio que aumenta a sensação térmica não é tão torturante como o que sopra na região dos grandes lagos em Janeiro. Eu me preparava para sair quando a TV anunciou o excelente filme Reino dos Céus, que aqui no Brasil saiu como Cruzada. Resolvi ficar em casa e fui muito feliz com minha decisão. Depois da sessão de cinema, resolvi ouvir música e selecionei a gloriosa versão do Chandeen da canção In Power We EntrusThe Love Adocated do Dead Can Dance. Foi estranho como essa canção me levou imediatamente de volta ao filme que eu acabara de assistir e, mais estranho ainda, foi o que me veio à mente: Eu sempre vejo a cultura como uma mulher indefesa à mercê dos machistas. Às vezes sou cristão, às vezes não. Às vezes simplesmente ignoro um ataque dos misóginos, ou, então, me limito a retribuir suas agressões ao sexo frágil com uma homenagem à transcendência humana. Porém, às vezes, eu também atiro minhas pérolas aos porcos e aos cães. E esse é o grande risco que corro aqui. Antigamente, os porcos só pisoteavam nossas preciosidades, hoje eles as roubam. Lembrei-me, então, do filme Cruzada que acabara de assistir, e das atrocidades que se praticaram na terra santa em nome de deus em tempos longínquos. Esquecendo-se de mim e dos homens, tentei extrair daquela brutalidade alguma beleza inata ao ser humano quando este cavalga completamente nu e sem nenhum estandarte ideológico. Então, tentei transformar em palavras tudo o que minha alma sentia: A beleza se avista onde o oceano se confunde com o firmamento, De longe, vozes humanas a saúdam com brados efusivos, O som lhe chega aos delicados ouvidos, E ela o acolhe com ternura, Suaviza sua avidez e seu tom, E o sopra de volta com a brisa que o trouxe com brandura, As vozes humanas retumbam em coro e com mais ardor, A beleza cerra seus olhos, Relaxa a sua fronte, Descontrai seu sorriso, E se deixa embalar pelo som mundano e eufórico, As vozes assomassem-se, E a elas se juntam mais graves e agudos, Mais êxtase e clamor, A beleza se mantém impassível e atenta, Ouve e se acalenta, As vozes humanas se exaltam, Vão além dos limites da linha do horizonte, A beleza as traz de volta ao mirante, E graciosamente se move em suas direções como uma nuvem entregue às monções, As vozes sentem suas gentis pulsações, Percebem que ela emana meiguice à distância, É mais bela do que aparentava lá no fundo do céu, É o seu olhar que carrega sorrisos contagiantes, São seus lábios que sussurram como meninas dos olhos irradiantes, São as maçãs de seu rosto que exalam fragrância etérea, São seus cabelos que dão contornos à sua feição singela, É o seu semblante plácido que dá expressão à sua beleza, As vozes humanas emudecem, E se arrebatam com tão doce criatura, A beleza contagiada pelo calor humano, Baila ao redor das vozes, As envolve com afagos que chegam à alma, Seu olhar resplandece, E infunde mais luz tênue ao sol poente, Seus gestos delicados encantam as águas do mar, E se elevam até a lua crescente, Sua boca toca as vozes humanas, E as enche de carinho jamais recebido antes, Seus cabelos se desfraldam ao relento do entardecer, Sua leveza se esgueira suavemente até o novo amanhecer, E as vozes humanas embargadas, Soluçam e balbuciam, A beleza lhes toca os lábios com dedos singelos, E deixa seu silêncio comovente penetrar em suas entranhas, Até que elas descubram seu reino interior, Até que ela exteriorize toda sua celestial subserviência ao amor.



sábado, 6 de abril de 2024

GUERREIRA DE MÃOS SAGRADAS

Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.

Ela vive e luta de sol a sol, Sendo lhe dada ainda ver morrer o poente na boca da noite, Dando lugar a finabs e incertas luzes que mal bruxuleiam pequeninas no céu da meia-luz crepuscular, E que calam tristezas e angústias como segredos, De lágrimas inquietas e preocupadas derramadas na solidão que os astros guardam nas altas horas, E qual mar revolto em ondas furiosas, Sacia a pleno a sede ardente dos justos e injustos, Sem nunca deixar passar-lhes na mesma idade, A felicidade em suas mãos, Mãos intrépidas e balsâmicas, Que seguraram o ódio e o terror, Deixando escorrer de seus olhos um tudo-nada de gotas de pranto contido, Mãos de anéis que obram as salvações de todos no mundo com temor e tremor, Orando todas madrugadas com fervor, Procurando silenciar o bem que na sua alma mora, E as ameaças e os perigos que outras não podem suportar, Mas que Deus está a observar, E se Deus estava preparado para regozijar seus olhos à distância, Foi-lhe mais aprazível ceder-se de perto à coragem desta guerreira de espírito desarmado que jamais lhe pediu para seu clamor.

terça-feira, 2 de abril de 2024

A COLHEITA DE PERSÉFONE NO MUNDO


Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98
A aglutinação não exala perfume nem se dobra ao vento, Tem voracidade por sangradura que se impregna no ar sem brisa, O alvoroço não está nos prados alinhados, Mas em intricados e sinuosos caminhos de pedras, Para se ouvir o ofego da única flor é preciso apartar-se da algazarra animalesca e olhar do alto, A movimentação abaixo é lenta, ardilosa e sorrateira, Pontuando o sofrimento da divindade que veste carne humana, Resignada com o destino imposto pela sua própria criação, Arrasta-se pesadamente sob escárnio mundano e lamentação celestial, Cresce a indignação pelo impensável e implacável, Assomam-se e elevam-se as lamurias à altura de um cadafalso, Prostradas e ultrajadas sua glória e onipresença, Rende-se às garras de seus algozes e ao canto consolador dos que lhe acompanham na dor e no silêncio, Mãe nossa que estais no mundo, Purificado seja vosso martírio, Voltai a nós vosso poder, Longe da terra e próximo das alturas, Para vossas pétalas arrancadas aos pares, Duplas vibrações de mirra e aloés, Para vosso broto desnudo e exposto à humilhação, Um bálsamo de nardo da Índia onde fostes ungida por mãos santificadas, Para vosso último suspiro de solidão e abandono, Nossa boa vontade para vos receber na paz que cultivastes nos jardins do universo, E assim está consumada vossa colheita neste orbe.


ABAIXO DO DÉCIMO NÍVEL


Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. 

Tem pessoas, Tem mentes, Abaixo do nível, Tem um pouco de tudo, Onde tudo é possível, Fragmentos de pensamentos, Inteirezas de vidas, Vivências de naturezas, Antes dos tempos, Antes das mortes, Muitas chuvas e sóis, Muitas realezas, Tem sonos pesados, Sonhos resplandecentes, Tem flutuações, Elevações, Projeções à frente, Tem sonos leves, Voos descendentes, Tem saltos profundos, Sentem e não sentem, Tem voos planados, Começos de vertentes, Tem corpos, Plenitudes, Fluências de gentes, Espíritos espiritualizando, Dimensões viventes, Abaixo do décimo nível, Aprofundam os inconscientes, Tem aterragens, Solidezes, Andanças constantes, Entes sem pressa, Mentes conscientes, Tem seres vígeis, Seres oníricos, Noites, Dias, Os todos empíricos, Tem flores dos desconhecidos, Abaixo do nível, Comoções nas revelações, Onde tudo é possível, Tem femininos, Masculinos, Machas, Machos, Tem voos pairando, Pensamentos pensando, Sem cachas, Sem cachos, Tem cognições, Absolutismos substituindo, Ovos cósmicos, Rebentos expandindo, Tem mártires, Primórdios, Começos de caos, Explosões de  estrelas, Supernovas de naus, Visitantes involuntárias, Tem ideias mudadas, Onde tudo funciona, Onde são amadas, Amadas, Tem decisões, Conexões, Fêmeas, Fêmeos, Tem muito de tudo, Ovos cósmicos gêmeos, Décimo nível abaixo abrindo os portais, Onde superfícies e profundidades não são iguais, Tem Evas, Pessoas, Adãos, Dionísios, Maçãs nas bocas, Tem expulsões dos Elísios, Décimo nível abaixo abrindo os portais, Onde superfícies e profundidades não são iguais, Pessoas, Mentes, Abaixo do nível, Um pouco de tudo, Onde tudo é possível, Tem decisões, Conexões, Fêmeas, Fêmeos, Horizontes de eventos, Buracos negros trigêmeos, Décimo nível abaixo abrindo os portais, Onde superfícies e profundidades não são iguais, Pessoas, Mentes, Abaixo, Níveis, Poucos, Tudo, Possíveis, Fragmentos, Pensamentos, Vidas, Naturezas, Tempos, Mortes, Chuvas, Sóis, Realezas, Décimo nível abaixo abrindo os portais, Onde superfícies e profundidades não são iguais.

sexta-feira, 29 de março de 2024

DINAS - SEMPRE (CLAUDIA, AOS 25 ANOS, RECEBE DEDICATÓRIA DE ANÔNIMO)

Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. LEIA O TEXTO AO SOM DA MÚSICA DOS VÍDEOS POSTADOS NO FIM. Sem MÚSICA, a vida seria um erro (Friedrich Nietzsche)


Na hora suave do nascer de mais um dia, A bolsa-d'água se rompeu, De súbito, Fui jorrado num mundo que eu desconhecia, Como a mim mesmo, Onde o inexorável prazo de permanência tem esta redundante validade, Entre alegrias e dissabores, E se neles não pude vislumbrar uma boa proporção, Achei em você, Espreguiçando e sorrindo sua graça descontraída, A única razão para não amofinar-me sobre o que fora antes de ser, Hão de levar-me os desígnios em sobras do tempo, Mas ainda não vou, Como a guerreira Arya que recebeu da bruxa Melisandre esta pergunta: O que dizemos ao Deus da Morte?, E Arya respondeu: Hoje não!, Não até te amar tudo o quanto posso, Se nossas vidas fossem incontáveis como as estrelas no universo, Eu faria arte com o acaso e sortilégios com a providência, E viajaria até a última galáxia, Para lhe trazer uma flor impensável, Tanto quanto é inigualável seu corpo abstraído alinhando-se com seu meigo olhar, E quando voltasse numa fração de eternidade, Encontraria sua beleza interior ainda ao meu lado, Mas como não somos donos de nossos destinos, E não sabemos se teríamos um ao outro se retornássemos de nossas mortes, Só podemos nutrir o amor presente, Aumentando-lhe as proeminências que acalmam, Endoidam, Elevam, Se entregam, E cantam esta sublime melodia, Que transcende de nós para fora do cosmos, Jamais diga agora ou nunca, Diga Sempre!





VIDEOCLIPES SELECIONADOS POR INGLESA LUSO CHINESA - GRINDERMAN (AKA NICK CAVE)

 


APENAS UM MOMENTO



Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. LEIA O TEXTO AO SOM DA MÚSICA DO VÍDEO POSTADO NO FIM. Sem ela, a vida seria um erro (Friedrich Nietzsche)


Preciso de você um momento, Um momento de solidariedade, Para recostar-me sob as sombras das árvores que falam, gemem, farfalham e abrigam espíritos benevolentes, Preciso de você um momento, Um momento de amizade, Para soprar mais forte dentro de mim o vento pleno de palavras, visões, avisos, ruídos de forças que vagam, que atraem amigos e afastam os males, Preciso de você um momento, Um momento de fraternidade, Para me ungir com a água que se move, articula, profetiza e santifica, Preciso de você um momento, Um momento de adversidade, Para sentir frio, calor, estar na escuridão, encontrar luz e olhar para o céu todo pai que obra com a mãe terra no milagre da vida, Preciso de você um momento, Um momento de superioridade, Para comungar com o universo, sentir-me parte do todo, sentir-me deus, filho da reverência e da necessidade.

sexta-feira, 22 de março de 2024

If I ONLY COULD

 Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98

I spent all night long tossing, Turning and questioning, Racking my brains and my nonconformity, Searching for and anew, But nothing can be done about it, If I only could speak with God, I would make a deal with him, Lest your ruddy countenance turns into pale, Lest your look creeps out, So that you do not need to run, To stumble and fall, This feeling is pain that drives one insane but it does not hurt in me, Because I do not know how deep a bullet lies, This lament is a feeling that rationalizes with no reason, Because I know how impromptu fate surprises, I can spend the rest of my life, Racking my memories, But not knowing how to avoid my longing that I should long for before, I have tried to speak with God, To make a deal with him, But he would not listen to my begging, And his divinity was profane instead, And without any agreement, He left, And rose to the sky, This moment is late pain that only now suffers in me, Because I do not know what from the past is left in your heart, This torment is death that frightens but it does not die in me, Because I know how suddenly this ephemeral life is passed by and away.



ESTE VÍDEO FOI COLORIDO À MÃO POR 2.130 CRIANÇAS

ANÁLISE LITERÁRIA ESTRUTURALISTA


 

terça-feira, 19 de março de 2024

EM NOME DA MÃE

Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. LEIA O TEXTO AO SOM DA MÚSICA DO VÍDEO POSTADO NO FIM. Sem ela, a vida seria um erro (Friedrich Nietzsche) 

Você tem seu vodu, Iemanjá, Deus dará, E bramanismo hindu, Eu tenho o espírito santo enchendo-me de luz, E meu pai abandonando-me morto numa cruz, Nós temos nosso tinhoso, Candomblé, Se deus quiser, E sincretismo religioso, Eles têm o espírito santo triarcando no império romano, E o pai deles unificando o poder ocidental no vaticano, Ela tem sua Javé, Zeus, Pelo amor de deus, E xangô alafim-eché, Ele tem o espírito santificado por satã, E o pai dele em conchavo com leviatã, Deus tem seu ogum, Visigodos, Cada um para si e ele para todos, E filho nenhum, O espírito tem barbarizado tudo que é impureza, E o santo dele catequizado tudo que é natureza, O filho tem sua fêmea, Buda, Deus nos acuda, E alma gêmea, A santíssima trindade tem deus somente como pai, E a raça negra e a mulher como mãe que vem e vai.


sexta-feira, 15 de março de 2024

DEATHWATCH



Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. 

The haughty king had all that, A bag of chips, and his nabob life, Without rhyme or reason, The only two subjects, Taking the places of morticians, Mourners, Pallbearers, Gravediggers, Mass attendants of the seventh days, Pilgrims of the November 2nd deads, Now foot the bills, With nothing left, Not even a quarter to light a single candle, Not even a pale oblation of flickering light to God, The devil´s got a lot of them, In excess, All red and black, He gives them away, It pleases him a death that will not kidnap, At his zeal, His agreement with the deceased, Thus he deposits his stakes in the deathwatch of the sold soul, Not to give the tiniest chance to his arch enemy, He saturates the guard and the sentry with many red-headed vultures, Gifts that a potentate sends to another one, Sovereign keepsakes, The song chosen by the defunct echoes in distant ears, As if it is coming from an ancient greek theater accustics, It booms with stridence that annoys the two women, Thus it is hushed, Leaving room to the sound of silence, Stanching all nature voices, Like a landed UFO, In its loneliness we do not know, And this evening will be shortened, Antecipating the burial, For the account of faltering sleepness, and imprudent absences, Except for an intruder, Who remains invisible, And all he gets from the boomer is an indifferent look, Since in life, He did not notice the multiple bankruptcy of a foolish, And in the end, His replies to prayers were never heard, So the long-suffering whiners have nothing else to do but improvise a gregorian chant as their farewell, That moves the deuce, And as a sign of cynic respect, He lies his lips on the moribund´s forehead, And a stink of carrion spreads across the surroundings, Like the odor of a corpse rotting six feet under, Just another departed one who was never part of any statistics, How many ordinary citizens of the ancient roman empire died without a name? All of them! How many slaves to the glorious Athens went down to the annals of history? None of them! How many servers and usupers of the present days will continue existing for posterity?

ORGULHO


Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98

Ela passou metade da vida com amor-próprio demasiado, Outra metade desatinando uma debilidade camuflada sob a influência das primeiras impressões, Aos poucos irrompendo, E de repente fulminada por uma síncope incubada que só esperava por um sinal da natureza, Como o recuo brusco e sinistro do mar se preparando para o arrebento de um tsunami, E por uma oportunidade matreira, Como o estouro de um champanhe com um diabo de garrafa chocando sua rolha, Ela foi encurralada nas cordas pela sua própria imagem refletida num espelho e esta lhe desferiu um gancho potente como um rojão de vara que se lançou aloprado da plataforma do seu estomago até bater no teto de sua cabeça, Envolvendo-a em completa penumbra e devastando a sua psique com a força de milhares de maremotos, Do que restou de sua personalidade desintegrada não se poderia esperar nem mesmo o renascer de frágeis siriris que voam abobalhados e cambaleando em todas as direções, Batendo cabeças e soltando asas, Em busca do calor do sol poente no entardecer dos dias de verão e encontram a morte abraçados na luz dos homens, Renegar o que mais amava, A música, Para colecionar insetos, Mostra que o que restou de sua mente era bem menos que cinzas, Paradoxalmente, As opiniões de seus terapeutas iam do grandioso, Como uma jovem inteligente e capaz de governar uma nação, Passando por uma normalidade casuisticamente normal, Como uma pessoa apta a exercer atividades civis, Porém não militares, Até chegar ao medíocre, Como uma adulta com dificuldade para lidar com questões intelectuais, Mas apta para desenvolver atividades manuais que exigissem boa coordenação motora, Medíocre porque na adolescência ela ganhou o apelido de catástrofe, um King Midas In Reverse dos Hollies, Pois tudo o que ela tocava virava pó, De onde se conclui que o último diagnóstico fazia dela um zero à esquerda, Mas prometo-lhe, Esta é a última vez que lhe faço uma promessa, Vou libertar você de suas amarras e tirar você de seu casulo, Como John Lennon convenceu Prudence a sair de seu quarto para brincar, Vou livrar você de todos os seus vícios, Como as mãos do médico te livraram de seu ventre materno, Vou romper todos os seus recifes, Para você voltar a nadar em mar aberto de novo, Vou livrar você de toda a sua demência, E você se lembrará do frescor do ar que carrega uma folha de outono, Vou tirar você de dentro dessa armadura, E você voltará a flamejar como fogo que queima todos os miasmas à sua volta, Vou tirar estas vendas de seu olhos, E você chegará sem medo ao outro lado da corda bamba, Vou te ajudar a cegar seu lado cortante, Seu lado censor, Com um bisturi que talha seu orgulho.

quarta-feira, 13 de março de 2024

UM LUGAR SANTO EM ÁGUAS CINTILANTES

Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. LEIA O TEXTO AO SOM DA MÚSICA DO VÍDEO POSTADO NO FIM. Sem ela, a vida seria um erro (Friedrich Nietzsche)


Presumo, Meu excelentíssimo Alcibíades, Que minhas missivas anteriores deixaram claro a farsa que se instaurou em nosso mundo, De dias instáveis e inseguros, Agora com poderes absolutos, Que se impõe pelo medo, Pela tortura e pela execução sumária, Contudo, Observando ainda, Sob o risco de ser pego e queimado vivo, Caso esta nova missiva seja interceptada, Que poucos dela falam às caladas, E muitos tanto nela se perdem, Tendo suas vidas por ela regradas, E ainda prestando-lhe serviços, Com receio desta hedionda inquisição, Julgo oportuno dar-lhe um brevíssimo relato, Pertinente a esta inquirição, Sobre uma longa história que, Segundo um feiticeiro que agora me dá guarida, Será no futuro contada, E que a verdade dos cristãos, Não obstante este meu jogo de palavras não intencional, Na verdade não liberta, Mas aprisiona, Será no futuro conhecida e desmascarada, E isto digo-lhe não só por conta deste mago, Mas também por conta de um homem, Do qual descendo, E que disse, E isso ele passou de geração em geração até nossos dias, Desde onze gerações atrás, Que conheceu, Ainda jovem, Matias, Em Roma, Em idade adiantada, Já próximo dos cem anos, E este Matias, Sempre negou, Peremptoriamente, Ter traído seu povo, E que, Ao contrário, Tentou salvá-lo, E por ele lutou, Sendo ele de sangue real por parte de mãe, De linhagem sacerdotal, Da principal família da primeira das quatro tribos da Palestina, Abriu mão de sua nobreza, De sua condição aristocrática de um por cento da população semita, Para se juntar aos revolucionários, Que prepararam uma insurreição contra a ocupação romana, Assumiu o posto de general das tropas da Galileia, E corajosamente comandou seus homens contra as invencíveis legiões de César, Até que foi vencido por elas e preso, E em troca de sua liberdade, Tendo em vista sua ascendência sobre os demais, Seu domínio do Grego, Do Hebreu, Do Aramaico e do Latim, Prontificou-se a levar as tropas romanas a todos os focos de resistências, Com o intuito de convencer seus compatriotas a se renderem, Visto que os romanos detinham um poder devastador, E certamente uma grande desgraça adviria à terra santa, Mas seus conterrâneos não lhe deram ouvidos, Até que em menos de quatro anos, Este Matias testemunhou a destruição total de Jerusalém, Com milhares de mortos em batalha, Milhares presos e crucificados, E milhares de civis, Homens, Mulheres e crianças levados como escravos para Roma, E este Matias, Que ganhou, Como recompensa, Cidadania romana da Casa dos Flavianos, Disse que tal infortúnio parece ter sido profetizado, Pois, Segundo um de seus escritos, Um tal de Jesus, Filho de Anano, Um plebeu casado, Que, Quatro anos antes do início da guerra, E numa época quando a cidade gozava de muita paz e grande prosperidade, Veio à festa religiosa na qual é de costume dos Hebreus montar tabernáculos a Deus no templo, Soltou um grito repentino em voz alta: Uma voz do leste, Uma voz do Oeste, Uma voz dos quatro ventos, Uma voz contra Jerusalém e o templo sagrado, Uma voz contra os noivos e as noivas, E uma voz contra todo o povo, E ele gritava dia e noite, Em todas as ruas da cidade, Até que alguns dos homens mais eminentes da população indignaram-se com este clamor tão ousado, Levaram este homem, E lhe deram uma severa surra, No entanto, Este homem não pronunciou nenhuma palavra sequer em seu favor, Nem contra os que o castigaram, Continuou apenas proferindo aos gritos as mesmas palavras de antes, E diante disto, Membros da classe sacerdotal supondo, Como ficou provado, Que era um tipo de fúria divina que habitava este homem, O levaram ao procurador Romano, E este mandou açoitá-lo até arrancar a pele e deixar os ossos à vista, Todavia, Este homem não fez nenhuma súplica para si mesmo, Não derramou nenhuma lágrima, E elevou seu clamor ao tom mais angustiante possível, E a cada chicotada que levava, Ele respondia: Desgraça, Desgraça para você, Jerusalém! E quando o procurador Albino perguntou-lhe quem ele era, De onde veio, E por que ele dizia tais palavras, Ele nada respondeu, E não abandonou seu canto melancólico, Diante disso, Albino o considerou louco, E o dispensou, Assim sendo, Durante todo o tempo que transcorreu antes da guerra começar, Este homem não se aproximava de ninguém, E também não era visto por ninguém enquanto gritava, E todo santo dia ele proferia estes lamentos, Como se fosse um juramento premeditado, Desgraça, Desgraça para Jerusalém, Mas não xingava as pessoas que lhe batiam todos os dias, E nem agradecia às pessoas que lhe davam comida, E a resposta dele para todos os homens era, De fato, Um melancólico presságio do que estava por vir, E este seu lamento era o mais alto que se ouvia nas festas religiosas, E ele gritou por sete anos e cinco meses, Sem ficar rouco, Sem se cansar, E quando ele viu sua previsão se cumprir, Com o cerco de Jerusalém, Ele deu a volta em torno do muro da cidade, E gritou com toda força: Desgraça, Desgraça, Para a cidade também, E para o povo, E para o templo sagrado, E assim que ele gritou por último: Desgraça, Desgraça, Para mim também, Uma pedra lançada de uma catapulta o atingiu, E o matou instantaneamente, E no momento que ele proferiu as mesmas palavras, Ele entregou seu espírito a Deus, Oras, Meu excelentíssimo Alcibíades, Foi com base no relato deste Jesus por Matias e todos seus escritos, Que uma única mulher em Roma, Inventou um Jesus para gregos e romanos, Apelidado de Cristo, O Messias, E os escritos dela, Chamados de boas novas, Espalharam-se por todo o império romano, E deram margem a um incontável número de escritos semelhantes, Por séculos, Todos mitológicos, Dos quais sobraram estes quatro que a igreja dominante chama de canônicos, E todos eles asseverando que este Jesus de nome grego, foi traído por um de seus discípulos, Entregue ao procurador Pilatos, Pelos homens mais eminentes da população de Jerusalém, Foi crucificado entre dois ladrões, E morreu em poucas horas, Oras, Meu excelentíssimo Alcibíades, Um homem leva dias e até semanas para morrer numa cruz, Pois este mesmo Matias relata que quando o imperador Tito o enviou com Cerélio, E mais mil cavaleiros, Para uma certa vila chamada Thecoa, A fim de saber se era um lugar apropriado para acampar, No caminho de volta, Ele viu muitos prisioneiros crucificados fazia dias, E entre eles reconheceu três parentes seus, E muito triste, E com lágrimas nos olhos, Matias foi ter com Tito, E este imediatamente mandou soltar os três, E dar-lhes os melhores cuidados possíveis, No entanto, Dois deles morreram nas mãos dos médicos, E um sobreviveu, E agora acrescento-lhe o que, este feiticeiro costuma dizer, Que quando um mito nasce e cresce com tal poder, E sem nenhum respaldo na verdade, Ele pode durar milênios, E sobre ele novos mitos são criados, Mitos sobre mitos, E este feiticeiro antevê, Pelo seu dom de prever o futuro, Que antes da verdade vir à tona, E isto não ocorrerá antes de dez gerações, Um novo mito dará conta de que este Jesus mitológico dos cristãos, Foi traído por dois revolucionários, Simão Mago, O líder, E Judas Iscariotes, E os três foram crucificados na presença de Pilatos, Num local muito distante de Jerusalém, E habitado pelos Essênios, Tendo Jesus morrido em poucas horas, E os outros dois tiveram as pernas quebradas, E por ser tarde, Com a aproximação do Sabá, Eles deveriam ser tirados da cruz antes do por do sol, E Pilatos consentiu, E em sua presença, Jesus já morto, Foi colocado numa cova ali perto, E os outros dois numa outra cova ao lado, Enterrados ainda vivos, E Pilatos aceitou o pedido de Herodes Antipas, Para deixar um tal de Anano na guarda das covas, E diz o feiticeiro que, Uma dessas várias boas novas que se espalharam, Fez uma metáfora sobre Simão Mago, Apelidado de Lázaro, e Jesus nas covas separadas: Havia um homem rico, Que se vestia com púrpura e linho finíssimo, E se banqueteava cada dia, E um pobre, Chamado Lázaro, Ficava jogado junto ao seu portão, Indo coberto de feridas, Ele bem gostaria de matar a fome com o que caia da mesa do rico, Além disso, Os próprios cães iam lamber as suas feridas, Mas o pobre morreu e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão, O rico também morreu, Sendo sepultado, E das torturas do abismo, percebeu Abraão de longe e Lázaro no seu seio, Então ele falou: Pai Abraão, Tem pena de mim e pede para que Lázaro molhe a ponta do dedo na água para refrescar a minha língua, Porque sofro horrores nestas chamas, E Abraão respondeu: Meu filho, Lembra-te que recebeste os seus bens durante a vida e Lázaro recebeu seus males, Agora ele encontra consolo aqui, Enquanto tu padeces, E, além disso, Entre nós está cavado um grande abismo, Os que quisessem passar daqui para onde estás não poderiam, E daí também não se pode atravessar até aqui, Enquanto tu padeces, O rico continuou: Pai, Eu te peço, Então, Que o mandes à minha casa paterna, Porque tenho cinco irmãos, Que ele lhes faça uma advertência, Para que também eles não venham parar neste lugar de tortura, Mas Abraão lhe respondeu: Eles têm Moisés e os Profetas, Que os ouçam então, Mas o rico ainda lhe disse: Não, Pai Abraão, Mas se alguém dentre os mortos for à sua procura, Eles certamente se converterão, Mas Abraão concluiu: Se não dão ouvidos a Moisés e aos Profetas, Ainda que alguém ressuscitasse dos mortos, Eles não ficariam convencidos, E neste novo mito, Diz o feiticeiro, Esta metáfora será usada para criar uma outra fábula, A de que administraram em Jesus um veneno, Para ele parecer morto, E depois o reavivaram com medicamentos, E ele foi retirado vivo da cova, E alguns dirão que este Jesus permaneceu com seus discípulos por pouco tempo, E mudou-se para Roma, Onde não seria reconhecido por ninguém, A não ser Pilatos, Mas este já havia sido exilado em Viena, A pedido de Judeus e Samaritanos, No ano 36, Mas outros dirão que ele voltou para o lugar de onde veio, Empreendendo uma longa viagem, Passando por Damasco, Depois Urfa, Depois as vilas do Afeganistão, Depois Taxilla, E finalmente a Caxemira, Onde casou-se novamente, Teve três filhos, E lá morreu de velhice, E seu corpo lá descansa num lugar santo, Em águas cintilantes, Oras, Meu excelentíssimo Alcibíades, Este feiticeiro, Por vezes, Se expressa em linguagem enigmática e incompreensível, E assegura que um dia, Quando ninguém souber o que fazer quando o sol estiver frio demais, Alguém mostrará a verdade, Sobre como uma mulher semita, Da aristocracia romana, Inventou este mito de Jesus Cristo, Tendo ela lido todos os escritos de Matias, E nós, Meu excelentíssimo Alcibíades, Não veremos este dia, Mas outros verão, E aqui me despeço, Desejando que a paz permaneça contigo.


sexta-feira, 8 de março de 2024

TALITA CUMI - HOMENAGEM ÀS MULHERES

TALITA CUMI  - HOMENAGEM AO DIA DA MULHER



 Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral
protegido pela Lei 9610/98. 

INTRODUÇÃO
 
TALITA CUMI é um texto que escrevi em 1991 para uma palestra que ministrei num Centro Espírita (CE), para um público de pouco mais de 100 pessoas. Eu não acredito em nenhum tipo de religião. Para mim deus é o universo, não como criador, mas insciente de si mesmo. Tendo lido uma quantidade enorme de livros acadêmicos sobre cristianismo, adquiridos em Londres, foi relativamente fácil entender não apenas como as histórias contidas no Novo Testamento foram escritas por diversas pessoas, mas, principalmente, como e por quê elas foram escritas. Que motivação as levaram a escrever tais histórias. Dizem que sou ateu, então pergunto: como um ateu pode dar palestras para cristãos espíritas? Vou chegar lá. Este CE fica ao lado da casa de meu irmão mais velho, e foi através dele que conheci esta instituição. Recebi um convite para conhecer este CE, lá entrei, fiz algumas amizades e passei a frequentá-lo. Logicamente, eu jamais compartilhei minhas convicções com meus amigos espiritualistas. O convidado jamais deve julgar as crenças de seu anfitrião. Eu não era apenas um curioso no espiritismo. Eu trabalhava na casa. Todos os anos eu entrava em favelas para fazer triagens de famílias que iriam receber cesta básica de alimentos todos os meses. Eu participava das distribuições, ajudava na cozinha para preparar a sopa para todos os favelados, saía para comprar ingredientes na feira e, no final do ano, na distribuição de natal, ajudava na compra de brinquedos e roupas para as crianças. Como eu estava muito bem de saúde e muito bem no meu trabalho, eu podia fazer contribuições financeiras também. Neste CE eu fiz um curso sobre a doutrina kardecista, participei de uma mesa de desobsessão durante dois anos, falava em público durante as sessões de cura, dava passe em pessoas e dava palestras, não sobre cristianismo ou sobre espiritualismo. Eu falava sobre gente famosa por sua elevada moral como Sócrates, Platão, Pitágoras, Joana D’Arc, Gandhi e muitas outras. Os dirigentes da casa me escalavam para dar uma palestra pública a cada 4, 5 ou 6 semanas, e sempre me avisavam com antecedência. Em meados de Fevereiro de 1991 fui escalado para dar uma palestra no dia 8 de Março, uma sexta-feira, dia de palestra pública. Enquanto pensava num tema, me dei conta que no dia 8 de Março se comemorava o Dia Internacional Da Mulher. Então pensei: Por que não fazer uma homenagem à mulher? Ela é sempre descriminada, tratada como objeto, como um mero animal de procriação e até assassinada por motivos torpes, como ciúmes. Como escreveu John Lennon: ‘A mulher é o negro do mundo, a escrava dos escravos’. Eu já tinha dado uma palestra sobre Joana D’Arc e precisava encontrar outra mulher de valor. Eis que um passarinho veio até meu ouvido e sussurrou: ‘Maria Madalena’. O quê? Uma mulher mítica, que os evangelhos até consideram uma prostituta? Seu passarinho, o senhor está querendo denegrir a imagem da mulher? ‘Não’, diz o passarinho, ‘conte a verdade’.  'Qual verdade?'  E o bichinho de penas, um sanhaço, não desistiu. ‘Esqueça seu ceticismo, pelo menos uma vez. Conte SUA verdade, SUA história sobre ela, lembrando que foi uma mulher quem escreveu o primeiro evangelho em Roma, aquela mesma que disse: ‘’Com toda a certeza Eu vos asseguro: onde quer que o Evangelho for pregado, por todo o mundo, será também proclamada a obra que esta mulher realizou, e isso para que ela seja sempre lembrada”. Você já parou para pensar o que esse público heterogêneo vem fazer naquele CE? Alguns vêm para passear, para arrumar um motivo para sair de casa à noite, mas muitos lá vão por necessidade, precisando de palavras de consolo, e não de seus conhecimentos. Pense bem’. O danado do azulão tinha lá suas razões. Está bem, passarinho, vai ser a primeira e a última vez que abro mão das minhas convicções. Levei uma semana para escrever este texto e mais duas para decorá-lo, dentro do carro a caminho e voltando do trabalho. Devo ter lido o texto em voz alta mais de 20 vezes, até que chegasse perto da perfeição, sem esquecer uma palavra sequer, para poder falar por uma hora seguida sem vacilar um único momento. Logicamente, para muitos o texto é muito floreado, brega e piegas, mas as mulheres adoraram. Foi como se eu tivesse incorporado o espírito de Maria Madalena e ela falasse ao público através de mim. Alguns homens, inclusive dirigentes da casa, torceram o nariz. Pois é, até mesmo num lugar onde se pretende fazer caridade há machistas e misóginos. A palestra inteira está publicada abaixo.  Postei abaixo também trailers e clips do ótimo filme MARIA MADALENA, estrelada por Rooney Mara, e Joaquin Phoenix no papel de Jesus.  Para quem estiver interessado neste assunto e sabe ler em inglês, recomendo o livro acadêmico IN MEMORY OF HER – A FEMINIST THEOLOGICAL RECONSTRUCTION OF CHRISTIAN ORIGINS,  de Elizabeth Schuller Fiorenza.
Obs.: Eu não me gabo de ter feito caridade quando pude ou, ao contrário dos preceitos cristãos, eu deixo minha mão esquerda saber o que a direita faz. E não tenho vergonha de dizer que desde 2020 vivo de favores, principalmente de pessoas que nem conheço, e em 2021 tive que recorrer a Centros Espíritas para receber cestas básicas para minha família não passar fome.

O homem diz que somos todos pecadores e que devemos pagar por nossos pecados que nos marcam desde a nossa concepção. Os espiritualistas, também, se consideram todos pecadores, isto é, sempre que reencarnam significa que há algo a resgatar, dívidas de vidas passadas para pagar, carmas que precisam ser resolvidos ou dissolvidos ou, na melhor das hipóteses, uma nova lição a aprender e que contribua para o seu progresso espiritual. Seja qual for a religião, parece que os homens, de uma maneira geral, talvez ainda ressentidos como Tertuliano com o meu pecado original, ou talvez inspirados nos auspícios da pecadora redimida, decidiram que eu devo fazer dois resgates: um por ser pecadora como todos os seres humanos, e outro simplesmente por ser mulher.

O homem tem medo de lidar com seu lado sombrio porque o despertar da realidade podre e maléfica que ele é gera sentimentos de culpa e tensão e exige a difícil tarefa espiritual e psicológica que é a busca de autoconhecimento através de uma reforma íntima. A maneira mais comum com a qual os homens tentam lidar com o problema de suas imperfeições é simplesmente negar a sua existência, o que acaba deixando-os ainda piores, pois a tendência inconsciente é projetar essas imperfeições nos outros, vendo neles algo que realmente é uma parte deles mesmos. Assim, fazendo as outras pessoas carregarem para eles a projeção de seu lado sombrio, o conjunto de todos os seus defeitos que eles odeiam, eles reagem em relação a estas outras pessoas de um modo bem condizente, ou seja: passam a odiá-las, teme-las e descrimina-las. A projeção das imperfeições nas outras pessoas se dá a nível individual e coletivo e é a origem de toda a espécie de preconceitos, segregações e discriminações que existem no mundo. Neste processo, os gentios carregaram as projeções dos judeus da Palestina do tempo de Jesus. Da mesma forma, mais tarde, estes mesmos judeus carregaram as projeções dos cristãos e estes carregavam as projeções dos romanos dentro de arenas entregues às feras. Durante cerca de mil anos de trevas que caracterizaram a idade média, pessoas iluminadas, grandes inventores, gênios de todas as artes e ciências e sábios com ideias renovadoras carregaram a projeção da igreja cristã triunfante que, através da santa inquisição, levou um sem número de criaturas para as fogueiras em nome de Jesus. Na idade moderna, iniciada com os grandes descobrimentos de novas terras, os indígenas das Américas foram, imperdoavelmente, dizimados, carregando todas as projeções dos colonizadores britânicos, espanhóis e portugueses. Durante a Reforma e o Iluminismo os católicos carregaram as projeções dos protestantes e vice-versa. Os negros africanos carregaram as projeções dos brancos e, apesar de a escravidão ter sido oficialmente abolida no final do século 19, a raça negra continua carregando a projeção da raça branca. No século passado, a raça judia carregou as projeções dos nazistas. E eu sempre carreguei a projeção do homem.

O Deus do judaísmo e dos cristãos gostou desta ideia chamada escravidão e resolveu institui-la nas suas leis, endossando, no décimo mandamento, a exploração do homem pelo homem, e reservando à mulher uma posição muito especial junto aos bens do sexo forte: Não desejareis a casa de vosso próximo, nem seu escravo, nem sua escrava, nem seu boi, nem seu asno, nem nenhuma de todas as coisas que lhe pertencem. Deus, no entanto, justo como ele é, fez uma ressalva: Ele não permite aos homens cobiçarem as escravas dos outros, mas apenas suas próprias escravas! Os judeus copiaram muito dos costumes, da religião e até da magia egípcias, mas eles não se interessaram por algumas preciosidades desta fantástica civilização que foi a primeira na história da humanidade a pregar o dogma da existência de um Deus único, como, por exemplo, esta tão sublime: Deus é Pai e Mãe, é o Pai de todos os Pais e a Mãe de todas as Mães. Os egípcios estavam muito mais adiantados do que outras civilizações ricas da mesma época, mantendo usos e costumes semelhantes aos da moderna Europa. E o respeito para com as mulheres era tão grande que elas tinham ascendência sobre os homens. Não era uma mera influência que as mulheres possuíam e que frequentemente adquiriam, em caráter exclusivo, nos países mais arbitrários do oriente. E também não era uma importância política dada a elas através de acordos individuais. Era um direito reconhecido por lei, tanto na vida pública como na vida privada. Os egípcios sabiam que se as mulheres não fossem tratadas com respeito e não tivessem autonomia para exercerem uma influência na sociedade egípcia, o nível da opinião pública logo declinaria e os costumes e a moralidade dos homens passariam por sofrimentos. E ao reconhecer isto, eles delegavam às mulheres as mais respeitáveis incumbências diante da comunidade.

No tempo de vocês, o músico John Lennon, assassinado em 1980, ao reforçar o movimento feminista para provar que a mulher ainda tinha muitas conquistas a serem alcançadas, admitiu, através de suas canções, a brutalidade do homem dizendo: Já não sou tão cruel com a minha esposa e já não bato nela com fazia antes. Eu estou melhorando. Ele reconheceu o mal trato dado às mulheres ao escrever: A mulher é o negro do mundo, o escravo dos escravos. É claro que nos dias de vocês, em muitos países, a situação da mulher é melhor, ou talvez fosse mais prudente dizer menos pior do que já foi. Vocês já tiveram uma mulher governando uma nação de primeiro mundo e que já deteve a hegemonia mundial. Tiveram, também, uma mulher eleita presidente de uma nação muçulmana, onde a mulher, ainda, é considerada um objeto de propriedade do homem. Até no país desta língua latina e do quinto dos infernos vocês já têm várias mulheres assumindo cargos políticos do primeiro escalão da hierarquia. Em vários países, vocês já têm exemplos de mulheres assumindo cargos de liderança e dividindo poderes e direitos com os homens, embora saibam que ainda falta muita coisa a ser feita para a mulher ocupar o lugar que merece e é seu na sociedade. No campo religioso, embora recentemente as mulheres tenham sido ordenadas em algumas poucas denominações, seus papeis como sacerdotisas ou pastoras permanecem secundários em relação ao papel dos homens que continuam detendo as posições de maior autoridade nas igrejas. O papa só pode ser homem. E a liturgia de todas as religiões, ainda, se refere a Deus como pai e nunca como mãe. Tudo isso é uma herança que a cristandade recebeu de Paulo de Tarso, o fundador do cristianismo e seu bordão: mulher não tem vez.

Se todos meus ensinamentos a Jesus fossem seguidos na prática a condição da mulher nos dias de vocês seria bem diferente, como de resto a moralidade na humanidade teria alcançado um nível bem superior. Os misóginos de seus dias aprenderam a maltratar a mulher com outros misóginos antigos, como Tertuliano, que acreditavam que Deus criou o homem à sua imagem para depois afirmarem nas epístolas do novo testamento que a honra da criação das mulheres era, ao contrário, reservada apenas ao homem, inferindo que era do homem, e não de Deus, que a mulher, criatura secundária, era reflexo. Muitos misóginos andaram resgatando ideias retrógradas como as de Agostinho: Toda a iniciativa é masculina. Ou as de Aristóteles: A mulher é um macho que não deu certo e só pode viver na subordinação. A minha intervenção na mitologia cristã fez Jesus erguer a bandeira da emancipação da mulher, porque o filho veio para corrigir os erros do pai. O que vocês esperam de um homem que transforma a água em vinho, anunciando que todos devem ser iguais perante a sociedade: os pobres, os destituídos, os enfermos, os inválidos, os anciões, os estropiados, os lunáticos, os possessos; fazendo-se acompanhar por todas as espécies de pessoas: pecadores, cobradores de imposto, ladrões, assassinos, solteiros (as), casados (as), desquitados (as) e concubinados (as)? O que vocês esperam de alguém que recomenda a amar o nosso próximo, mas também nossos inimigos, nos alertando para nos reconciliarmos com nossos adversários o mais rápido possível? Enfim, o que vocês podem esperar da pessoa que lutou contra todas as estruturas opressivas, tanto morais como políticas, contra a introversão do judaísmo, dando, inclusive, aos fariseus e saduceus a chance de abrir a religião judaica para a sociedade greco-romana e permitindo a todos os chamados pagãos participarem, indistintamente, das mudanças estruturais que ele inaugurou numa época difícil, numa região turbulenta onde várias facções paramilitares disputavam o seu carisma enquanto ele se apartava de todos os sistemas políticos e perseverou, até a morte, na luta pela liberdade e igualdade entre os homens? Eu ajudei Jesus a acabar com a discriminação contra a mulher e coloca-la em condições de igualdade com o homem. Os próprios evangelhos canônicos da mitologia cristã, patrulhados pela igreja dominadora, dão pistas de que Jesus agiu em favor da mulher mais do que em favor do homem.

No meu tempo, mulher não participava da vida pública e tinha que ter as virtudes da heroína dos dias de vocês: ser boa mãe, boa esposa e boa dona de casa. Mulher na rua só com o rosto coberto. Diante dela se impunha um silêncio prudente, como prescreviam os rabinos: Aquele que conversa demasiadamente com mulher atrai o mal, negligencia os estudos das sagradas escrituras e acaba no inferno! Livres de uma vida em reclusão ficavam somente as princesas dos palácios e as mulheres do campo que tinham que dar duro no trabalho braçal da lavoura. Em tempo de guerra ou paz, vida ao ar livre era privilégio só dos homens. Mulheres ficavam só dentro de casa: as moças passavam o dia inteiro confinadas num cômodo escondido da casa, sem acesso a janelas, e as adultas tinham a porta externa da casa como fronteira com o mundo exterior. Entre os 12 e 14 anos, a menina passava do poder paterno para o marital e, para ser a propriedade de um novo dono, tinha, ainda, que pagar um imposto alto chamado dote. Mulher raramente podia pedir divórcio. Já os homens precisavam apenas alegar uma falta de pudor ou um simples temperamento desagradável da esposa, a vossa atual incompatibilidade de gênios. Homem pego em adultério só ficava meio envergonhado e constrangido com uma branda admoestação. Mulher pega em adultério era sumariamente condenada à morte por apedrejamento. Em caso de disputas judiciais, o testemunho de uma mulher jamais era aceito por causa da leviandade e imprudência de seu sexo. Portanto, em qualquer litígio, só o homem tinha razão. A mulher tinha uma impureza contagiosa: durante a menstruação e em caso de hemorragia ela deveria ficar afastada do convívio familiar por algumas semanas. Depois de um parto, quando a perda de sangue é maior e o perigo de contágio mais sério, o seu isolamento deveria durar 40 dias e, se a mulher desse a luz a uma menina, a impureza era considerada ameaçadora demais, portanto o isolamento era dobrado para 80 dias. As mulheres não precisavam fazer peregrinações religiosas a Jerusalém e não podiam participar das orações diárias, um direito que era exclusivo dos homens que costumavam erguer as mãos para o céu e rezar: Bendito seja Deus que não me fez nascer pagão nem mulher! As mulheres estavam proibidas de ler as sagradas escrituras no lar e nas sinagogas e quando apareciam nas assembleias religiosas não faziam parte do quorum necessário para a oração pública e eram isoladas numa tribuna no fundo do edifício para que a congregação não se sentisse desrespeitada com a presença delas. Até mesmo o brilho de notáveis mulheres da mitologia judaica como Sara, Raquel, Rebeca, Miriam, Lia, Débora, Judite, Éster e Susana foi ofuscado pela brutalidade do julgamento do famoso historiador contemporâneo de Jesus, Flavio Josefo, que sintetizou o estigma da mulher com estas palavras: Diz a lei que a mulher é inferior ao homem em todas as coisas. Por isso ela deve obedecer, não para ser violentada, mas para ser comandada porque foi ao homem que Deus deu o poder!

Apesar destas rigorosas restrições impostas pelo judaísmo, eu fiz com que a relação de Jesus com as mulheres contivesse um liberalismo espontâneo que desprezava os costumes puritanos e desafiava as convenções falidas num tempo e numa região onde os sexos opostos não podiam se misturar socialmente. O autor anônimo de um dos evangelhos e que recebeu o apelido de Lucas relata: Os doze acompanhavam Jesus assim como mulheres que tinham sido curadas de espíritos e doenças: Maria Madalena, da qual tinham saído sete demônios, Joana, a mulher de Cusa, o administrador de Herodes, Susana e várias outras que o assistiam com seus bens. Como se nota, o grupo de Jesus era formado por homens e mulheres e a presença maciça delas prova que Jesus não tinha nenhuma intenção de formar um movimento paramilitar contra os romanos. Há mulheres solteiras e casadas e são elas que sustentam o grupo com os bens materiais, mas elas não estão com Jesus só para prover os meios de subsistência. Jesus delega a elas poderes para comandar, aproveitando não somente a fibra, mas também a ternura feminina para acalmar o ânimo mais exaltado dos homens e manter a paz que era o seu lema principal. Jesus montou um grupo de missionários exóticos e excêntricos aos olhos dos outros, porque era composto de homens e mulheres que partiam com ele pelos caminhos, desprezando os costumes da época. A autoridade das mulheres é anunciada, simbolicamente, quando Jesus ressuscita a filha de Jairo e profere palavras que têm um significado que passa desapercebido de todos: Talita Cumi, diz Jesus, uma das raras frases mantidas no dialeto aramaico original nos evangelhos que foram redigidos em grego. A tradução é Levanta-te Menina! A filha de Jairo está no início da idade adulta, quando passará a ser chamada de mulher e poderá se preparar para casar. O significado mais profundo por detrás destas palavras é: Levanta-te Menina, torne-se uma mulher e atinja a emancipação pois eu lhe reservo um papel muito importante na minha atividade missionária!

Estas palavras foram inscritas nos distintivos das escolas e faculdades da Europa do século 19 e foram adotadas como uma espécie de grito de guerra do primeiro movimento de emancipação da mulher na história. A força e o significado destas palavras podem ser mais bem entendidos em contraste com um detalhe do episódio da multiplicação dos pães que também costuma passar desapercebido de vocês. No meio daquela multidão havia gente de todas as facções políticas e ordens religiosas, e aquele evangelista anônimo que recebeu o apelido de Mateus diz que foram alimentadas cerca de 5.000 pessoas, fora as crianças e mulheres e, acreditem se quiser, lá estavam, também, mulheres da alta nobreza romana. O apóstolo perguntou a Jesus como eles iriam alimentar todos aqueles homens. Notem que ele se refere aos homens e não a multidão e Jesus pediu, então, para mandar a multidão se sentar, mas não foi só isso. Ele mandou um recado enérgico aos homens em especial: Mandem os homens sentarem, mandem os Fariseus, os Saduceus e os Essênios sentarem. Mandem Simão e seus zelotes revolucionários sentarem. Mande Judas Iscariotes e seu bando de articuladores sedentos de agitação política e confrontação religiosa sentarem! Sutilmente, e de maneira quase imperceptível, os evangelistas deixaram registrados nos evangelhos, em capítulos separados que não guardam uma relação direta entre eles, a mensagem de Jesus para os homens e para as mulheres, através da antítese destas frases: Sentem-se Homens! Levanta-te Menina!

Além deste anúncio simbólico, vocês podem constatar a autoridade delegada às mulheres no sentido mais prático, prestando atenção nas mulheres mais íntimas de Jesus. Há um detalhe nelas que chega a vos intrigar: todas se chamam Maria: Maria, mãe de Jesus, Maria, irmã da mãe de Jesus, Maria, Irmã de Marta, Maria mãe de Tiago, Maria, Esposa de Cleopas, o administrador de Herodes e Maria Madalena. Os evangelhos apócrifos, que foram banidos pela igreja por serem considerados hereges, também vos ajudam com seu testemunho. O evangelho de Felipe diz: Eram três as que caminhavam constantemente com Jesus: Maria, sua mãe, Maria, a irmã de sua mãe e Maria, sua companheira. Naquela época, Maria já era um nome comum como em vossos dias. Vocês pensam que é mera coincidência o fato de que justamente as mulheres mais próximas de Jesus se chamassem Maria. O filósofo judeu Fílon da cidade de Alexandria, contemporâneo de Flavio Josefo, vos dá uma pista: toda vez que se pretendia dar autoridade a uma mulher, ela passava a ser chamada de Miriam porque esta mulher, de acordo com a lenda judaica, era a irmã de Moisés, uma sacerdotisa que tinha poderes até sobre os homens. Nos evangelhos escritos em grego, até os nomes próprios eram traduzidos. Cefas em aramaico significa rocha e traduzido para o grego torna-se Pedro. Joshua é um nome judaico que é traduzido como Josué e em grego torna-se Jesus. Messias em hebraico significa o ungido que em grego se diz Cristo, particípio passado do verbo crismar. Miriam traduzido para o grego vira Maria. Essas Marias são sempre mulheres privilegiadas ao lado de Jesus e Maria Madalena, em particular, mais ainda. Nos evangelhos apócrifos, a mulher de grande beleza e capacidade de amar não é mostrada como a prostituta que se arrependeu depois de conhecer Jesus. Maria Madalena é vista como uma líder ativa que recebeu instruções especiais, é elogiada mais que os outros apóstolos, fala como mulher de grande sabedoria, provoca rivalidade e ciúmes entre os homens e Pedro, em particular, se irrita com ela e tem medo que sua liderança no grupo seja ameaçada. O evangelho apócrifo de Felipe diz: Pedro exigia que Jesus silenciasse Maria Madalena mas foi censurado por Jesus imediatamente e a própria Maria admitiu a Jesus que ela nem ousava falar com Pedro porque ele tinha aversão às mulheres e lhe causava medo e hesitação e Jesus respondeu: Quem quer que o espírito tenha inspirado é devidamente autorizado a falar, seja num corpo de homem ou de mulher. Nesta mesma passagem, Mateus arremata a censura de Jesus a Pedro dizendo-lhe: Pedro, você sempre foi exaltado e se Jesus resolveu dignificar Maria Madalena, quem é você para rejeita-la? Maria não é simplesmente um nome. Maria é um título!

Eu fiz Jesus promover uma verdadeira subversão da hierarquia tradicional e injusta, favorecendo os mais desprezados entre os quais estavam incluídas as mulheres. Essa reviravolta social aparece nas palavras enérgicas de Jesus aos sumos-sacerdotes da classe governante: Os cobradores de impostos e as prostitutas chegarão ao reino dos céus antes de vocês! Jesus, no entanto, sempre se referia àquele reino que está dentro de vocês. Esta máxima de Jesus está exemplificada no episódio da unção de perfume por uma pecadora, quando Jesus escandaliza seus anfitriões fariseus com o perdão da mulher que pecou, mas demonstrou amor e, também, no caso da mulher que é elogiada por Jesus por ter derramado perfume em sua cabeça. Eu fiz Jesus transpor as barreiras preconceituosas contra as mulheres nas condições mais surpreendentes como no caso daquela abordagem desconcertante de uma samaritana, cismática, separada dos judeus por motivos religiosos e raciais, cinco vezes casada e vivendo em concubinagem. Jesus rompe aquela absurda tradição do silêncio imposto perante uma mulher e, contrariando todos os preconceitos rabínicos, ele conversa demoradamente com a samaritana, com aquela espiritualidade da descontração e de sua identificação com o sexo feminino. O desfecho da conversa, como vos relatam os evangelistas, é fascinante: E muitos samaritanos daquela cidade acreditam nele, por causa da palavra daquela mulher que dava testemunho, dizendo que Jesus sabia de tudo que se passava com ela! Jesus consegue, com minha ascendência moral, demolir mais um tabu: testemunhos de mulher nunca eram aceitos, mas eu ajudei Jesus a conquistar a simpatia e a confiança dos samaritanos através do testemunho de uma mulher.

Jesus aprendeu comigo a fazer o jogo da intimidade, da amizade pura e desinteressada, sem segundas intenções. A fazer o jogo das coisas que nascem a partir do prazer e do desejo de estar em companhia de pessoas e mulheres, em especial, que são tratadas com amor e ternura, de igual para igual com os homens, e não como uma subespécie, o que irritava profundamente os machistas da época. Jesus não defende a lei que a mulher surpreendida em adultério deva ser apedrejada. O perdão concedido à mulher adúltera e a desfeita de seus acusadores masculinos abalam o orgulho e o complexo de superioridade dos homens. A outra tradição absurda da mácula da impureza contagiosa da mulher é totalmente ultrapassada quando a mulher sofrendo de hemorragia obtém sua cura pela fé ao tocar o manto de Jesus. Jesus tem, também, bastante carinho com as mulheres mais despojadas, as viúvas que a lei protegia: ele devolve a vida do filho único de viúva de Naim e, ao invés dos ricos colocando as suas oferendas no tesouro do templo, é a pobre viúva das moedinhas que ele louva. Todas estas mulheres saem do confinamento de suas casas e acompanham Jesus da Galileia a Jerusalém, com satisfação, com os rostos descobertos, ganhando cada vez mais confiança ao lado de Jesus com quem, pela primeira vez, elas podem orar. Estas mulheres, aparentemente, não receberam um apelo específico e nem foram enviadas em missão como os doze apóstolos, mas acaba até fazendo sentido a ideia de que estas mulheres se tornaram mais próximas de Jesus do que os próprios apóstolos quando vocês analisarem o que aconteceu durante o flagelo de Jesus: os homens simplesmente desapareceram e, mais uma vez, entram em cena a fibra, a fidelidade e a solidariedade da mulher: elas acompanham Jesus na via dolorosa à distância, por imposição dos romanos, conforme relatam os evangelistas. Uma delas se aproxima de Jesus e lhe enxuga o rosto. Quatro 'Marias' comparecerem junto à cruz e lá permanecem sem arredar o pé até a hora derradeira. Depois elas se incubem de preparar o óleo e os bálsamos para ungir o cadáver para o sepultamento e, finalmente, até mesmo nas lendas da ressurreição, contrariando um costume judeu milenar, é uma mulher, Maria Madalena, que testemunha a ressurreição de Jesus, encarregando-se de anuncia-la aos discípulos masculinos que, com exceção de João que compareceu ao calvário, mantiveram-se distantes durante todo o suplício de Jesus, inclusive negando conhece-lo como fez Pedro.

Após a morte de Jesus, seus seguidores pareciam dar mostras de que minhas recomendações estavam sendo seguidas. Nos atos dos apóstolos, vocês encontram estas palavras: Não há judeu, nem gentio, nem escravo, nem homem livre; não há macho, nem fêmea, todos são iguais perante Jesus Cristo. E de fato, os primeiros núcleos de fiéis que se formam são compostos de muitas mulheres, inclusive a mãe de Jesus, e elas são sempre saudadas e elogiadas pelo espírito de colaboração e liderança, sem nenhum vínculo com qualquer espécie de função subalterna ou tarefa reservada, exclusivamente, ao meio feminino. No entanto, lamentavelmente, começam a surgir resistências internas contra o papel e a função das mulheres, provocando lutas inglórias dentro das comunidades e já numa das epístolas vocês podem ler as seguintes palavras de indignação: Eu não sou livre? Não sou um apóstolo? Nós todos não temos o direito de levar conosco uma mulher, uma irmã como faziam os outros apóstolos e os irmãos de Jesus e Pedro! (naquela época, companheira conjugal era chamada de irmã, à maneira dos meus ancestrais egípcios). Infelizmente, os misóginos são em maior número e triunfam, e eles vestem o cristianismo com a roupagem antiga do judaísmo com todos os seus dogmas e preconceitos e, já nas cartas dos apóstolos, vocês encontram: A mulher deve ficar calada na igreja, pois ela não tem permissão para falar. Ela deve permanecer submissa ao homem como ordena a lei: se ela quiser aprender alguma coisa, deve perguntar ao marido em casa. Assim como cristo é a cabeça da igreja, o homem é a cabeça da mulher. Ela não pode ensinar nada ao homem e nem ter autoridade sobre ele. Ela é facilmente seduzida e cai em transgressão. Portanto, ela só será salva na maternidade e na condição de se preservar com modéstia na fé, na caridade e na simplicidade. Esta última afirmação deve fazer vocês perguntarem-se o que aconteceu com a salvação através de Cristo que ficou reservada somente aos homens. Nem ao menos vos é dito o que acontece às mulheres que são incapazes, por uma razão ou outra, de terem filhos. Pela vida devotada que os homens obrigam a mulher a viver, obviamente, ela perde o direito de extravasar sua dor, sendo obrigada a ter fé, caridade e santidade constantes. E o que uma mulher faz quando fica zangada, ressentida, frustrada, irritada ou apenas exausta de dar o melhor de si mesma? Quem teve a responsabilidade pela criação de crianças pequenas sabe que é difícil estar sempre sendo um modelo de santidade e que não é possível aguentar o estresse diante da rotina de uma dona de casa, do cotidiano da maternidade e de um casamento falido.

Jesus entendia, perfeitamente, estes questionamentos indignados das mulheres, mas somente com ele, Jesus, a mulher daqueles tempos tinha liberdade de falar sobre estas amarguras abertamente. Quando Jesus está na casa de Marta, Maria, sua irmã, se põe a conversar com Jesus e Marta, então, reclama com Jesus de Maria por ela não estar ajudando-a nos afazeres de casa. Um judeu qualquer teria, imediatamente, ordenado a Maria para se por a trabalhar. Mas Jesus não era qualquer judeu, se é que ele era realmente judeu, e disse: Marta, você anda muito inquieta e se perturba com os afazeres de casa. Entretanto só uma coisa é necessária. Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada. Maria havia deixado de lado as tarefas cotidianas da mulher dona de casa por uns momentos para conversar com um homem sobre coisas que são mais importantes. Afinal, Jesus tinha coisas mais importantes para dizer às mulheres. Antes de morrer, parece que Jesus já pressentia que tudo o que ele quis fazer pelas mulheres seria abolido pelos seus próprios seguidores quando ele consola as mulheres dizendo: Mulher, não chore por mim, mas pelos seus filhos! Ele quis dizer Chore pelas gerações futuras porque você não imagina o que estar por vir. Ele profetizou a santa inquisição.

Eu ensinei Jesus a transcender o pensamento coletivo de sua época e os que vieram depois dele não conseguiram alcançar a consciência mais elevada que eu lhes dei e sempre permaneceram num nível inferior. É por isso que, após as bênçãos dos quatro evangelhos, o novo testamento termina com o livro Apocalipse, mostrando uma dualidade metafísica entre Deus e Satã, colocando Deus do lado do homem e identificando Satã com o sexo feminino. Com todo o respeito que se deve ter com todas as religiões do mundo, peço licença para dizer que seria uma covardia fazer qualquer crítica em relação ao tratamento dado às mulheres pelas religiões não cristãs depois da civilização egípcia da qual descendo porque nenhuma delas teve um líder que falasse do amor ao próximo e na igualdade entre homens e mulheres e entre todos os seres humanos como tiveram os fundadores da religião cristã, por isso, a parcela de responsabilidade dos cristãos é maior do que qualquer outra religião e o cristianismo acaba sendo alvo de mais críticas do que as outras religiões justamente porque ele se desenvolveu em torno da pessoa que teve ao seu lado uma mulher que forneceu-lhe uma receita cujos ingredientes principais, o amor, a justiça, a caridade e a igualdade entre os homens resistem e sobrevivem a todos os tipos de desvios e deturpações, tornando-se imortal e eterna. É uma receita sempre atual, que pode ser utilizada intacta, na sua fórmula original, em qualquer época e também de uma maneira mais proveitosa como vem fazendo a ciência nos seus recentes esforços para descobrir quem eu sou.

O inventor desta receita é uma pessoa que aprendeu comigo a não ter nenhum compromisso com as instituições humanas transitórias e frágeis, é uma pessoa que debate sobre o relacionamento de uma mulher com seus cinco maridos, mas que condena mais o adultério do caráter e do coração do que o adultério da carne. Uma pessoa que facilmente pode prescindir dos laços matrimoniais e, se quisesse, poderia até olhar para uma mulher como objeto de luxúria, mas é tão humano, no sentido literal da palavra, que entende e respeita a sensualidade feminina. Jesus não teme a companhia da mulher, nem de sua afetividade e nem dos sentimentos que ela desperta no homem. Ele se permite todo o tipo de relacionamento com a mulher, desde encontros singelos e cordiais até as amizades mais íntimas e comprometidas. Ele não se esquiva da intimidade feminina nem das demonstrações de amor e afeto que ela expressa.

Jesus é aquela pessoa que um dia vai a Bethânia, entra na casa de Lázaro, inclina-se no repouso das almofadas, com os pés para trás, prepara-se para a ceia em companhia de muitas pessoas que se apressam em recostar-se ao seu lado. Eu entro no recinto, carregando um jarro de alabastro, cheio de nardo, o perfume mais precioso e mais caro, feito de uma planta da Índia. Eu quebro o jarro e derramo todo o perfume na cabeça de Jesus e a casa inteira fica impregnada com o aroma do nardo exalado. Em seguida, num gesto considerado indecente para uma mulher daquela época, eu solto os meus cabelos e com eles enxugo os pés de Jesus. Todos os presentes na casa e Judas, em particular, protestam contra aquela minha atitude incomum, desperdiçando um perfume tão valioso, num gesto irresponsável e fútil. Judas alega que o perfume vale 300 denários e poderia ser usado para ajudar os pobres. Jesus adverte a todos que minha ação foi uma expressão do meu respeito por ele do tanto que ele aprendeu comigo, por isso ele faz objeções às críticas dirigidas a mim que pudessem envergonha-me por causa da minha autenticidade e destemor.

Trezentos denários eram muito dinheiro. Era o salário de quase um ano de trabalho, considerando-se que, na época, o salário de um dia era um denário. O que estaria acontecendo? Será que Jesus estava subvertendo a tradição de mais uma instituição humana passageira e injusta e acabando com a obrigação da mulher de pagar um dote para se casar? Será que eu fiquei tão feliz com algum tipo de iniciativa de Jesus e resolvi comemorar, despejando todo aquele valioso perfume sobre ele? A igreja e muitas pessoas religiosas envergonham-se disso e, certamente, reprovam, até com indignação, este tipo de especulação, mesmo que ela possa ser corroborada por algum tipo de referência ao antigo testamento. Eu lhes digo isso porque, como vocês sabem, os evangelistas recorriam, constantemente, a passagens do velho testamento para realçar a importância de alguma pessoa próxima de Jesus ou de algum acontecimento importante em sua vida. Frases e expressões até mesmo das bem-aventuranças foram copiadas do velho testamento: Os mansos herdarão a terra, Os que choram serão consolados, Os puros de coração, Os pobres de espírito foram extraídos do livro de Isaías e dos Salmos. E no episódio de Jesus na casa de Lázaro? Será que há alguma referência clara a alguma passagem do velho testamento?

Num dos vários livros do velho testamento, chamado o cântico dos cânticos, há uma introdução feita pela igreja no qual ela se preocupa em fazer uma advertência ao leitor: Apesar do tema amoroso, a linguagem desses poemas é sempre elevada e nobre e não tem nada de sensual, embora empregue certas expressões orientais que não estão muito de acordo com o nosso gosto. Só as almas já corrompidas poderão encontrar nestes poemas, objeto de escândalo. Este livro contém a canção de Salomão, que é uma liturgia matrimonial da dinastia do rei David, cantada num belo coro de vozes como acompanhamento das cerimônias de casamento. Nos versículos 11, 12 e 13 do capítulo 1, a noiva recita as seguintes palavras: Enquanto todos os presentes se aglomeravam em torno do rei, encostado no repouso das almofadas, o meu nardo exalou o seu perfume pois meu bem-amado é para mim como uma bolsa de mirra que repousa entre os meus seios.

Dizem os espiritualistas que neste planeta é muito difícil alguém alcançar a estrada que leva a verdadeira integridade moral sem encarnar como mulher, pois a mulher, mais do que o homem, sabe se resignar, fazer sacrifícios, tem mais capacidade de amar e perdoar e tem a coragem de dar sua própria vida para salvar a vida de um filho. Portanto, os encarnados como homens precisam se mexer, pois parece que eles têm um longo caminho a percorrer. A discussão com Judas e outros presentes na casa de Lázaro sobre a minha atitude foi encerrada com estas palavras de Jesus: Onde quer que sejam pregadas estas boas novas, que será em todo o mundo, será também em memória desta mulher pelo que ela fez aqui hoje. Portanto, nos vossos dias, não se deve recordar das boas novas de Jesus apenas como, habitualmente, se faz em todas as religiões cristãs, mas também prestando uma homenagem a todas as mulheres, como eu ensinei a Jesus, pois sempre que as boas novas forem lembradas, eu também devo ser lembrada por tudo que fiz por Jesus e seu pai não fez: a exaltação e a dignificação da mulher ao lado dos homens.

Quem sou eu? Eu dou a luz na dor e na angústia. Finjo que sofro a atração do meu marido e deixo-o pensar que ele é o meu senhor. Eu ignoro a Eva que sou. Não me importo por estar ainda viva, neste mundo, a sentença de Deus contra o meu sexo. Imponho-me como uma ousada. Sou a porta do diabo. Enganei o único quem Belzebu não conseguiu seduzir. Fui eu quem facilmente venceu o homem que é a imagem de Deus. Foi minha recompensa, a morte, que causou a morte do próprio filho de Deus. E mesmo assim, ainda cubro-me toda de ornamentos e túnicas de pele. Não é mesmo, Tertuliano?

Com toda a certeza Eu vos asseguro: onde quer que o Evangelho for pregado, por todo o mundo, será também proclamada a obra que esta mulher realizou, e isso para que ela seja sempre lembrada