quinta-feira, 28 de novembro de 2024

O RISCO DA FÊNIX

Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. LEIA O TEXTO AO SOM DA MÚSICA DO VÍDEO POSTADO NO FIM. Sem ela, a vida seria um erro (Friedrich Nietzsche)

ESCRITO EM 2019

Em meados do último mês de Abril de 2019, Kuriac voltou a fazer contato. Ele é um colega do antigo ginásio que não vejo há mais de meio século. Ele parece viver numa das estrelas Gliese, a mais de 50 anos luz do nosso planeta, me enviando mensagens por radiotelescópio que, de acordo com as leis da astrofísica, demoram milênios para chegar. Tudo que ele me escreve tem cheiro de bolor do passado, mas como o tempo é relativo, o teor de suas missivas versa sobre o nosso presente e são recebidas em tempo real. Kuriac me pergunta qual foi meu diagnóstico depois de uma quimioterapia de 16 semanas. Em Agosto de 2018, quando lhe disse que estava com câncer e seria submetido a uma cirurgia para retirar um tumor de 6 cm, ele emputeceu.'Mas que notícia desgraçada!' Ele acompanhou meu calvário somente à distância, de Agosto até agora, uótizapando com minha mulher, a guerreira Cecília, como ele a chama, lembrando-me de Antígona de Sófocles, reverenciada por Werner Jaeger em Paidéia: A Formação do Homem Grego, um livro que recomendei a ele. Quando lhe disse que Shakespeare se inspirou em Antígona para escrever Romeu e Julieta ele se interessou, não pela história de amor incondicional. Ele quer e vai filosofar e dissecar questões de desobediência civil, de desafio às autoridades. No mês do meu aniversário, a notícia que recebi foi menos furibunda. Minha oncologista confirmou que o nódulo no pulmão, acusado pela recente tomografia computadorizada, não é maligno, nem mesmo requer biópsia. Apenas acompanhamento com exames de praxe de tempos em tempos. 'Mas que notícia maravilhosa,' ele exclamou, 'alegrou meu sábado. Parabéns para você e para a Cecília que segurou com galhardia essa barra a seu lado!' Eu já me preparava para o inevitável e fiz uma viagem do espírito, como Gao Xingjian em A Montanha da Alma. Será que minha próxima tomografia irá revogar minha pena de morte, como no caso de Gao que foi, erroneamente, diagnosticado com câncer no pulmão? Espero que o carcinoma me conceda a manumissão definitiva. Enquanto meu atestado de alforria não for assinado, com firma reconhecida em cartório, não ouso sair por aí fogueteando. Há sempre o risco de dar chabu. Kuriac virtualizou na última idade. O malledeto não veio me visitar no hospital como prometera. Diz um ditado árabe que a primeira pessoa que vem lhe saudar num nosocômio é sempre seu melhor amigo. Você acredita no adágio americano 'A friend in need is a friend indeed?' Será que o verdadeiro amigo realmente aparece quando nos encontramos em dificuldades? Minhas experiências com esta máxima trazem mais dúvidas do que certezas, no que diz respeito à estima entre pessoas do mesmo sexo. Aliás, achei muito engraçado o que falou Oscar, o Mão Santa do basquete, numa entrevista a um programa esportivo: 'Não existe amizade entre homem e mulher, a menos que um dos dois seja feio demais.' Será? Bem, não me presto a esperar por um Godot de Samuel Backett. Não levo jeito para a inércia de Estragon e nem para a inquietação de Vladimir. Parafraseando Eça de Queirós, como não tenho mania francesa e burguesa de jogar as farinhas de regiões e raças no mesmo saco da civilização, quebrei a monotonia abominável do teto do meu quarto cancroide relendo algumas peças de minha juventude: Five Finger Exercise de Peter Shaffer, The Kitchen de Arnold Wesker e The Hamlet of Stepney Green de Bernard Kops. Danem-se os provérbios! Viva a verdade firme e assegurada, de que não pode se duvidar, princípio primeiro do cartesianismo! Ave Cogito, Ergo Sum! Salve a dupla Napoleon Solo e Illya Kuryakin! Kuriac nunca veio à minha casa. Cansei de convidá-lo para um papo e algumas taças de vinho. Eu entendo e respeito sua relutância em aquiescer aos meus convites. Talvez um encontro face to face desguarnecesse nossa solidão licomaníaca, nossas horas de entre lobo e cão, após nossas fadigas cotidianas da luz do dia, quando começamos a arquitetar pensamentos perversos e uivar nossos cogitos. Expor nossas velhas carcaças poderia inibir o que os nossos inconscientes liberam nas altas horas sem permissão. Para ciciar vícios basta esta plataforma. São tesouros escondidos do mundo, exceto dos hackers que abundam nas redes sociais e das grandes potencias espiãs que violam a privacidade de todos internautas. Num rendez-vous tetê-à-tetê nossos olhares poderiam descuidar nossos segredos guardados a medo. Melhor permanecermos os estrangeiros de Albert Camus. Somos agentes ultrassecretos, cada um cuidando de sua rotação, um da terra, outro da lua, e o sol é para todos, conforme Harper Lee expõe de maneira brilhante no seu livro To Kill A Mockingbird. Kuriac considerou boas minhas novas, mas, no meu entender, elas ainda são interinas, por isso não esperei receber alvíssaras. Kuriac, no entanto, deu o meu caso cancerígeno por encerrado e propôs-me a volta à normalidade, muito diferente da definição daquele beneditino apocalítico no livro O Nome Da Rosa de Umberto Eco, segundo o qual 'normal é a preservação do conhecimento e não a busca do mesmo, pois não existe progresso na história do conhecimento, mas meramente uma contínua e sublime recapitulação.' Kuriac quer o retorno à vida na sua plenitude, às ironias, e ainda aconselha: 'Sorria muito, sorria sempre, mesmo que seja com sarcasmo, com desdém. Cultue a disposição sombria do espírito ao escárnio. A misantropia se enternece.' Sobre quais aversões podemos falar? Não podemos ter uma conversa menos filosófica do que humana do tipo Xenophon: Conversations With Socrates: Socrates’ Defence, Memoirs Of Socrates, The Dinner-Party, The Estate Manager? Não, ainda não podemos. Kuriac tem na mão e na alma o retorno ao ordenamento moral: 'A excitação pela luxúria não deve ser tratada com amor, e sim com toda a volúpia e despudor, num frenesi animalesco da carne uivante no cio doentio.' E, em seguida, retoma a fraternidade: 'Vou tomar um vinho branco em homenagem à sua saúde!' Não devo te agradecer, Kuriac, em respeito à parrésia dos gregos, lembra-se? Para, pelo menos, celebrar a sua solicitude e o meu euangélion provisório, esforço-me por alegrar-me com esta pilhéria: 'O que faço com o caixão que minha sogra me enviou de presente?' A resposta veio em segundos: 'Mete ela dentro e joga no incinerador, depois espalhe as cinzas ao vento. Mas sempre há o risco da Fênix!'


TUDO O QUE AS FEITICEIRAS DIZEM E NÃO SABEM


Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.

Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.

Este menino não é seu filho, Ela não se conforma com esta mola das leis, A mãe de todas as religiões, Ela quer rezar. Que ela reze então, Miserere mei, deus: secundum magnam misericordiam tuam, Esta mulher ainda está completamente perdida, Ainda não se encontrou, E o pai do menino, não pode ajudá-la? Um momento, A mulher quer continuar orando, Et secundum multitudinem miserationum tuarum, dele iniquitatem meam, Neste momento, ele está ajudando um amigo japonês que teve uma morte trágica, Como você sabe disso? Porque dou ouvidos às feiticeiras. Os homens na espiritualidade são como as pedras numa abóbada, Resistem e se ajudam simultaneamente. A vida e a morte são combates, Que os fracos abatem, Que os fortes, Os bravos, Só podem exaltar, E quanto ao menino? Um momento, Ela ainda está aqui e quer falar pelos dois, Amplius lava me ab iniquitate mea: et a peccato meo munda me, O menino é um espírito de muita luz, Mas cuidado, O fruto só cai da árvore quando está maduro, Amplius lava me ab iniquitate mea: et a peccato meo munda me, Nossa, esta mulher de novo! Não fale dela assim, Ela está se penitenciando, Está nas sombras e ainda se agarra  à luz deste mundo, À luz deste menino, Agora ouço a voz de uma feiticeira que quer me dizer alguma coisa, Em breve este menino receberá uma merecida e justa quantia, Mas não vos descuidei pois, Também não menos breve, Ele receberá uma cobrança das bravas e é melhor desde já ele começar a juntar todos os recursos que ele tem para se defender. O recado dela é justo. Você sempre conversa com estas bruxas? Acredita no que elas dizem? Falo com elas de vez em quando e acredito nelas, O mais significativo é o fato de que nenhuma  delas tem conhecimento absoluto sobre nós, mas somente alguns pequenos fragmentos de nossas vidas, Não entendi, pode explicar melhor? Vá num mesmo dia se consultar com 10 médiuns diferentes e que nunca se conheceram, daquelas que costumam fazer leitura de tarô, e faça a elas as mesmíssimas perguntas, Você perceberá que cada uma delas consegue responder a uma única pergunta sua, E cada uma diferente da outra, E por outro lado, Cada uma delas te dirá coisas sobre você que você não perguntou, Nem em pensamento, e cada uma delas lhe dirá coisas completamente diferentes umas das outras, Todas verdadeiras, Elas têm apenas um conhecimento relativo e bem limitado sobre as pessoas, Por isso não conseguem responder mais do que uma ou, no máximo duas perguntas que você faz, No entanto, As poucas respostas às suas perguntas e as revelações sobre você feitas espontaneamente serão sempre verdadeiras, e até paradoxais, Uma médium lhe dirá que você ganhará uma fortuna, Mas outra, No mesmo dia, lhe dirá que você sofrerá uma grande perda financeira, E o mais interessante é que as duas são verdadeiras. Como elas conseguem isso? Elas recebem informações de espíritos? Não, espíritos não existem, Elas apenas leem um fragmento de sua mente, Uma médium jamais lhe dirá a mesma coisa que uma outra lhe disse, Desta forma, Você terá dez respostas diferentes para diferentes perguntas que você fez, E 10 informações diferentes sobre você e que você não perguntou, Em resumo, As feiticeiras não têm nenhum controle sobre sua mente, O que elas descobrem a seu respeito é sempre ao acaso, É o mesmo que um sonho, Você nunca sonha com o que quer, É o inconsciente quem decide sobre o que você sonhará cada noite. É interessante. E no caso desta mulher apegada ao menino? Ela está morta e você disse que espíritos não existem. Como ela consegue falar conosco? Isto é contraditório! O que chega a nós não vem diretamente dela, São apenas fragmentos dos nossos próprios pensamentos sobre o que já sabíamos sobre ela. Então deduzo que você é um feiticeiro!  Errado, Tudo o que estou lhe dizendo é pura psicologia humana. As feiticeiras dizem poucas coisas, Mas desconhecem muitas. Elas tem acesso a uma parte bem insignificante de nosso inconsciente que tem o tamanho de um universo, E a mulher quer nos dizer algo mais antes de partir, Ex-umbris ad lucem.


SALOME



Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. LEIA O TEXTO AO SOM DA MÚSICA DO VÍDEO POSTADO NO FIM. Sem ela, a vida seria um erro (Friedrich Nietzsche)

Aurora da religião
Deus fêmeo
Egeu berço da civilização
Áspide e o feminino gêmeo

Sapiência eminente
Rosto de mulher
Cabelo de serpente
Do Éden a Lúcifer

Luz do conhecimento à humanidade
Fim da ignorância manipuladora
Medusa guardiã e protetora
Afugenta toda a maldade

Ananta domina meu tempo e a minha imensidão
Kundalini interioriza minha alma varonil
Per-uatchet dá luz à minha criação
Nehushtan proteja-me contra o veneno viril
Seraph fertiliza meu solo e torna-me angelical
Apep quer lançar-me no caos e na obscuridade
Khumbaba quer amedrontar-me no matagal
Ouroboros morde a cauda das duas e me dá eternidade

Ad te clamamus
Exules filii Evae
Ad te suspiramos
Gementes et flentes
In hac lacrimarum valle

Ariadne, Cessair, Eumenides, Kurukulla, Sophia, Uncegila, Radha, Matangi, Brighid, Luna, Maat, Ambika, Beltia, Daena, Themis, Pandora, Nerthus, Sarasvati, Ragnell, Minerva, Hecate, Demeter, Hel, Surabhi, Iris, Kamala, Machig Lapodron, Horae, Astarte, Danu, Eumonia, Tellus Mater, Aditi, Lakshmi, Dorge, Marcha, Kwan Yin, Oshun, Nemesis, Sheela Na Gig, Tiamat, Varjayogini, Cailleach, Artemis, Dzalarhons, Dakini, Neith, Bona Dea, Tara, Hestia, Zoe, Isis, Amaterasu, Lilith, Cybele, Modron, Ereshkigal, Oya, Hathor, Sekmet, Innana, Ukemochi, Kawadi, Angerboda

Tua sunt ubera
Vino redolentia
Candor superat
Lac et Lília
Odor flores vincit
Et balsama

O clemens, o pia,
O dulcis Maria 





Kore, Nymphe
Meter, Maia


Salome, Rabbetna Salome, Baalet Salome, Tanit Salome, Anaitis Salome, Astarte Salome, Dercerto Salome, Astoreth Salome, Mylitta Salome, Athara Salome, Elissa Salome, Tiratha Salome, Rabbetna Salome, Baalet Salome, Tanit Salome, Anaitis Salome, Astarte Salome, Dercerto Salome, Astoreth Salome, Mylitta Salome, Athara Salome, Elissa Salome, Tiratha Salome, Rabbetna Salome, Baalet...

I have kissed thy mouth, Jokanaan, There was a bitter taste of blood, I have tasted thy lips, Jokanaan, There was a gorgeous taste of love, I have seen thine eyes, Jokanaan, Full of rage and fearful scorn, I have kissed thine eyes, Jokanaan, Never shalt thou see me more, I have touched thy hair, Jokanaan, Black as the cedar shades of Lebanon, I have stroked thy hair, Jokanaan, The moon hid his face from the sun, I have desired thy body, Jokanaan, White as the mountains of Judae, I have clawed thy body, Jokanaan, In the dream whereupon you lay, Now I hold thy head, Jokanaan, In my palm there is thy blood, Why dost thou lift thine eyes, Jokanaan, My chastity could have been your love.

Salome, Rabbetna Salome, Baalet Salome, Tanit Salome, Anaitis Salome, Astarte Salome, Dercerto Salome, Astoreth Salome, Mylitta Salome, Athara Salome, Elissa Salome, Tiratha Salome, Rabbetna Salome, Baalet Salome, Tanit Salome, Anaitis Salome, Astarte Salome, Dercerto Salome, Astoreth Salome, Mylitta Salome, Athara...

I have kissed thy mouth, Jokanaan, There was a bitter taste of blood, I have tasted thy lips, Jokanaan, There was a gorgeous taste of love, I have seen thine eyes, Jokanaan, Full of rage and fearful scorn, I have kissed thine eyes, Jokanaan, Never shalt thou see me more, I have touched thy hair, Jokanaan, Black as the cedar shades of Lebanon, I have stroked thy hair, Jokanaan, The moon hid his face from the sun, I have desired thy body, Jokanaan, White as the mountains of Judae, I have clawed thy body, Jokanaan, In the dream whereupon you lay, Now I hold thy head, Jokanaan, In my palm there is thy blood, Why dost thou lift thine eyes, Jokanaan, My chastity could have been your love.

MARIA BRASILEIRA DO MUNDO INTEIRO

Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98

Neste texto, Alceu homenageia o que há de melhor na música brasileira, aqui com MARIA SOLIDÁRIA de BETO GUEDES.

Maria que é a Maria, É cheia de graça, Cheia de raça, É Madalena, É mãe e tia, É Mariana, É Ana Bolena, Tem corpo que arrepia, Não tem quem não ama, Casada ou solteira, Solidária e companheira, Morre esposa traída, E de seu ventre sai uma rainha, Mulher destemida, Mais poderosa que o rei no xadrez, Lava, passa e cozinha, Não há doce que ainda não fez, Doce de amendoim que o menino roubou, Grita pede, moleque, que te dou, É bonita e valente, Não tem medo do sertão, Não tem medo do que não sente, Luta com o coração, Reza Ave-Maria, Compadecida, É quase negra como Nossa Senhora Aparecida, É a Maria judia, Que inventou o banho-maria, A gororoba com coco ralado, Que ficou mais mole que seu nome, Miriam soberana do hebraico modificado, Que em grego virou Maria, Cobiçada por todo homem, Por toda Maria, Que não vai com as outras, Tem sua ideia factícia, Alma pura como poucas, Ajuda todos os seus, É a preferida de Deus, Brilha no céu, Como Três-Marias, Cada uma com seu véu, Abençoando todas as romarias, Dança no ar enquanto trabalha e canta, Lança sob o luar seu charme enquanto a noite avança, E sob o sol, Sua meiguice que nos encanta, É Maria do futebol, Alegria do povo, É Maria de todos nós, Que desafia quem nasceu primeiro, Pingo D'água sem nós, Nem a galinha nem o ovo, É Maria brasileira do mundo inteiro.