quarta-feira, 6 de novembro de 2024

TEM GENTE NOVA NA TABA POR EXCELÊNCIA

Texto de autoria de AustMathr Viking Dubliner e Inglesa Luso-Chinesa com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.  

Em meados dos anos 70 do século passado, AustMathr presenciou um acontecimento insólito e misterioso. AustMathr disse que jamais ousaria contar o que sabe porque ninguém neste mundo iria acreditar. Então,  AustMathr resolveu escrever sobre isso de maneira fictícia, como num conto, e mudou completamente a relação de parentesco de membros da família para que ninguém jamais descobrisse os nomes das pessoas envolvidas. AustMathr deu a esta história real na forma de conto, ou como queiram, o nome de TEM GENTE NOVA NA TABA POR EXCELÊNCIA. Escolheu uma ilustração e uma música tão estranhas quanto tudo o que AustMathr sabe sobre o fato.

Inglesa Luso-Chinesa
6 de Novembro de 2024

Você passou pela minha vida bem rápido, em fração de minuto, e nela deixou uma marca profunda, mas, com o tempo, ela se fechou até a superfície, sem deixar sinal de sua presença, como estar anestesiada e ter uma penetração por um longo instrumento cirúrgico que logo cicatriza, e ninguém sabe que você foi perfurada, a não ser você mesma e seu cirurgião. Agora que estou morta quero acreditar que você não se esqueceu de mim, que você nunca saiu de perto de mim e sabe de tudo que estou a relembrar, mesmo contra todas as evidências de que isso é impossível, mas me conformo com esta impossibilidade tendo em vista como minha melhor amiga morreu e como minha sobrinha deixou claro para mim a ausência de determinismo e de propósitos em tudo que nos sucede. Ela dizia que não vivemos sob qualquer lei natural e que, se quisermos uma, podemos chamá-la de aleatória. Nossas vidas e todo o universo são um simples acaso, um acidente, e não têm nenhum significado. Ela dizia que o que aconteceu comigo naquela noite foi uma mera coincidência, cercada de mistério que jamais seria desvendado porque não era algo programado. E nunca foi mesmo. Naquela noite você deu um grande susto em mim e em minha melhor amiga. Fiquei com muito medo, mas minha amiga, mais corajosa, queria te desafiar, e eu consegui convence-la a ir embora, quando nos demos conta que quase 3 horas tinham passado em apenas trinta segundos. Ficamos apavoradas e saímos correndo. Cheguei em casa perto das onze horas. Meu marido e minhas filhas estavam desesperados à minha procura. Já haviam acionado a polícia e ligado para vários hospitais e prontos socorros. Como não sabia o que aconteceu comigo e minha amiga, contei-lhes a história que inventei e ensaiei no carro ao retornar. Disse-lhes que meu carro morreu de repente numa rua erma e que demorei muito tempo até encontrar alguém que pudesse me ajudar. Era a bateria que arriou e precisava ser trocada. Meu marido acreditou e se tranquilizou. Fomos dormir quase uma hora da manhã. Eu sabia que iria passar a noite em claro de tão agitada que estava. Mas precisava acordar às 6 como faço todos os dias, mesmo cansada, porque precisava comandar a fábrica. Meu marido logo pegou no sono, e eu fiquei bem quieta e absorta, repassando tudo que aconteceu naqueles 30 segundos. Eu não vi seu rosto, nem ouvi sua voz. Vi apenas o brilho intenso de sua camuflagem. Como sempre acontece, veio a fadiga mental e acabei adormecendo sem perceber, mas acho que não dormi mais do que 4 horas. Quando o despertador soou às 6, você foi a primeira coisa que me veio à mente, mas desta vez sem nenhum trauma. Quando levantei-me tive uma estranha sensação de bem-estar como nunca tivera antes. Me sentia como se tivesse tido um sono reparador de muitas horas seguidas. Estava alegre e com uma disposição descomunal. No chuveiro comecei a cantarolar enquanto tomava banho, algo que jamais fizera antes. Resolvi ir trabalhar com minha melhor roupa e meu perfume mais caro. No café da manhã meu marido ficou desconfiado e me perguntou onde eu ia vestida daquele jeito. Então, tive que improvisar outra história. Disse-lhe que receberia em nossa fábrica um novo e muito importante cliente para nossos negócios e que queria estar muito bem apresentável. Meu marido continuou a me estranhar porque, além de meu ótimo humor, eu comi três vezes mais do que normalmente como pela manhã. Comi demais mesmo, mas não senti nenhuma diferença. Me sentia como se tivesse tomado apenas uma xícara de chá. No carro, a caminho da fábrica, estava super feliz com minha família, minha fábrica de biscoitos, meu trabalho, enfim, com minha vida. Liguei o rádio e fui dirigindo ouvindo música, outra coisa que raramente fazia. Quando cheguei à fábrica, todos me olharam admirados. Antes de ir ao meu escritório, sempre percorria as instalações com minha supervisora. Ela me pediu para andar mais devagar. Só então percebi que estava dando largas passadas, com muita leveza, como se a gravidade tivesse caído pela metade, sem sentir o impacto de meus pés no chão, como se estivesse, literalmente, andando nas nuvens. Era muito estranho, mas eu achava natural. Ninguém repara  em nada quando se sente bem, só se espanta quando se sente mal. No escritório, como sempre, havia uma pilha de assuntos pendentes à espera de soluções. Pela primeira vez em minha vida consegui, em poucos horas, resolver problemas de uma semana inteira, encontrando solicitude e boa vontade em todos as pessoas com quem conversei por telefone. Saí mais cedo para almoçar e levei comigo algumas funcionárias, tamanha era minha vontade de compartilhar minha satisfação. Tudo transcorria bem. À tarde, sem ter nada com que me preocupar ou que exigisse minha atenção e orientação, resolvi rever alguns projetos de novos produtos que estavam engavetados havia muito tempo. De imediato, admirei-me com o fato de nunca tê-los levado adiante. Na hora decidi reativar todos eles ao mesmo tempo. Falei com várias pessoas e recebi de todas elas apoio e aceitação incondicionais, o que me permitiu vislumbrar um significativo aumento na minha linha de produtos e, consequentemente, expansão da empresa e contratação de mais empregados. Eu estava entusiasmada, exultante, e passei a trabalhar até quase dez da noite. Meu marido continuava muito cismado, mas ele sempre foi muito compreensível e sensato e acabou percebendo que tudo o que eu fazia era para o bem de nosso empreendimento e de nossa família. Qualquer desconfiança que ele pudesse ter se desfez, principalmente na hora de dormir, porque eu tinha vontade de fazer amor três vezes seguidas todas as noites. Ele ficou muito feliz com meu ânimo, mas depois da segunda vez ele se cansava e pegava no sono. Eu ainda permanecia acordada uma hora ou mais, sempre tendo novas ideias que eu poderia por em prática no dia seguinte. Tudo era intrigante, mas ainda assim sempre me parecia normal. Tudo o que fazia ou pensava fazer dava certo. Continuava repousando poucas horas e despertando com a sensação de ter descansado as 20 horas de um leão, sempre contente e animada. Esse estado de espírito durou exatamente duas semanas. Depois tudo voltou ao normal. Quando procurei minha amiga para lhe contar o que me sucedera, fiquei atônita ao saber que ela passou pela mesmíssima experiência que tive. Prometemos que isto seria mantido em segredo. Nem nossos maridos, nem nossos filhos jamais saberiam disso. Um ano mais tarde, minha amiga sofreu um acidente de carro fatal, na estrada já próxima de nossa cidade. O impacto foi violentíssimo e ela deveria ter morrido na hora, mas ainda foi levada com vida a um hospital. Quando eu e meu marido soubemos do ocorrido no dia seguinte, corremos para o hospital e, ao lá chegarmos, ficamos surpresos ao vê-la num quarto comum conversando normalmente com seu marido, com alta marcada para a manhã seguinte. Um dos médicos disse a ele que ali operou-se um verdadeiro milagre, porque minha amiga chegou em estado gravíssimo, foi colocada numa UTI e ele jamais teve qualquer esperança de que ela pudesse sair do estado de coma. Foi minha própria amiga quem me contou o que ocorreu. Ela esperou nossos maridos saírem juntos para tomar um café na lanchonete e me disse que não se lembrava do acidente porque perdeu a consciência e só acordou na UTI com muita dor, mas rapidamente aliviada com aquela mesma sensação de bem-estar que nós duas tivemos durante duas semanas um ano atrás. Nós duas estávamos perplexas. Coincidentemente, mais um ano depois, minha amiga teve outro acidente de carro na mesma estrada e desta vez não pode ser socorrida. Ela morreu no local. Fiquei muito tempo pensativa e perturbada. Eu, meu marido e meus três filhos costumávamos visitar meu cunhado em outra cidade. Ele é irmão de meu marido e tem dois filhos, um deles casado com uma moça extremamente inteligente. Minhas três filhas, com idades entre 15 e 18 anos, sempre gostaram muito de conversar com minha sobrinha. Ela é culta, solícita, bem versada em vários assuntos, tem uma paciência de Jó para responder, com clareza, a qualquer pergunta. Numa destas visitas, minhas filhas conversavam com minha sobrinha e, de repente, ela esbarrou num assunto que me fez lembrar de tudo o que se passou comigo e minha amiga. Quando minhas filhas  deixaram o recinto e fiquei a sós com minha sobrinha, resolvi dividir com ela o segredo que mantive com minha amiga que já não estava mais entre nós. Eu não poderia guardar aquele segredo só para mim. Precisava dividi-lo com alguém, e minha sobrinha era a pessoa mais indicada e confiável para isso. Contei-lhe tudo: aquela enigmática noite, aquelas duas semanas inesquecíveis, o acidente de minha amiga, sua recuperação e seu novo acidente seguido de morte. Minha sobrinha ouviu-me atentamente e estarreceu-me ao dizer que já havia ouvido falar de casos parecidos em outros lugares. No entanto, ela não tinha nenhuma explicação para tais fatos, e alertava-me para jamais cair na tentação de querer encontrar um motivo lógico e muito menos de procurar por esclarecimentos místicos. Ela nunca duvidou da veracidade de meu relato, mas sempre manteve a postura de uma cientista, de pés no chão, racional, do tipo São Tomé: ver para crer. 'Tudo o que acontece em nossas vidas é mero acaso', dizia ela. E mesmo que eu tentasse arrastá-la para algum tipo de abordagem menos racional, ela retrucava que o mais próximo que ela conseguia chegar a uma abordagem filosófica, para não dizer transcendente da fé, era citar uma célebre frase de Shakespeare: 'Entre o céu e a terra há mais mistério que nossa vã filosofia sonha'. Conformei-me e segui a minha vida com o que aprendi com minha sobrinha, até o dia de minha morte, e parece que fui antes da hora. Fui hospitalizada com um problema de saúde curável, mas morri. Tive a impressão de ter ouvido a minha cunhada dizer à minha sobrinha que estranhava minha morte prematura e que não duvidava de erro médico. Pensei muito em você. Por que você não veio me salvar como você salvou minha amiga naquele terrível acidente do qual ninguém neste mundo escapa? Levei para meu túmulo o que afigurou-me ser ecos de sua voz dizendo: 'Parece que houve gente nova na sua taba por excelência'. 'Mas o que você  quer dizer com ''taba por excelência''?'perguntei. E senti ter ouvido: 'Apenas o nome de sua última morada sobre a terra'.



música LOFTCRIES de PURITY RING

Green, green thunder and the, Loud, loud rain, Lead our woes asunder, 'Neath the proud, proud veins, Of trains let bleed the gunmen of our, Pumping earthly hearts, Wean or joys and plunder, Peel our shining teeth, Bid our hold on happiness, Beat weighty tests with lofty cries, Lofty cries with trembling thighs, Weepy chests with weepy sighs. Weepy skin with trembling thighs, You must be hovering over yourself, Watching us drip on each other's sides, Dear brother, collect all the liquids off of the floor, Use your oily fingers, Make a paste, let it form, Let it seep through your sockets and ears, Into your precious, ruptured skull, Let it seep, let it keep you from us, Patiently heal you, Patiently unreel you, Beat weighty tests with lofty cries, Lofty cries with, trembling thighs, Weepy chests with weepy sighs, Weepy skin with trembling thighs, You must be hovering over yourself, Watching us drip on each other's sides, Dear brother, collect all the, liquids off of the floor, Use your oily fingers, Pick up paste, let it form, (Lofticries), Beat weighty tests with lofty cries, Lofty cries with trembling thighs, Weepy chests with weepy sighs, Weepy skin with trembling thighs, (Lofticries), You must be hovering over yourself, Watching us drip on each other's sides.

AUDACIOUS AND SENSUAL INGLESA


 

terça-feira, 5 de novembro de 2024

CANÇÃO DA MELANCOLIA

Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.  

Um sol vivendo e trabalhando plena luz, De sorriso infantil, Não toma as nuvens por Juno, Abre o céu para todos reclusos espairecerem suas tristezas no dilúvio de claridade que derrama sobre as sombras da terra, Tira Greta Garbo da penumbra, E Prudence Farrow de casa para saudar o dia com Mia e John, Do alto de um telhado, No topo do mundo, Onde uma doce brisa beija e balança suavemente os cabelos como pendões de damas entre verdes, Entre azuis sem horizontes, Sopra para o meio do firmamento, Um papagaio de papel, AltoDe braços apartados em cruz, Bailando inquieto, Como torre esguia de igreja, Fazendo-se ao largo do cosmos, Aqui no chão choro, Pela linha que se desenrola e se solta para o infinito, Deixando um saudoso aspecto lembrando, A lacrimosa e pequenina estrela que se mistura às outras invisíveis que te ofuscarão com o brilho da noite de amargura quando ela chegar, Quando a melancolia voltar, Venha, Então, Me abraçar, Dormir no meu sono, Sonhar no meu sonho, Com um novo foco luminoso que logo vai voltar a acender os corpos sombrosos sobre nossas almas angustiantes.  

música: MELANCHOLY SKY de GOLDFRAPP

[Verse 1]
Late into the night
Comes a glow like ice
Numbers on my phone
I don't recognise
There in black and white
All your twisted thoughts

[Verse 2]
Brutal starry eyes
Stuck inside your head
Fallen from the sky
Risen from the dead
Views from all the past
Taken to new heights

[Chorus 1]
Melancholy sky
You made me blue
Still hanging on
There's nothing I can do

[Post-Chorus]
Not this time

[Verse 3]
There you are again
Calling from the hills
Haunted and the damned
From imagined worlds
It's too late, my friend
I don't love you anymore

[Chorus 1]
Melancholy sky
You made me blue
Still hanging on
There's nothing I can do

[Chorus 2]
Melancholy sky
Still hanging on
You're crazy now
I didn't do you wrong

[Post-Chorus]
Not this time;


segunda-feira, 4 de novembro de 2024

INGLESA'S HYBRID CLONE RESISTING ORION SPUR’S DYNASTIC DOMINATION











[Verse]

And I'm outside in the dark staring at the blood red moon

Remembering the hopes and dreams I had and all I had to do

And wondering what became of that boy and the world he called his own

I'm outside in the dark wondering how I got so old

 

[Chorus]

It's all gone, it's all gone

Nothing left of all I loved

It all feels wrong

It's all gone, it's all gone, it's all gone

No hopes, no dreams, no world

No, I don't belong

I don't belong here anymore

 

[Instrumental Bridge]

 

[Chorus]

It's all gone, it's all gone

I will lose myself in time

It won't be long

It's all gone, it's all gone, it's all gone

 

[Outro]

Left alone with nothing at the end of every song

Left alone with nothing at the end of every song

Left alone with nothing, nothing

Nothing

Nothing

Nothing


domingo, 3 de novembro de 2024

MONOCROMIA DOS CÂNTAROS DE CRISTAIS

Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.

É assim que quero que você me veja, Sou um pássaro que voa alto, E corta o solo numa rasante, Sem nunca precisar pousar, Sem nunca precisar plainar, E te arrebato em pleno ar, 

É assim que um homem como eu te almeja, Escalo até  o pico de um penhasco e me jogo no abismo, E você nunca me verá vacilando em queda livre, Nunca verá meus olhos com medo de se esborrachar, 

Não será suficiente para mim você me observar, Não será suficiente para mim você me enquadrar, Não será suficiente para mim você me fotografar, Não será suficiente para mim você me revelar, 

É assim que você quer que eu te veja, Você é um vento que sopra forte, Risca a noite com raios, Troveja e faz o céu estremecer, Ruge como uma tempestade de se enfurecer, E acerta em cheio o vazio de me querer, 

É assim a mulher que um homem deseja, Você salta do alto da vida para a morte, E nunca verei você fazer ensaios, Nunca verei você arrefecer, 

Não será suficiente para você um mundo sem mudança, Não será suficiente para você uma vida só de esperança, Não será suficiente para você um presente que não avança, Não será suficiente para você um futuro que não se alcança, 

É assim que quero viver, É assim que eu quero que você viva por nós, Sou um sol que brilha para iluminar, Sem precisar arder, Sem precisar proteger, É assim o homem que uma mulher quer ter, É assim que o mundo quer nos ver a sós, Subindo até o último degrau até nos desequilibrarmos, Até escorregarmos, Até cairmos e nos despedaçarmos, 

Não me basta ser apenas um homem sobrevivente, Não me basta ser apenas um animal inteligente, Não me basta apenas parecer valente, Não me basta  apenas te ser suficiente, 

É assim que quero minha mulher, É assim que quero que você me veja como uma miragem, Sou névoa de ansiedade para ver o dia raiar, Que cai da escuridão até a manhã orvalhar, Até o sol dissipar, 

É assim que você me quer, É assim que você quer registrar minha imagem, Na monocromia de seu olhar, É assim que você quer me amar, 

Não será suficiente para você não parar de fazer amor, Não será suficiente para você absorver todo meu calor, Não será suficiente para você me fartar com seu ardor, Não será suficiente para você fazer muito sexo mesmo com muita dor, 

É assim que você quer ser, É assim que você quer que eu te veja, Sou um cachorro vira lata longe da casa que me enxotou, E você nunca me verá voltar, Nunca me ouvirá ladrar, Nunca me verá mendigar, 

É assim que você quer me ter, É assim que uma mulher como você me almeja, Mergulho até o fundo do mar, E você  nunca me verá desmaiar, Nunca me verá me afogar, 

Não será suficiente para mim posar para o teu olhar, Não será suficiente para mim olhar para seu andar, Não será suficiente  para mim andar no seu caminhar, Não será suficiente para mim caminhar no seu lugar.

Somos cântaros de cristais, Quebramos fácil demais, A monocromia de nossos atos inconsequentes, Não desbotará as cores que ainda recobrem nossas almas incandecentes.


sábado, 2 de novembro de 2024

DEUS SALVE A RAINHA MARY QUANT

Texto de autoria de Alceu Natali. Direito autoral protegido pela Lei 9610/98. 

Quem não se vangloria da época em que viveu? A nossa é sempre a melhor de todas, do passado e do futuro. Eu tenho orgulho, brada Vespúcio. Sou da época das grandes navegações e descobri o vasto continente americano antes do pobre Colombo que se perdeu nas ilhas do Caribe. Hah hah, cagou-se de rir um esquimó! Cheguei na América 12 mil anos antes de você, atravessando o mar congelado, vindo da Ásia durante a última glaciação. Permitam-me um aparte, senhores, rumorejou Péricles. Sou de minha época! E daí? E daí que vos lhe pergunto quanto vocês dariam para ter vivido nos tempos de Sócrates e Platão? Estes nomes ecoaram e atraíram para o simpósio, sem trelho nem trebelho, impressionistas, vitorianos, trovadores, e toda sorte de epocais. Larguei todos à beira da altercação parecida com tagarelamento de mulheres as quais, não tenho dúvidas, meu colega Ergo Sum diria: Agora vai falar uma de cada vez, começando com a mais velh... Ah, se meu pai aqui estivesse, ele falaria de sua pauliceia européia e romântica, dos anos 40, tempo em que os rapazolas, mesmo os mais humildes, andavam de terno, gravata e chapéu, e sem esse indumento não podiam entrar num cinema. Desculpem-me, galera, com os primeiros hormônios em erupção e os bengalantes e craques de dominó. Eu tive o privilégio de chegar à adolescência em plenos e gloriosos anos 60 que deram início e atingiram o auge da criatividade, da liberdade, da magia e de todas as mais belas manifestações e expressões de cultura e arte as quais você pode dar qualquer nome, por exemplo: a dream come true, um sonho quase impossível mas que acaba, como John Lennon anunciou quando os Beatles se separaram. Foram seis anos de puro encantamento: de 1964 a 1969. Se você tinha entre 15 e 19 anos, como eu neste período, então você deve ter ouvido falar deste estado vigil ao qual o espírito se entrega enlevado. Se você viveu num país atingido em cheio por esta vara de condão de prestidigitação, então você pode ter estado bem perto ou até mesmo dentro deste arroubo. O centro desta nova onda foi uma estrela chamada música em torno da qual todos esplendores da juventude orbitavam. Mas não foi qualquer combinação de sons. Foi um ritmo único no mundo com a marca da originalidade, beleza e êxtase total. Veio de muito longe, do Reino Unido, que mal havia sacudido a terra de Vitória e logo veio aportar na terra das oportunidades. A América já tinha sua revolucionária solfa negra, que os ingleses tomaram emprestado e britanizaram, inconscientemente preparando um campo libertino e minado pronto para explodir, precisando apenas de um catalisador: os Beatles e seus conterrâneos invadiram o imenso reduto dos Yankees e, de roldão, o resto do mundo, e exceleram e quintessenciaram a pop music para sempre. Tudo que entrava no primeiro dos infernos rebatia aqui no quinto que tinha, e ainda tem, Sampa como o centro de tudo, onde tudo acontece. Sampa fervilhava com vários gêneros: bossa nova importada do Rio, tropicália da Bahia e jovem guarda da própria terra da garoa. Mas minha geração tinha ouvidos somente para o que era considerado cool and groovy (awesome and terrific nos dias atuais). Boys and Girls of the same feather flocked together. Todo santo sábado havia um baile na casa de alguém onde só rolava rock and roll. Realizar baladas todos os fins de semana não era, necessariamente, um pretexto só para transar. Não precisávamos de explicações sobre o momento mágico que vivíamos. Intuitivamente, os jovens marcavam encontros semanais para celebrar esta curta fase fascinante e inigualável de suas vidas, como num ritual fraterno, etéreo e transcendental. Estávamos diante de um fantástico psicodelismo, a manifestação da alma, vestidos a caráter, com as extravagantes e incrementadas roupas inglesas. Graças aos britânicos mais uma vez, as meninas vinham de minissaias, inventadas pela estilista Mary Quant (hallowed be thy name) em Londres. Ela recebeu a maior condecoração da Grã-Bretanha concedida a uma pessoa: o MBE - Membro do Império Britânico. É provável que o reverso da medalha tivesse a efígie da vagina real. Bem que as minas paulistanas mereciam um prêmio igualmente apoteótico. Elas nos agraciavam com a oportunidade de conhecer as cores de suas calcinhas e dos pelos pubianos das que nada usavam por baixo. Thy kingdom come to stay, Mary. Os garotos iam de calça Lee apertada, camisa bufante, colete, cinturão e bota de salto carrapeta. Tudo girava em torno da extraordinária música da Swinging London e adjacências. A mocidade reunia-se para confraternizar-se, ouvir música, dançar, beber e get high. Mas não se enganem: as meninas não eram nada ingênuas e tampouco promíscuas! No meio daquele frenesi rolava sexo apenas como sobremesa de um jantar. Entendeu? Acho que não. Música lenta colava os rostos e as coxas. O par não se tocava no rock ligeiro. Fazia coreografias estroboscópicas como as luzes que saiam das paredes e do teto cobertos de luz negra, como Jumping Jack Flashes. Numa mão um copo de cuba libre (rum com Coca-Cola), noutra um baseado da hora. Nada de acanhamento, rodeios e preliminares. O pessoal chegava e punha para quebrar com força total, com um petardo dos Rolling Stones. A turma entrava em transe, mas ninguém terminava a noite caindo pelas tabelas, e os garotões acompanhavam, cavalheirescamente, todas as pequenas de volta às suas casas. Não entendeu? Não te culpo por isso. Longe de mim alugar vosso tempo tentando resgatar o verdadeiro espírito da época que vivi. Como Doris Lessing escreveu, tentar reproduzir o ambiente moral de uma era é o mesmo que tentar reproduzir a qualidade de um sonho, pois nenhum tipo de comunicação é possível, a menos que outra pessoa tenha tido o mesmo sonho que você teve e disso você não poderá ter nenhuma prova ou garantia, mas somente confiança e fé. Eu e muitas pessoas tiveram o mesmo sonho. Se você não teve, lamento. Mas o espírito das minissaias você sacou. Não? Saquei mais do que você imagina, ironizou Picasso atrás de mim. De palheta de vulva pubis entendo mais do que qualquer sarapintado. Posso juntar todas estas nuances que você diz ter visto e muitas outras que você nem sonha ver, pincelá-las e aprisioná-las numa tela e dar a ela um nome como...de que época você disse que é? Dos anos 60. E qual é mesmo o nome de sua belle époque? Hum, pode ser psicodelismo. Que tal 60 tons de Psicassolismo? Ou, talvez, fique melhor Psicopubismo, anverso de Psicocubismo!




Get Off of My Cloud

The Rolling Stones

Track 7 on December’s Children (And Everybody’s)

Produced by

 

Andrew Loog Oldham

One of the earliest #1 hits of The Rolling Stones, “Get Off My Cloud” was released in November 1965 as a 7-inch single; in December of that year, it appeared on the Stones'… Read More

Sep. 25, 1962

 

 

Get Off of My Cloud Lyrics

[Verse 1]

I live on an apartment

On the ninety-ninth floor of my block

And I sit at home looking out the window

Imagining the world has stopped

Then in flies a guy

Who's all dressed up just like the Union Jack

Says, I've won five pounds

If I have his kind of detergent pack

 

[Chorus]

I said, "Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Don't hang around 'cause two's a crowd

On my cloud, baby"

 

[Verse 2]

The telephone is ringing

I say, "Hi, it's me, who is it there on the line?"

A voice says, "Hi, hello, how are you?"

“Well, I guess I'm doing fine“

“It's three AM, there's too much noise

Don't you people ever want to go to bed?

Just because you feel so good

Do you have to drive me out of my head?”


[Chorus]

I said, "Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Don't hang around 'cause two's a crowd

On my cloud, baby"

Yeah

 

[Verse 3]

I was sick and tired, fed up with this

So I decided to take a drive downtown

It was so very quiet and peaceful

There was nobody, not a soul around

I laid myself out

I was so tired and I started to dream

In the morning the parking tickets were just like flags

Stuck on my windscreen

 

[Chorus]

I said, "Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Don't hang around 'cause two's a crowd

On my cloud,"

 

[Outro]

Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Hey (Hey), you (You), get off of my cloud

Don't hang around, baby, two's a crowd

On my cloud

sexta-feira, 1 de novembro de 2024

AO ETERNO E INFINITO

Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98


Trem que parte de estação escondida numa deformação do espaço e do tempo de um arrabalde de alta densidade. Estação naturalmente conhecida por todos seus confinantes. No seu bojo carrega gente. Somente vidas risonhas e fugidias, vidas em movimento, que se sentem encontradas e preferem apenas partir sem atinar para o  destino. Já têm todo alento e sabem o que o amanhã trará. Lentas e ruidosas, rodas trotam pelos trilhos. O professor sem formação começa a recortar as imagens que entram pela janela. A psicóloga sem diploma é arquitetada na mente de uma marginalizada, lendo cartas de tarô em casa e farejando novos clientes na igreja. Em cada vagão todos se conhecem e são amigos. Todos precisam de pouco amor para atenuar uma dor que não têm. Uma única mulher sofisticada até agora se sente incomodada no meio de tantas pessoas, apesar da classe única ser espaçosa, confortável e quase privativa. Em cada estação todos se confraternizam e se dispersam. Todos já passaram por lá muitas vezes. Nenhum é especial e nenhum se detêm,   o movimento importa. De estação em estação entram e saem e se saúdam. Da mente da marginalizada as vidas apenas saem e se constroem nas fantasias de uma contadora de histórias de assombrações e nas revelações políticas e veladas do colecionador de recortes de jornal. Vem-lhe à mente sua impressionante e derradeira conversa com a única confidente que se impregnou em sua memória de forma indelével e traz-lhe recorrentes lembranças da última vez que ela falou-lhe tanto sobre segredos encontrados nos sonhos, numa situação semelhante àquela vivida na penúltima conversa, e ambas caracterizadas por palavras opostas àquelas que um censor emprega para depreciar os humildes anseios alheios: coerência com o conteúdo básico do conhecimento absoluto e ocorrências simultâneas sem relação causal, mas com o mesmo significado; muito mais que sonâmbulas: verdadeiras projeções astrais; oníricas, mas impessoais; tão lógicas quanto o conceito de desordem no universo e tão constantes como a insensata busca por um significado para a vida. E ao contrário da maneira de conceber e realizar atribuída pelo desagregador aos que se movem pela felicidade, as verdades que nessa penúltima estação se comprimiam intensamente como num ovo cósmico eclodiram quando a marginalizada pretendia dizer coisas feitas para não enganar, mas que fazem com que todos se sintam enganados. No entanto, estarão enganados para sempre aqueles que nunca se empenharem em compreender a querença desta explosão, que não forja um limite, segue em frente, até o fim da linha que não existe, e se dissolve com a vida que ilude.

PRESENTES DE AMOR E O MITO DA MULHER APANHADA EM ADULTÉRIO

Texto  de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. 


No início dos anos 90, resolvi reler todos os diálogos de Platão que eu conhecera nos tempos de faculdade. Naquela ocasião, decidi ler, pela primeira vez, os diálogos considerados menores e de au
toria duvidosa: Hiparco, Os Rivais, Teágenes, Clitofonte, Minos e O Segundo Alcibíades. Este último tornou-se o meu favorito. Seu tema, a prece, contém, em muitas passagens, o espírito do platonismo e do estoicismo que pessoas anônimas usaram para escrever parte dos evangelhos cristãos. É muito bonito, por exemplo, a prece do poeta desconhecido que Sócrates aprova: Dá-nos, Zeus, os bens que pedimos e os que silenciamos, e afasta de nós os males, mesmo se o pedirmos por não sabermos que são males. No entanto, este diálogo não é de Platão. É de um admirador anônimo, escrito entre o século 3 e 4 antes da era comum.

Quem conhece os diálogos de Platão, logo percebe que O Segundo Alcibíades contém falhas nas associações e força argumentativas e ausência do habitual senso de humor com o qual o grande filósofo atenuava a investida dos questionamentos de seu mestre. O autor demonstra que conhece, profundamente, o estilo de Platão, no entanto, em várias passagens, a linguagem usada não é Platônica. O texto contém muitos erros de  estrutura e dicção. Em 151B, a frase grega é literalmente traduzida Eu ficaria feliz em ver-me aceitando, o que não é nada Platônico. Uma das provas de que o diálogo foi escrito muito tempo depois de Platão está na palavra grega usada para respondido em 149Bapokrithenai, enquanto Platão teria usado apokrinasthai. Outros exemplos: Em 148C, as palavras chronou oudenon parecem significar tempo passado em Grego e, certamente, não é Platônico (No livro de Aristóteles, Física, na passagem IV. 13.5 as palavras o parekon chronos significam tempo presente). Em 145D as palavras ana logon são usadas no genitivo na passagem 29C do livro Timeu de Platão, enquanto a frase Platônica normal para esta passagem é osautos.

Platão teve muitos imitadores e admiradores anônimos, mas este que escreveu o Segundo Alcibíades, é mais que isso. Como devemos entender uma pessoa que escreve uma obra magnífica, imitando seu ídolo, e prefere permanecer no anonimato ao invés de desfrutar da glória de um filósofo, mesmo que de um plagiador? Como devemos entender uma pessoa que encerra o diálogo com esta nobre máxima: Amão diz que prefere o culto discreto dos lacedemônios aos sacrifícios de todos os helenos reunidosem resposta às queixas dos Atenienses de sempre levarem a pior nas batalhas contra os Espartanos? Isto não é um plágio oportunista ou uma imitação barata. Isto é um presente de amor para a  posteridade.

Os maiores imitadores de Platão, no entanto, não foram meros e frustrados pretendentes a filósofos, mas, sobretudo, os cristãos. Boa parte das histórias e grandes máximas que aparecem nos evangelhos canônicos, conhecidos como Marcos, Mateus, Lucas e João, foram baseados nos diálogos de Platão e na cultura grega. Todas as pessoas que inventaram as histórias contidas nos evangelhos eram anônimas e inspiraram-se em várias fontes, principalmente a Grega, mormente a Platônica (muitos acadêmicos costumam dizer que o cristianismo é um neoplatonismo). Todos os evangelistas eram cultos, falavam Hebraico, Aramaico, Latim e Grego, e liam livros acessíveis somente à nobreza, como os diálogos de Platão. Eles fizeram uso da obra de Platão e de outros pensadores gregos para inventar o que hoje chamam de moral cristã. A igreja deu nomes aos autores destes evangelhos, mas quando aqui faço menção a qualquer um deles, não refiro-me a uma pessoa que existiu e cujo nome conhecemos. Quando digo João, refiro-me ao autor anônimo que escreveu o evangelho conhecido pela igreja Católica como sendo de São João.

Os autores anônimos dos evangelhos canônicos não tinham admiradores ou imitadores, mas concorrentes, anônimos também, e que escreviam seus próprios evangelhos, como várias pessoas de diferentes regiões fizeram ao longo de mais de um século. Como o conteúdo destes evangelhos concorrentes não atendiam aos interesses imediatos da igreja católica dominante, foram chamados de apócrifos e banidos, mas redescobertos nos tempos modernos. Para cada um dos quatro evangelhos canônicos existe, pelo menos, cinco apócrifos. O que os evangelhos canônicos mais tinham eram adulteradores,  dentro da própria igreja cristã que, por séculos, modificou as histórias dos evangelhos para atender aos seus proselitismos e manter seus fiéis sob rédeas  curtas. A maioria das adulterações é bem visível e até grotesca. No entanto, os autores originais e anônimos dos evangelhos eram bem criativos e inventavam histórias mirabolantes, intrigantes e, às vezes, até assustadoras e surpreendentes, comprometendo a imagem de seu ídolo mitológico que se tornou a figura central da maior religião da humanidade.

Há uma história famosa e interessante no evangelho de João, conhecida como A Mulher Apanhada Em Adultério, que requer atenção especial. Em qualquer bíblia de livrarias ou de hotéis e igrejas, está história aparece nos capítulos 7.53 a 8.11, mas o mundo acadêmico nem sequer a cita em seus estudos científicos da literatura cristã primitiva. Por quê? Porque, embora ela não seja diferente de outras histórias sobre Jesus encontradas nos evangelhos sinóticos (Marcos, Mateus e  Lucas), ela não foi escrita pelo autor original do evangelho de João. Ela tem muitos problemas como o Segundo Alcibíades que foi, erroneamente, atribuído a Platão.

Esta história não aparece em nenhum dos manuscritos unciais Gregos, a não ser num único conjunto deles, sendo os principais três manuscritos datados do século 4 da era comum, o Sinaiticus, Vaticanus e Freerianus, e um do século 9, o Koridethian. Um manuscrito uncial do século 8 e outro de século 9 omite esta história, deixando um espaço vazio onde ela outrora fora inserida, o que denota que já naquela época era considerada não autêntica. Além disso, vários manuscritos cursivos omitem a história, enquanto os manuscritos cursivos de Ferrar colocam esta história no evangelho de Lucas, entre o discurso apocalíptico do capítulo 21 e a abertura da história da paixão no capítulo 22. Outros a colocam no final do evangelho de João e outros depois do capítulo 7. O  mais interessante é que durante os primeiros mil anos da era cristã nenhum comentarista Grego fez qualquer menção a esta história. Na verdade, evidências desta história só aparecem nos manuscritos latinos e ocidentais, sendo o mais antigo deles o Códex Bezae do século 5.

Fora estas anomalias nos manuscritos unciais e cursivos da igreja, o que torna esta história uma invenção bem tardia é o fato de que seu autor comete os mesmos erros cometidos pelo autor do Segundo Alcibíades. A partícula grega de aparece 10 vezes nesta curta história e não é uma palavra característica de João. Ela aparece 202 vezes no evangelho inteiro, ao passo que João usa com a mesma frequência (195 vezes) a partícula grega oun. Para a palavra multidão, João usa o grego ochlos, mas nesta história, o inventor anônimo usa o grego laos. Em todo o evangelho, João chama os opositores de Jesus simplesmente de Os Judeus, mas nesta história eles são chamados de Escribas. Para a palavra cedo, João usa o grego proi (ver capítulos  18, 20 e 21 de João), mas nesta história a palavra grega usada é orthrou.

Se esta história não faz parte do evangelho, então de onde ela veio, com qual propósito foi criada e por que ela foi inserida justamente ali, entre os capítulos 7.52 e 8.11? Uma história parecida com esta foi mencionada pela primeira vez nas Constituições Apostólicas  dos séculos 3 e 4 da era comum, sem ser, no entanto, atribuída a nenhum evangelho. O Bispo cristão, Eusébio de Cesárea, que viveu do ano 260 a 339 da era comum, menciona em seu livro, A História da Igreja, que um tal de Papias relata uma outra história de uma mulher acusada de pecados perante Jesus e que estaria contida no Evangelho dos Hebreus. Eis as palavras de Eusébio no capítulo III, versículo 39: Papias também faz uso de evidências tiradas de 1 João e 1 Pedro, e relata a história de uma mulher falsamente acusada de muitos pecados perante Jesus. Esta história é encontrada no Evangelho dos Hebreus. Eusébio não associa ou compara esta 'outra história' de Papias à história contida em João 7.53 e 8.11, simplesmente porque no tempo de Eusébio, século 4 da era comum, a história da Mulher Apanhada Em Adultério não existia.



A exemplo do que fez o autor do Segundo Alcibíades, o autor da Mulher Apanhada Em Adultério nos legou outro presente de amor com a grande máxima: Que atire a primeira pedra quem não tiver nenhum pecado. Deixo para o leitor o desafio de dar respostas às três perguntas feitas no parágrafo anterior. Ofereço este texto como meu presente de amor para os carregadores de tirso que passaram a vida andando em círculos e aos bacantes que sempre caminharam em linha reta até a apoteose ou, conforme a versão cristã desta máxima de Platão, para os chamados que me fazem companhia no anonimato e para os escolhidos que se fazem acompanhar somente pelo estrelato


ESPORA ORIONIS - O CÍRCULO DE BACHIR: MOMENTO DAS MENINAS DA PRAIA

Texto de autoria de AustMathr Viking Dubliner e Inglesa Luso-Chinesa com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. 

Bachir: Hoje temos gente nova no círculo. Apresente-se, Abulition!

Abuliton: Que saudade da noite em Perequê-Mirim, recostado no colchão, deitado sobre terreno chão, recebendo luz do corredor através da fresta da porta a Iluminar minhas Brumas de Avalon e atender ao meu desejo de paz podre por uma lua e o que sobrou num sol.

Bachir: Muito bom! Agora você, Maranta!

Maranta: Eu também. Sinto falta das noites de Comburiu, sentada à mesa, escrevendo, juntando letrinhas, como dizia Carlos Roberto Zen, que me trouxeram aqui hoje e me deram momentos de prazer, um presente do tempo que preciso devolver aos que amo e aos que sobrevivem.

As meninas da praia.




Phalaenopsis: Gostaria de fazer um aparte. Orlas da terra, em declive suave, ordinariamente cobertas de areia, e que confinam com o mar. Certa vez, um sujeito me disse que viver é tomar um bom vinho e lembrar o passado. Com a invasão carcinógena no meu aparelho digestor, onde minha degustação torna-se diluta, meus vinhos agora são dos mortos, enterrados no céu da boca. Saudoso nem sempre fui, mas das meninas não esqueço. Aqui estou, recostado no sofá, cabeça reclinada para trás, a escutar como quem presta ouvido às vozes que da cozinha me convidam para jantar, vozes longínquas às memórias que meus olhos cerrados estão a imaginar, cercados de um lado pela vastidão do oceano, no chão a maciez da areia para pés descalços, no alto o sol dourado cortado por algumas pipas coloridas que enfeitam o olhar, como os sorrisos de todas as meninas que cirandam sem parar, e riem desde a manhã até o fim do dia que elas nunca veem chegar, felicidade com as companhias que parece se eternizar. Elas não devem ter ouvido meus pensamentos prazenteiros, e não podem me despertar. Para onde foram? O que fizeram de todas aquelas lembranças? Espero que tenham ficado com a maior parte de minha alegria, e a menor de minha solidão. Espreguiço meu corpo dorido na poltrona surrada, olhos abertos ao infinito, a se perder como quem os fecha às ausências que querem se acercar, ausências desatinadas com os sentimentos que minha alma anestesiada está a preencher, cercada de um lado por lágrimas de sangue, no chão a terra dura para as mãos calejarem, no alto o sol a pino rabiscado por alguns pingos de chuva que refrescam o suor, como as obstinações das meninas, agora mulheres feitas, que trabalham sem parar, e perduram antes de o dia começar até o fim da noite que nunca as veem descansar. Uma missão com os deveres que parece predestinar. Não podem mais ficar, não podem mais ajudar, e quem tomará conta de todas aquelas crianças? Quem nos trará mais bem-aventuranças? Quem herdará a maior parte de suas devoções? E nada do que sobrou de suas desambições? Estes são pedaços da vida. Instantes momentos.

Zamioculcas: Os momentos não têm rosto. Só movimentos. Vejam a Poliça mergulhando os braços no vazio como a remar e a Pocahonta trazendo-os à tona a simular a ondulação das águas.

Beaucarnea: Momentos de entoação de quase plangentes leituras e escritas embalam o tardio despertar de uma verve literária que ainda pode vos seguir pelo pouco de vida que lhes restam. Tirem suas cartas e apostem em tudo que a saudade vos deixa no passado e invoca no presente. Escolham: arriscar e vadiar caindo aos pedaços à beira-mar de verão ou arrumar um emprego como vestidores de defuntos.

Momento



Dieffenbachia: Preciso de você um momento, Um momento de solidariedade, Para recostar-me sob as sombras das árvores que falam, gemem, farfalham e abrigam espíritos benevolentes, Preciso de você um momento, Um momento de amizade, Para soprar mais forte dentro de mim o vento pleno de palavras, visões, avisos, ruídos de forças que vagam, que atraem amigos e afastam os males, Preciso de você um momento, Um momento de fraternidade, Para me ungir com a água que se move, articula, profetiza e santifica, Preciso de você um momento, Um momento de adversidade, Para sentir frio, calor, estar na escuridão, encontrar luz e olhar para o céu todo pai que obra com a mãe terra no milagre da vida, Preciso de você um momento, Um momento de superioridade, Para comungar com o universo, sentir-me parte do todo, sentir-me deus, filho da reverência e da necessidade.

Bachir:Rudbechia,parece que você esbouçou levantar a mão. Quer dizer alguma coisa?

Rudbechia: É sobre mim, mas deixa pra lá, não é nada importante.

Bachir:Rudbechia, aqui tudo é importante. Conte sua história!

SAUDADE

Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. 

MEU PAI, MEU MELHOR AMIGO, MORREU NESTE DIA, 1 DE NOVEMBRO -  ARMANDO NATALI - 1926 - 1997 

Pouco ou muito eu faça, A ressonância de uma cantiga sentida, Embalando seu último olhar, Me segue por toda a vida, De pouca valia, Para quem não tem senão dias e noites, Dias que foram só seus, Vivendo e trabalhando a plena luz, Sendo-me dado somente ver nascendo, O sol claro, Seu amigo de heróis anônimos, Noites que ainda são minhas, Incriminatórias e irrespondíveis, Debruçadas sobre sua lembrança, Tornaram-me a saudade, A única companheira que pude te oferecer, Que punge, Não me consola, Nem me perdoa, Pouco ou muito eu pense, O silêncio das lágrimas derramadas, Pedindo-me para te abraçar, Enlutam seus dias venturosos, De muito valor, Para quem nunca teve senão todas as horas para os outros, Sem ninguém que lhe trouxesse de volta ao lar, Onde seus sorrisos meu tempo não vivido em plenitude obliterou, E sempre ao me deitar, Pergunto-me, Que caminhos terá sua alma percorrido para chegar onde está, Que caminhos há para se chegar ao santuário que só pode ter te acolhido com o mesmo amor que você doou, Sempre de olhos abertos e atentos, Enquanto cerro os meus, Pego no sono e com você tenho meus sonhos, Indagando se estou vivendo nos seus, Se minhas preces ajudam-lhe a esquecer o que não fui para você.