terça-feira, 28 de novembro de 2023

CILENE

Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. 

HOMENAGEM DE AUSTMATHR VIKING DUBLINENSE À REGINA CÉLIA DE SANTIS FELTRAN (1944 - 2023)

Você tem três cidades para visitar, E três anos para se ausentar, Não para folgar por tabernas, Nem para existir por mil anos, Apenas para lembrar uma entre os rios de vidas eternas, E meditar um entre as florestas de arcanos, Você tem um par de sapatos a ser tirado, Um busto reclinado para a frente em sinal de respeito, Um silêncio absoluto a ser observado, Um par de palmas de mãos coladas junto ao peito, Livre eternamente da voz extrema de meus lábios insípidos, Feito desfiladeiro escavado, Que repetia por longos tempos e tamanhos indefinidos, Prolixidades que você ouvia com o coração solícito e em sigilo desassossegado, Leve consigo minha paráfrase de uma estrofe antiga, Minha última apoquentação para quem nunca tive como irmã e amiga,

No céu líquido das noites de verão, Levanto-me tarde na escuridão, Para ser a única estrela, A mais brilhante, Que sua grandeza espelha, Sonhando transformar uma pedra bruta num diamante, Insuspeito da imortalidade de seu Pai, Porém neste inverno diuturno que castiga, Rebaixo-me para você como o malvado cão que sou, O prodígio que todo mal atrai, Trazendo febre e suor para a sofrida humanidade que me adotou,

Você tem mais indignação do que pena, Não sabendo orar, Acendo-lhe um fogo de santelmo para você sentir-se uma helena, Dois pelos irmãos que você pensa que traí, Três pelos pais que você não sabe como perdi, Quatro pelos filhos que você pensa que nunca amei, E um último pela mulher que você não sabe porque deixei, Você tem sido guardiã de humanos e irracionais que engrandeces com aquarelas, E eu um mero protegido sempre vendo-me nas amarelas, Leve para o oriente para onde vais sua vigilância real, E te acompanhará o que é como Deus, Miguel angelical, Jamais irás embora solerte negaceando, Mas pé ante pé de algo maior, E eu seguirei acordando, De pé esquerdo de algo menor, Perdoa minhas zombarias, Perdoa meu desrespeito à sua crença nas três revelações de suas escrituras sagradas, Você é a primeira das três Marias, A primeira das três rainhas magas, Você é antiguerra, A mão do soldado do centro, Onde Deus impera, Onde não adentro.

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

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Texto de autoria de Austmathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98 - Reeditado por Inglesa Luso-Chinesa em 10/12/2022

Estive na casa de minha mãe. Meu pai morreu há mais de 25 anos, mas ele está lá, vivendo normalmente. Estão lá também meus irmãos e minhas cunhadas. Há agitação no ambiente. Parece que estão tentando encontrar uma solução para um problema que aflige meu pai, uma grande perda financeira. Alguém sentencia: Vamos vender a casa do Alceu. Fico assustado, olho para meu pai e ele anui com a cabeça. Ele não sorri, como nunca sorriu nestes mais de  anos, mas sempre manteve o olhar sereno, a voz doce e pausada, mas agora está com cara de poucos amigos, nervoso. Dirijo-me a ele e pergunto: Isto não deveria ser resolvido com a colaboração de toda a família? Ele responde em tom ríspido: Você viu o que você fez com meu dinheiro? Ele nunca falou assim comigo. Solícito e sempre mantendo o respeito, pergunto: Então eu e minha família teremos que viver de aluguel? Ele é curto e grosso: Sim, vai! Vem-me, então, a triste lembrança da velha casa alugada onde morei durante mais de cinco anos. Antiga e mal cuidada, nos fundos, debaixo de outra também judiada, com poucas janelas, sem ventilação, sem brechas para o sol entrar. É triste pensar que terei que voltar para lá. Minha cunhada mais velha, de semblante odioso, faz questão de fundamentar a decisão de meu pai. Ela me leva ao longo corredor que liga a sala à cozinha. Nele há quatro cômodos, dois de cada lado. Num deles há uma espécie de solário, uma pequena área, sem teto e telhado, para deixar o sol iluminar o vitrô do banheiro do lado direito e o da cozinha do lado esquerdo. Ela abre a porta e me mostra uma grande pilha de notificações extrajudiciais, intimações e ações executivas que chegaram para mim. Fico mais assustado ainda. Voltamos para a sala e lá meu pai está ao telefone, já terminando uma conversa. A mesma cunhada completa: Já chegamos a um acordo com o corretor. A comissão é de 11%. Ele estima o valor da casa em 500 mil reais e já tem um cliente. Todos me encaram, dando a entender que devo voltar para casa para mostrá-la ao comprador. Volto rápido e espero na sala. Lá da cozinha minha esposa avisa que ouviu gente chegando. É o Ari, Alceu! Olho através da enorme parede de vidro e vejo dois homens de terno já dentro da área externa, passando por entre a vasta vegetação dos jardins. Um terceiro vem logo atrás, mas não vejo seu rosto. Não conheço estes homens. Um deles deve ser o corretor e o outro o comprador. Não conheço ninguém chamado Ari. Mas como minha esposa sabe o nome dele? Estranho é que eles caminham no mesmo nível da sala. Eu deveria vê-los de cima para baixo porque minha sala do nível superior fica um andar acima da entrada. Estranho também é que minha casa não tem jardins frondosos na frente, e nem mesmo uma enorme parede de vidro. A parede é de concreto e tem, de fato, uma grande porta de vidro que se abre para uma pequena sacada de onde se avista a exuberante mata de árvores altas do outro lado da rua. O que vejo é como se a mata tivesse cruzado a rua, entrado pelo portão e se instalado na forma de um majestoso jardim no espaço entre o portão principal e a cobertura da garagem. Neste momento já não estou mais preocupado com o fato de que minha casa será vendida. Estou em dúvida sobre por onde devo começar a mostrar a casa. Pelo térreo? Pelos fundos? Pelo andar superior? Na medida que os dois homens se aproximam da porta da sala vejo o rosto do terceiro que vinha atrás e me surpreendo com alegria, como a visão do impossível que maravilha um incréu. É o Peru, meu companheiro de ginásio dos anos 60 e que curtia rock comigo. Faz décadas que não o via. Tenho procurado por ele, mas ninguém que eu conheço e que o conheceu sabe de seu paradeiro. Ele entra e me cumprimenta com um sorriso, sem muito entusiasmo. Ele parece ser um dos corretores. Veste terno e gravata. O paletó é azul celeste, mas não extravagante. Com a mão direita ele segura uma pasta de cartolina, um folder, junto ao peito. Ele percorre a sala e se detém diante de um móvel que não tenho. Uma espécie de balcão de madeira envernizada e reluzente bem no meio da sala, no sentido horizontal. Sobre este balcão estão dispostos vários discos, CDs, capas dos antigos discos de vinil, estojos de papelão contendo coletâneas de música. Ele anda ao longo do balcão, com olhos percorrendo a exposição de música, passa por uma coletânea do Cocteau Twins e chamo sua atenção: Esta banda é muito boa, mas ele torce o nariz e prossegue. Para diante de um estojo de discos dos Rollings Stones, sua banda favorita, e exclama: Puxa, você tem esta coleção, e eu esclareço: É uma antologia de singles dos Stones. Tem mais novidades logo adiante. De repente, passa por mim uma mulher caminhando em direção à parede do lado direito da sala. Ela deve ser uma corretora que chegou atrasada. O que a atrai é outro balcão semelhante que nunca tive, próximo à parede, mas sobre este só há livros. Ela toma em suas mãos um livro deslumbrante, que cintila de tão novo. É grosso e deve ter umas mil páginas. Tem mais largura que altura. Sua capa dura plastificada é magnífica. Tem uma chamativa combinação de tons vinho, vermelho e roxo. No centro há a foto de uma mulher estrangeira trajando roupas de meados do século 19. Sua roupa é um pouco excêntrica para a época. Vestido trocado por uma calça comprida e larga, estreitada logo acima do tornozelo, parecendo um gênio de lâmpada. A corretora me pergunta: Esta não é aquela mulher que é médium? Respondo que sim e que o livro é muito bom. Minha consciência pesa por mentir. Não conheço este livro. Mais à frente ela pega outro bem vistoso, bem grosso também, com mais de mil páginas, mas não consigo identificar sua capa. Tenho cerca de dois mil livros em casa, mas não estes que exacerbam meu fascínio por eles, tanto quanto jamais ler um livro e preferir vê-lo ornamentar a estante, como objeto de decoração e veneração. Hoje eles me lembram um livro misterioso com o qual já me deparei duas vezes, em terras exóticas e estrangeiras. Numa delas cruzei uma praça da baixa idade media europeia, com casas de pedra de três andares nos quatro cantos, muita gente alegre e  extrovertida, e muitas cores enfeitando seus ares. Este livro enigmático não deve ter mais que 500 páginas. Sua capa dura é velha, não tem cor definida, nem título. Nas duas ocasiões que o tive nas mãos pude folheá-lo só por uns instantes e vislumbrar umas poucas páginas, tempo suficiente para ler respostas a perguntas que nunca imaginei que pudessem ser feitas. Ele parece ser o livro da vida, o livro do conhecimento absoluto, capaz de responder às nossas mais inquietantes e reiteradas questões: De onde viemos? Quem somos? Para onde vamos? O telefone toca e peço licença à corretora para atende-lo. É minha mãe, desesperada, pedindo-me para que eu venha logo porque meu pai foi levado em estado grave a um hospital. Quando chego à sua casa vejo meu pai caído nos primeiros degraus que levam ao segundo andar, e que não existem porque a casa é térrea. Ouço seu lamento fúnebre, vejo seu desesperado olhar moribundo, antes sereno. Ele está passando mal porque soube que foi internado num hospital. Meu pai está em dois lugares ao mesmo tempo: agonizando em casa e numa UTI. Não posso levar minha mãe ao hospital porque ela precisa ficar em casa cuidando de meu pai. Logo que chego ao hospital sou informado que ele acabou de morrer. Não vejo o dia, nas minhas viagens do tempo, de cruzar, novamente, com aquele enigmático livro da vida para ver se encontro novas teorias, novas formas de medir a constante da estrutura fina do universo. Meu foco não é saber o que muda através do universo, mas o que muda ao longo do tempo. Há mais de 50 anos eu não sabia que esta constante serve para medir a inteligência. Eu não sabia que uma pessoa divertida como o Peru é, hoje, uma felizarda vítima de um certo grau patológico de idiotice e isso põe fim a uma ingênua idolatria da adolescência.  







domingo, 19 de novembro de 2023

INEXORABILIDADE




Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.

Eu já nasci assustado, recapitulando fragmentos de sonhos bizarros, com estigmas congênitos, sem a mínima noção de que um dia iria acabar dando errado. Não pretendia ser o que Deus não queria que eu não fosse, nem atinava para o que o simples fluir da vida escancara. E disse George que ela segue fluindo dentro de mim e sem mim. E disse Lilian que, ao passar por mim, ela fecundou-me com medo. Um elemento que quintessenciou meu espírito inseguro. Eu tenho medo da água agitada do mar, da terra alheia com frutos para roubar, do fogo da vela se apagar e do terror noturno que sufoca o ar. Por que abandonaram-me por um velório à noite e sem nenhuma luz para guiar-me na escuridão habitada por ventos uivantes? Num raro momento em que o temor descuidou-se de mim, eu ceifei a visão que não pertencia-me e carreguei uma culpa que só dissipou-se com outra. Por que no calor de uma festa de carnaval escolheram-me para ser assombrado com uma máscara tão horrenda? O salto que todos nós estamos condenados a dar da luz para o umbral, misteriosamente, levou embora de minhas lembranças uma parte de minha maternidade. Um enigmático portal entre este e o outro mundo levou-a daqui para sempre. Não espanta-me mais aquele prato de comida espatifado contra o chão da cozinha, mas intriga-me, ainda, aquele coelho branco enforcado na maçaneta da porta que frequentou minhas fantasias tantas vezes. Eu corro atrás da vida. Corro para salvar uma vida em minha vida. Mas é ela que leva-me e agarro-me ao primeiro tronco que flutua neste rio que eu sei que vai desembocar no mar. Saio pelos afluentes, dou cabeçadas nas suas margens e volto à correnteza mais forte sempre um pouco mais fraco. Olho-me no espelho e vejo a morte pela primeira vez. Ela é companheira do meu pavor e rouba-me tudo o que Deus desejava que eu fosse. O demônio oferece-me ajuda e os anjos que sempre pressenti observam à distância. Vou morrer sossegado, mergulhado na profusão de meus sonhos preciosos, mas com a marca do arrependimento, com a nítida impressão de que tudo o que fiz de errado não pode mais ser consertado. Pretendo ser tudo aquilo que satanás disse-me não ser proibido, dando mais atenção à imobilidade das trevas. E disse John que minha vida foi tudo aquilo que passou enquanto eu fazia planos para ela. E disse Lilian que, ao passar por ela, deixei de cultivar os campos. Um de Vênus e outro de Marte, sem deixar que florasse o que Deus plantou. Perdi o medo da natureza animada e inerte, dos homens a sete palmos e de dedos engatilhados, de morrer e de matar. Por que confundiram-me com uma convenção do cotidiano à revelia esperando que eu soubesse quais portas abrem-se para o equilíbrio dos normais? Na minha ingênua irresponsabilidade eu desperdicei todas as oportunidades que foram-me oferecidas e sobrecarreguei incautos com uma perda atrás da outra. Por que no embalo de minha ambição ofusquei a visão da simplicidade da vida com tantas máscaras perecíveis? Um tenebroso abismo separa-me das melhores lembranças abandonadas pela minha paternidade. Um inexorável ímpeto prende-me entre dois mundos. Mais vale para mim uma mentira deslavada que sai de minha boca desprevenida, mas não entendo porque esta vontade de viver perigosamente continua perseguindo-me por tanto tempo. A morte corre atrás de mim. Corre para arrebatar a última centelha de vida dentro de mim. É a morte que agora impulsiona-me e sou arrastado a cada lembrança de fracassos que frequentam meu sono nestas águas turbulentas que não sei onde vão dar. Afluem agonias para minha mente onírica, meu ser vígil sufoca-se com as sequelas de seus sofrimentos e sou empurrado cada vez mais para o fundo, cada vez mais distante da superfície. Olho através de meus olhos e vejo minha alma pela primeira vez. Ela ainda caminha ao lado do meu corpo, mas já desarmonizam-se os dois, contrariando os planos divinos. O demônio oferece-me um preço por ambos e os anjos acercam-se para fazerem seus lances.


segunda-feira, 13 de novembro de 2023

SÓCRATES NA TERRA DO BEIJA-FLOR


Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. 


O Brasil masculino estava de ressaca. Eu e uma menor parcela da população feminina também. A seleção brasileira, patrocinada pela marca Topper da São Paulo Alpargatas S/A, acabara de ser deportada da Espanha por Paolo Rossi, Il Bambino d'Oro. Tele Santana, sempre sorridente e solícito, mesmo diante de uma decepção que parecia ser de proporção mundial, circulava pelas dependências do departamento de exportação da empresa, com a aura e a triunfal guirlanda de idealizador do futebol-arte, e autografava todos os pedidos. Em 1982, nenhum brasileiro imaginaria, nem nos mais dantescos pesadelos, que o verdadeiro holocausto de nosso hegemônico esporte bretão viria 32 anos depois, em nossas plenas terras de palmeiras e floresta tropical, onde cantam uirapurus e sabiás. As águias alemãs que aqui gorjeariam, entoariam nossos cantos canarinhos, bem mais melodiosos do que as aves toscanas naquele fatídico dia no Sarriá. Foi a última vez que padeci com nosso esporte mais popular, e, na esteira de minha purgação, pus fim a um sofrimento que encontrou indescritível consolo com a quebra de um jejum de muitos e angustiantes meses de emprego: eu estava de volta ao trabalho, e este seria o meu derradeiro na condição de empregado de carteira assinada. Não me deram muito tempo para me familiarizar com os produtos que eu deveria exportar, o que estava em perfeita contradição com a sucessão de meses que levaram para me contratar, desde o dia que respondi a um anúncio no velho Estadão. Em pouco mais de quatro semanas, fui despachado para nossos vizinhos do norte da America do Sul, da América Central e do Caribe, onde visitei lugares que deram arriscados e deleitosos contornos à minha primeira viagem àquelas bandas: as perigosas Bogotá e Cidade do Panamá, a medonha Zona Livre de Cólon, a sossegada Isla Margarita da Venezuela, a cordial e simpaticíssima Santo Domingo da República Dominicana, as paradisíacas Aruba, Curaçao e Barbados e, finalmente, o interessante e inesquecível Porto de Espanha, capital de Trinidad e Tobago. Este país que tinha, na época, menos de 1 milhão de habitantes, foi uma colônia britânica até 1962, e o inglês crioulo lá falado era e é, até hoje, bastante desafiador, mesmo para um nativo da Inglaterra. O drama pode ser sentido só com este exemplo: crowd (cráud)que significa multidão, soa como crow (crou) corvo. O representante comercial da empresa, um indiano, teve a cortesia de enviar seu motorista particular para me apanhar no aeroporto, e me levar ao luxuoso hotel Hilton, de cinco estrelas, quatro a mais que o meu salário. Ao entrar para fazer o check-in, setor da recepção para registrar-se e receber a chave do quarto, segundo o Sr. Aurélio, deparei-me com um mundaréu de homens falando alto, com a boca e as mãos, como os italianos. Ao aproximar-me, me dei conta que eles algazarravam em português brasileiro! Reconheci alguns rostos e identifiquei-me ao mais próximo, Adilson Monteiro Alves, sociólogo e um dos fundadores da Democracia Corintiana. Ao saber que eu trabalhava para o patrocinador do clube, foi logo me apresentando ao presidente, Waldemar Pires, ao técnico, Mario Travaglini, e convidando-me a juntar-me à comitiva do time e assistir ao amistoso contra a seleção de Trinidad e Tobago no dia seguinte, uma sexta-feira, dia 3 de Setembro de 1982. Meu primeiro encontro com o agente de vendas, completamente esquecido pela Alpargatas, foi decepcionante para ele, porque esperava que eu trouxesse a linha de calçados. Porém, eu era encarregado de vender somente produtos do setor chamado Resto: colchas de chenile e encerados. Nervoso e de nariz empinado, ele designou seu assistente para me acompanhar nas visitas a clientes, e recusou meu convite para assistir ao jogo do Corinthians à noite. Mal sabia ele, e jamais explicaria Deus, que, em pouco tempo, atingiríamos a misteriosa receita de mais de meio milhão de dólares anuais só com as antigas colchas Madrigal, num mercado menor que o bairro de Santo Amaro em São Paulo. Voltei ao hotel antes do pôr do sol. O calor era escaldante, como no verão carioca. Tirei o terno e a gravata, isso mesmo, você entendeu direito, esta indumentária me era imposta pelos meus superiores até nos desertos do Oriente Médio onde estive muitas vezes. De chinelo, camiseta e bermuda, fui para a área de lazer. Lá toda a delegação do Corinthians se concentrava. A maioria dos jogadores se divertia na piscina. Casagrande, com apenas 19 anos, era o brincalhão da turma. Adorava empurrar os companheiros na água. Sócrates não se misturava. Ficava na companhia dos dirigentes e da comissão técnica. Tirei um cigarro do maço de Hollywood e acheguei-me dele, recostado numa espreguiçadeira, segurando um livro, provavelmente de filosofia sobre seu xará. Mal puxei conversa e ele me pediu um cancerígeno. Perguntei:Você voltou a fumar? – para se preparar para a copa do mundo na Espanha, Sócrates absteve-se do tabaco por seis meses. Constatei, então, uma de suas marcas registradas: sua fama de arrogante. E o que você tem a ver com isso? Entornei o caldo de nosso quase monólogo ao pedir a ele para me falar sobre aquela partida contra a Itália. Não quero falar mais sobre isso. Ele me pediu para acender o cigarro e continuou lendo. Mais tarde, naquela noite, eu teria um verdadeiro diálogo com ele, mais amistoso, digamos, mas, para ser sincero mesmo, em circunstância anômala, na qual se inseria mais um de seus logotipos fora da cancha. Chegara a hora de ir para o estádio. Todos foram para seus quartos e desceram de calça e blusão de moletom da Topper. Três micro-ônibus nos aguardavam na saída do hotel. Embarquei num deles. No trajeto até o campo, os jogadores que estavam comigo vociferaram, alucinadamente, contra  todos os transeuntes. Se todos eles fossem submetidos ao exame antidoping, seriam reprovados, e se naqueles tempos já vigorassem as atuais leis disciplinares impostas pelos mafiosos STJD, CONMEBOL, CONCACAF e FIFA, eles pegariam um gancho pesado. Não tive permissão para entrar no vestiário. A preleção do técnico aos jogadores era segredo democrático, mas pude adentrar o gramado com o time formado por Solito, Sócrates, Ataliba, Casagrande, Zenon, Biro Biro, Mauro, Daniel González, Alfinete, Paulinho e Wladimir, uma grande equipe que fez época no futebol. Quando eu me encaminhava para o banco de reservas, um homem, elegantemente vestido, veio ter comigo, falando um bom cockney do East End de Londres. Eu era o único que falava inglês, e fui, imediatamente, confundido com o chefe da delegação. O cavalheiro era o Presidente da Federação de Futebol de Trinidad e Tobago. Suas efusivas saudações e paparicos fizeram me sentir um cartola. Tal qual um político brasileiro em campanha à reeleição, ele me levou  para dar uma volta em torno do campo, construído em 1980, e fez questão de me explicar, em detalhes, outras melhorias que ainda planejava fazer: a ampliação  das arquibancadas, a troca do gramado e a construção de uma pista de atletismo. O Estádio Hasely Crawford era um pouco acanhado. Não me recordo do seu tamanho. Minha memória de 67 anos já não se refresca com tanta facilidade, e já manifesta lampejos de Alzheimer. Acredito que fosse muito parecido com o antigo Parque Antártica do Palmeiras, com capacidade para 27 mil pessoas. O presidente trinitino-tobaguiano massageou meu ego, ainda em busca de autoafirmação, ao me oferecer a tribuna de honra. Encabulada e educadamente recusei, explicando que, por ser o único a falar a língua da terra, precisava estar junto aos ‘meus’ comandados para eventuais traduções, especialmente junto ao trio de arbitragem e nas entrevistas para a imprensa local. Ele entendeu e até se desculpou. Sentei-me no banco ao lado do lateral Zé Maria, às vésperas de pendurar as chuteiras. O jogo foi apenas um treino para o Corinthians, que venceu por 8x2. O  futebol de Trinidad era embrionário, amador, e somente em 2006 conseguiria vaga para participar de sua primeira copa do mundo. Os dois gols do anfitrião foram  facilitados para retribuir a calorosa recepção que os corintianos receberam das autoridades e do público. Ataliba, recém-contratado junto ao Juventus da Rua Javari, foi cumprimentado por todos os jogadores ao fazer seu primeiro gol com o uniforme alvinegro depois de várias atuações sem sucesso. Nada como um saco de pancadas para se reabilitar. Além de dois gols e uma exibição a altura do craque que foi, com assistências inteligentes e liderança intelectual, Sócrates desfilou seu repertório de toques de calcanhar, sua marca registrada no adestramento da bola, uma marca visual da mesma maneira que as bandeirinhas se tornaram sinônimo da pintura de Volpi, como escreveu, inteligentemente, o talentoso Daniel Piza, por ocasião da morte do 'Doutor' em 2011. Havia apenas um repórter de campo brasileiro fazendo a cobertura do evento. Não me lembro se ele era da Gazeta Esportiva, do Diário da Noite ou da Revista Placar. Só sei que, a cada substituição, ele me chamava correndo junto ao mesário, para lhe explicar quem entrou no lugar de quem. Ao final da partida, o presidente da federação trinitina me abordou e me levou de volta ao hotel no seu carro. Sentado no banco de trás estava, nada mais nada menos que Juan Figger, uruguaio que se mudou para São Paulo em 1968, tornou-se rico e célebre por ser um dos maiores empresários de jogadores de futebol e promotores de jogos e torneios amistosos, e, segundo a imprensa, por praticar muitas atividades ilícitas: sonegação fiscal, evasão de divisas, falsificação de passaportes e influência na convocação de jogadores, por ele empresariados, para a seleção brasileira, com objetivo de valorizar o passe dos mesmos. Esse era o trabalho com o qual sonhei tanto: gerenciar esportistas, artistas e músicos. Em 1982, eu e um colega da Alpargatas planejamos um empreendimento que se tonaria uma realidade aqui somente nos anos 90: exportar jogadores brasileiros para a Europa e trazer bandas de rock britânico para apresentações no Brasil. Não executamos o plano, perdemos o momento, e outros ficaram com nossos sonhos. Juan, que organizou dois amistosos para o Corinthians em mares de céu azul caribenho, permaneceu calado o tempo todo. Já o presidente da federação, eufórico, delirava com ideias que ele queria deixar sob minha responsabilidade: um torneio em Trinidad, reunindo Santos, Corinthians, Palmeiras e Flamengo. De volta ao hotel, fui direto para o bar, sem nenhuma mágoa para afogar, simplesmente porque eu teria um fim de semana de folga e só voltaria a trabalhar na segunda-feira. Lá estava Sócrates, saboreando uísques, cervejas e outros baratos etílicos afins. Sentei-me ao seu lado e, desta vez, bebericamos juntos e jogamos muita conversa fora, literalmente, sobre todos os possíveis assuntos descartáveis, menos futebol. Sócrates estava, ainda, no primeiro de dez assaltos às malvadas, mas eu já estava meio grogue, tentando manter o equilíbrio, prestes a jogar a toalha. Os adversários do Corinthians tinham enorme dificuldade para acompanhar o Sócrates dentro das quatro linhas, mas era quase impossível acompanhá-lo na arte de ingerir as águas que os passarinhos não bebem. Fui salvo pelo gongo: foi anunciado o jantar que o hotel, ou a Federação Trinitina, ou não sei quem, ofereceu à delegação corintiana. Voltei ao meu apartamento, desabei na cama de sapato e tudo, e o quarto parecia enfeitiçado, girando como um carrossel. Contei poucos cavalinhos para ferrar no sono. Depois de um tempo imponderável, o telefone tocou. Passava da meia-noite. Quem era o filho da mãe que me ligou em plena madrugada de sábado, perguntaria o pai do bem sucedido corretor da bolsa de valores no filme O Lobo De Wall Street. Era tudo demais tudo de menos que outro representante comercial, outro indiano, da cidade de San Fernando. Nas poucas semanas que tive para me preparar para aquela longa viagem, ao triar as rumas de telexes sem respostas,  encontrei dois agentes interessados nos produtos da Alpargatas. Acabei ficando com o esnobe do Port Of Spain, mas, por precaução, avisei o sanfernandino que eu estaria em seu país. Mas por que ele me procurou a esta hora? O inoportuno soube, pela televisão, que o médico Sócrates estava em Trinidad, e queria conhecê-lo Rodopiando pelos corredores, consegui chegar ao bar. E lá estava Sócrates novamente, jantado, e agora acompanhado de vários camaradas. Tive que tomar algumas doses de uísque com o pródigo de Gandhi, que era médico também, e não veio falar sobre negócios. Apresentei-o ao Sócrates, larguei os dois no balcão do bar conversando, não sei em qual língua, provavelmente em libras. Trotando em zigue-zague, rumei em direção aos elevadores. Ao passar pelo saguão, fui interpelado pelo Daniel González, caindo pelas tabelas, tentando dar uma entrevista a um canal de TV local. A jovem e bonita jornalista pediu-me para ajudar na tradução. Cada pergunta dela era respondida com impropérios aqui intraduzíveis, como, por exemplo, este belo eufemismo: quero levá-la para meu quarto para fazer amor. Sempre polido, eu dizia à moça que o Daniel e todos os corintianos estavam adorando o país. Mais jogadores, completamente embriagados, juntaram-se àquela baixaria, que eu trasladava para uma solicitude. Para me desvencilhar deles, tive que enganá-los com uma falsa e súbita indisposição estomacal, embora meu vômito implorasse para abrir a porta. Escorando-me pelas paredes, consegui chegar ao meu apartamento. Com as mãos trêmulas, coloquei o aviso de não perturbe na maçaneta do lado de fora da porta, tirei o telefone do gancho, e desmaiei na cama. Meu inconsciente cancelou todos os sonhos programados para aquela noite. Acordei depois das 15 horas, com uma retumbante dor de cabeça e, rebuscando chavões, na consciência. Lentamente, comecei a recobrar os sentidos e a rememorar o que se passara nas últimas 24 horas. Lembrei-me que, enquanto estava sóbrio, Sócrates me disse que eles teriam que levantar às 6 da manhã no Sábado para pegar um voo para Curaçao, onde jogariam um amistoso  contra a seleção local no Domingo. Seleção de Curaçao? Impossível! O escrete desta ilha de encantos mil devia ser igual ao Íbis de Pernambuco, o pior time do mundo, que entrou para o Livro Guinness dos Recordes por ter conquistado a  façanha de três anos e onze meses sem comemorar uma única vitória. Mas, contra um time encharcado de engasga-gato, talvez os curaçaoanos conseguissem uma vitória. Quase! O jogo foi 0x0, e o Corinthians deve ter se arrastado numa lombeira tão confusa como o papiamento, língua oficial das antigas Antilhas Holandesas, mistura de holandês, alemão, inglês, espanhol e português. Se os corintianos não se refizeram da bebedeira com um trago de bebida que cura, significado da palavra Curaçao, então eles provaram da típica bebida Curaçau (com U mesmo), feita com cascas de laranjas da ilha e cachaça de cana de açúcar da melhor qualidade da região. Lembrei-me, também, de ter explicado ao Sócrates que Cristovão Colombo batizou o país de La Isla de La Trinidad, uma óbvia referência à Santíssima Trindade Cristã. Mas os ameríndios locais chamavam a ilha de Terra do  Beija Flor. Faz todo sentido. Afinal, dois humming birds adornam o brasão de armas de Trinidad. E Tobago, o que significa? Há tantas controvérsias sobre sua etimologia que prefiro não arriscar uma explicação. Melhor lembrar-me daqueles dias ouvindo a Enya cantar Caribbean Blue (Azul Caribenho): So the world goes round and round..., E o mundo gira e gira..., e eu completo: and so does my head, e assim também gira minha cabeça, while little colorful birds still hum in my mindenquanto passarinhos coloridos ainda zumbem em minha mente, saudosa do grande Sócrates brasileiro, que partiu cedo demais.





domingo, 12 de novembro de 2023

MÚSICA SELECIONADA POR INGLESA LUSO CHINESA - CAPERCAILLIE: SEICE RUAIRIDTH (RODDY'S DRUM) AUDIOSHIELD ELITE 10.00+10.00 - COM LETRA

 

Seice Ruairidh bheir i fuaim
Seice Ruairidh bheir i srann
Seice Ruairidh bheir i fuaim
Nuair a bhailear i gu teann
Seice Ruairidh bheir i fuaim
Seice Ruairidh bheir i srann
Seice Ruairidh bheir i fuaim
Nuair a bhailear i gu teann

Nuair bhailear i bheir i fuaim aisd'
'S gluaisidh gach duine bhios ann
An fhuaim a bheir seice Ruairidh
Bheir i nuas an taigh mun ceann
Nuair bhailear i bheir i fuaim aisd'
'S gluaisidh gach duine bhios ann
An fhuaim a bheir seice Ruairidh
Bheir i nuas an taigh mun ceann

Seice Ruairidh bheir i fuaim
Seice Ruairidh bheir i srann
Seice Ruairidh bheir i fuaim
Nuair a bhailear i gu teann
Seice Ruairidh bheir i fuaim
Seice Ruairidh bheir i srann
Seice Ruairidh bheir i fuaim
Nuair a bhailear i gu teann

Nuair bhailear i bheir i fuaim aisd'
'S gluaisidh gach duine bhios ann
An fhuaim a bheir seice Ruairidh
Bheir i nuas an taigh mun ceann
Nuair bhailear i bheir i fuaim aisd'
'S gluaisidh gach duine bhios ann
An fhuaim a bheir seice Ruairidh
Bheir i nuas an taigh mun ceann

Seice Ruairidh bheir i fuaim
Seice Ruairidh bheir i srann
Seice Ruairidh bheir i fuaim
Nuair a bhailear i gu teann
Seice Ruairidh bheir i fuaim
Seice Ruairidh bheir i srann
Seice Ruairidh bheir i fuaim
Nuair a bhailear i gu teann

Nuair bhailear i bheir i fuaim aisd'
'S gluaisidh gach duine bhios ann
An fhuaim a bheir seice Ruairidh
Bheir i nuas an taigh mun ceann
Nuair bhailear i bheir i fuaim aisd'
'S gluaisidh gach duine bhios ann
An fhuaim a bheir seice Ruairidh
Bheir i nuas an taigh mun ceann

M'eudail air do shùilean donna
Air do shùilean 's air do bhodhaig
M'eudail air do shùilean donna
'S air do bhodhaig bhòidhich
M'eudail air do shùilean donna
Air do shùilean 's air do bhodhaig
M'eudail air do shùilean donna
'S air do bhodhaig bhòidhich

Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi an gille donn
Ma tha e 'g ràdh an fhìrinn
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi an gille donn
Ma tha e 'g ràdh an fhìrinn

M'eudail air do shùilean donna
Air do shùilean 's air do bhodhaig
M'eudail air do shùilean donna
'S air do bhodhaig bhòidhich
M'eudail air do shùilean donna
Air do shùilean 's air do bhodhaig
M'eudail air do shùilean donna
'S air do bhodhaig bhòidhich

Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi an gille donn
Ma tha e 'g ràdh an fhìrinn
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi an gille donn
Ma tha e 'g ràdh an fhìrinn

M'eudail air do shùilean donna
Air do shùilean 's air do bhodhaig
M'eudail air do shùilean donna
'S air do bhodhaig bhòidhich
M'eudail air do shùilean donna
Air do shùilean 's air do bhodhaig
M'eudail air do shùilean donna
'S air do bhodhaig bhòidhich

Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi an gille donn
Ma tha e 'g ràdh an fhìrinn
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi an gille donn
Ma tha e 'g ràdh an fhìrinn

M'eudail air do shùilean donna
Air do shùilean 's air do bhodhaig
M'eudail air do shùilean donna
'S air do bhodhaig bhòidhich
M'eudail air do shùilean donna
Air do shùilean 's air do bhodhaig
M'eudail air do shùilean donna
'S air do bhodhaig bhòidhich

Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi an gille donn
Ma tha e 'g ràdh an fhìrinn
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi dha-rìreadh
Pòsaidh mi an gille donn
Ma tha e 'g ràdh an fhìrinn

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

TUDO O QUE VOCÊ QUISER








Texto de autoria de Austmathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.  


Toda uma vida vivida, Todo um trabalho de Sísifo redobrado, A pleno fulgor, Todos os amigos de semideuses, Todos os sois translúcidos e unidos, Ainda me dado a ver, Renascendo, São seus, Todas aquelas colossais águas, Descendo, Por sendas destorcidas, Do alto de cachoeiras para o infinito, Entre sortilégios tão indecifráveis, Quão eterno instante de ventura, Adorado seja, Devolvo ao seu olhar, Todos os luares correndo as horas sobre suspiros, Doces como prelúdios de harpa, Sobre a singeleza de seu corpo, Mais leve que uma folha de magnólia, Caído do céu na noite desfeita em estrelas, Lua de junho argêntea nos campos, Brancura de luz das manhãs silenciosas, Devolvo à sua lembrança, Todo frio susto que corre pelas minhas veias, Todo meu fogo que arde em febre sem se ver, Tudo que me acalma e me endoidece, Que me eleva e me abate, Te dou, Com o coração na mão.

AUSTMATHR GOES FUNNY

 





Meu amigo AustMathr voltou na sexta-feira, do Instituto do Câncer, onde esteve internado desde domingo passado para se submeter a procedimentos bem desagradáveis. Ele esteve sozinho o tempo todo. Sua mulher não pôde lhe fazer companhia porque ela está cuidando da filha que está muito doente em casa. Eu também não pude porque justamente nesta semana estive fora participando de um projeto cultural inadiável. Mas AustMathr encarou tudo com um bom senso de humor, aliás bom demais para minha surpresa. Ontem, ele me enviou uma mensagem, dizendo que rompeu a monotonia de 5 dias e 5 noites no nosocômio, pedindo emprestado um celular com internet de seu companheiro de quarto, na maior cara-de-pau, e com ele ficou lendo e comentando algumas notícias publicadas nas mídias digitais. Pedi a ele autorização para postar seus comentários no blog. Ele concordou, mas me pediu para postar somente neste domingo de páscoa. Sugeri a ele, como ilustração, uma caricatura do Mr. Bean, e ele concordou. E a música, perguntei, qual eu ponho? Fiquei arrepiada quando ele respondeu: 'somos gente feliz, então poste aquele vídeo do R.E.M. com a música Shiny Happy People, uma linda homenagem aos gloriosos anos 60 no modo de cantar e dançar'. Num de seus comentários ele faz referência a mim e brinca dizendo que eu espero ele voltar à vida e manda eu esperar sentada num cemitério. Mas o fato é que ele voltou a escrever alguma coisa, depois de muito tempo, mesmo que não seja nada sério, só para se divertir, para lutar contra sua solidão e sofrimento num hospital, e isso demonstra que ele está voltando à vida. Estou feliz por ele. Meu presente de aniversário para ele tardou, mas não falhará. 
Gwendolyn Marie-Baxtor (vulga inglesa luso chinesa)
9 de Abril de 2023
P.S. Oxman e AustMathr é quase a mesma coisa

Texto de autoria de Austmathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. 

UOL: Já viu filme do urso que ingeriu cocaína? Confira outros cinco filmes de animais descontrolados.

OXMAN: Filme eu não vi, mas sei de um animal descontrolado que recomenda o consumo de cloroquina para curar Covid19.

UOL: Saiba como perder peso e não voltar a engordar.

OXMAN: É simples, basta parar de comer até emagrecer, e nunca mais comer para não engordar.

UOL: Peixe nada em cozinha alagada por enchente em Mato Grosso.

OXMAN: Isso me lembra de uma de minhas inúmeras viagens à China nos anos 90. Numa delas, eu estava com empresários chineses na região central do país. Trabalhamos de manhã e paramos para almoçar num restaurante de frutos do mar. Na entrada, do lado esquerdo, havia uma enorme piscina com diversas espécies de peixes. O piso estava encharcado e escorregadio. O cliente escolhia o peixe preferido e o funcionário o retirava. Lá se comia peixes de boa qualidade. Antes de escolher o meu, fui ao banheiro e o encontrei alagado, além de um peixe se debatendo para voltar à piscina. Quando sentei-me à mesa, o garçom me perguntou se eu já tinha escolhido meu peixe. Eu respondi que preferia camarão e perguntei se o mesmo vinha da piscina. O garçom respondeu que o camarão era mantido num freezer e garantiu que era fresquinho, pescado no mesmo dia. Então, eu disse manda ver um prato de camarões, mas não me traga nada da piscina.

UOL: TSE encerra instrução, e Bolsonaro pode ficar inelegível após feriado da Semana Santa.

OXMAN: Após a Semana Santa, chegam as Festas Juninas, com muitos fogos que, às vezes, dão chabu, quermesses (que não são mais feiras só de igreja), quentão (não confundir com imbrochável), quadrilhas (não confundir com milícias), drones que substituem os balões incendiários que estão proibidos, mas vão continuar soltos, simpatias (damarianas e michellianas), sortes (de se tornar apenas inelegível) e adivinhas para o venerável casamenteiro, como, por exemplo: 'Confessei-me a Santo Antônio que estava prevaricando, Ele deu-me por penitência, que fosse continuando'. 

UOL: STF derruba por unanimidade prisão especial para quem tem ensino superior

OXMAN: Há muitos anos, criminosos de alta periculosidade, sem curso superior, mantidos em prisões de segurança máxima, são trancafiados em celas com TV a cabo, espaçosas para receber várias visitas, inclusive íntimas, com direito ao uso de celular, e, ao invés de comerem no refeitório, podem pedir o que querem através do serviço de entrega do iFood, sem ter que pagar. Alguém aí sabe quem paga?

UOL: Dua Lipa de biquíni mínimo e Mariana Ruy Barbosa transparente: o que está na moda?

OXMAN: Se um dia eu puder voltar a sair de casa e ir à praia, vou aderir a estas duas modas: calção de banho mínimo e transparente.

GLOBO: Síndrome do orgasmo do pé: a ligação do membro com o cérebro na hora do prazer.

OXMAN: Quando eu tinha 40 anos achei que eu podia fazer uma quarta faculdade, a de psicologia, mas só cursei um ano porque eu perdia muitas aulas, provas e trabalhos em grupo devido às minhas constantes viagens pelo Brasil e ao exterior a trabalho. O professor de genética humana nos ensinou que síndrome é o nome que se dá a uma doença que afeta mais de um órgão ou sistema (cardíaco, respiratório, gastrointestinal, etc.). Isso ocorre em quem nasceu, por exemplo, com síndrome de down. Bem, esta síndrome do orgasmo do pé requer duas análises distintas: 1) a pessoa tem os pés afetados por diversas doenças: chulé congênito que não tem cura, nem com creolina, frieiras entre os 5 dedos dos pés que resistem a todos os tipos de pomadas, talcos e soluções caseiras (alecrim, capim-limão, melaleuca, tomilho, hortelã-pimenta, etc), unhas encravadas com micose e fungos incuráveis, calos em todos os dedos, do tipo 'teimosinho', que são arrancados num dia e reaparecem no outro, olho de peixe na planta dos pés, o Tunga Penetrans, popularmente conhecido como bicho do pé, joanetes, fascites, rachaduras e outros. 2) Já o orgasmo só pode ser feminino, uma vez que o pé não ejacula, mas pode fazer penetração vaginal e massagear o clitóris. Finalmente, há que se considerar também a Larva Migrans Cutânea, mais conhecida como bicho geográfico que entra pelo pé, percorre o corpo e pode se alojar na vagina, estimulando, assim, o orgasmo. Só não sei onde o cérebro entra nisso.  

UOL: Após denúncias do UOL, universidade do RJ diz não saber se pagou bolsistas fantasmas.

OXMAN: Isto faz sentido. Além de serem invisíveis, os fantasmas têm contas fantasmas que não podem ser rastreadas, a não ser por outros fantasmas. Se alguém envia dinheiro para a conta deles por engano, a grana evapora. O único jeito é contratar um fantasma que em vida foi um funcionário público fantasma. Mesmo assim, é muito difícil recuperar o dinheiro. Fantasmas nunca se entregam because they always keep the upper hand. 

UOL: Carrões da casa abandonada: coleção milionária é achada na Guarapiranga, em SP.

OXMAN: Já dizia Shakespeare em Hamlet: Há mais coisas por baixo do pano do que nossa vã democracia tem vontade de revelar.

UOL: Passarinho azul: logo do Twitter volta após Elon Musk trocar por cachorro.

OXMAN: Twitter em inglês significa Piador, do verbo piar. Se o cara troca o passarinho por um cachorro, deveria substituir Twitter por Barker que significa Latidor, do verbo latir. Incongruência corrigida a tempo. Ele é bilardário, mas gafioso também. Se um dia eu me tornar podre de rico como o Musk, e isto pode levar até umas 100 encarnações, eu vou comprar várias empresas famosas: A Lacoste passa a ser chamada L'homme Boeuf e o jacaré da logomarca é substituído por um homem com cabeça de boi; a Caterpillar, que significa lagarta, desabrocha numa Butterfly, que significa borboleta, e a logomarca CAT, que significa gato, é substituída por DOG, meu animal de estimação favorito; A Quaker que significa tremedores passa a se chamar Hotsy-Totsy, meu inglês para gostosas praticantes, e a logomarca com o rosto do velho e antigão George Fox, que foi importante na fundação da empresa, é substituído pela foto da jogadora de futebol feminino Alisha Lehmann, de costas, vestindo um shorts curto e apertado, porque ela é um importante colírio para os olhos. Tudo isso não faz sentido nenhum se estas empresas deixarem de existir daqui a 100 gerações, portanto todas essas conjecturas são inúteis.  

UOL: Apreensão liga empresa de NY a contrabando de ouro amazônico; perícia aponta origem ilegal.

OXMAN: Afinal, existe alguma coisa legal na Amazônia?

ESTADÃO: Hipermercados reagem, depois de terem sido ‘atropelados’ pelos atacarejos.

OXMAN: Gostei dessa contração de atacado com varejo. Conheço outras semelhantes como caranguejo = carango (carro) + transliteração da palavra queijo = carro que transporta queijo; percevejo = contração redundante da conjugação dos verbos perceber e ver; gargarejo = contração irregular da expressão arejar a garganta que deveria ser o contrário, arejanta;  traquejo = peido com cheiro de queijo (traque + outra transliteração da palavra queijo); há muito tempo, um jogador do Internacional de Porto Alegre,  time de camisa vermelha, sendo entrevistado, falava de sua nova casa em construção quase pronta. O repórter perguntou se o que faltava no acabamento era o azulejo. Para evitar qualquer associação com seu rival, o Grêmio de camisa azul, ele respondeu: azulejo não, vermelhejo!  

UOL: Drake mentiu sobre cancelamento de show no Lolla; parte da equipe estava no Brasil.

OXMAN: Liguei para minha filha e perguntei a ela quem é este tal de Drake. Ela me disse que é um rapper canadense, um dos artistas mais ouvidos no planeta. Acho que o Drake deveria reconsiderar sua decisão. Eu prefiro rappers assassinando os ouvidos dos amantes da música a matar gente nas ruas.

GLOBO: Iggy Azalea desabafa por não fazer sexo há seis meses e se gaba de ter 'seios perfeitos'

OXMAN: Eu não tenho o hábito de ler matérias, mas somente as manchetes, porque não tenho tempo para isso, or should I say, tenho sim, porque passo a maior parte de meu tempo deitado numa cama. A rapper americana realmente tem belos seios, com ajuda de cirurgias plásticas, é claro, mas não pode desprezar seu corpo que é escultural, um desperdício de meio ano. Eu até posso dar uma ajudazinha para essa pobre garota, se ela se despuser a vir para São Paulo e compartilhar a minha cama, mas preciso da permissão de minha esposa e, mesmo que ela aprove, não tenho dúvidas que ela exigiria um ménage à trois. Ela nunca fez isso (até onde sei), e eu também não (até onde ela não sabe). Iggy diz que nunca fez sexo a três, mas não custa tentar. Jovens que possam estar me lendo precisam entender que quando a gente chega à terceira e última idade, e ainda com câncer, não tem mais nada a perder, nem mesmo a dignidade. Afinal, os sete palmos me aguardam impacientemente, então por que não soltar o frango tarado no crepúsculo da vida?  

UOL: Foguete chinês explode, pega fogo e é confundido com meteoro; veja o vídeo.

OXMAN: Aqui no meu bairro um meteoro explodiu, pegou fogo e foi confundido com um potente rojão que os traficantes de uma favela próxima soltam para anunciar que a polícia está subindo o morro, ou para avisar que o carregamento de bagulho e armas chegou. Veja o corre-corre.

UOL: Ex-amante de John Lennon diz que Yoko incentivou relação.

OXMAN: É disso que eu mais preciso:  conselho de mulher sábia.

UOL: Michelle Bolsonaro derrapa ao elogiar Pernambuco: 'Amo essa cidade'.

OXMAN: Durante quase duas décadas do século passado, prestei consultoria a uma empresa chamada Jolitex, de família judia. Tibério, o filho mais velho, recebeu a nova compradora das Casas Pernambucanas, melhor cliente da empresa. A jovem mulher queria mostrar serviço e convencer seu chefe que tinha grande capacidade de negociação, e pechinchou o tempo todo, alegando ser um antigo cliente que comprava grandes quantidades todos os meses, e pedia um desconto no preço. Tibério, resignado e comovido, dizia que por se tratar de um cliente tão especial ele já dera às Casas Pernambucanas um preço bem diferenciado. A compradora retrucava alegando que o preço dos últimos anos foi sempre o mesmo e que estava na hora da Jolitex tratar melhor um cliente assíduo de tantos anos. E Tibério lamentava dizendo que o preço que ele estava oferecendo era o mais baixo que a empresa concedia por mera reciprocidade e gratidão, mesmo com prejuízo. A mulher perdeu a paciência e deu uma derrapada, meu Deus, é inacreditável você dizer que nos vende com prejuízo, até parece que você é judeu. Tibério respondeu serenamente: eu sou judeu. A compradora ainda esbravejou: fala sério! Eu estava ao lado ouvindo a conversa, chamei a atenção dela e lhe disse: acredite, ele é judeu e dos bons!  

UOL: Dania Mendez é eliminada de Big Brother mexicano, e brasileiros reclamam na internet.

OXMAN: Mais de 58 milhões de ignorantes votaram no Bozo na última eleição. Por isso, não me surpreendo com os ignorantes que assistem ao Big Bosta Brasil se preocuparem com o Big Bosta México.

UOL:  Atriz de Todas as Flores revela beijo de língua em cena: "É de verdade", diz ela.

OXMAN: Beijo de língua dá sapinho, diziam-me quando eu era criança, um fungo chamado Cândida Albicans, nome bonito, mas me parece um pouco redundante porque Cândida significa branca, do latim candidus, e albicans também, do latim albus. Fiquei pensando que tipo de sapo aparece quando a gente faz sexo oral na mulher. Alguém aí sabe? Diziam-me também que pisar em urina de cavalo dava um tal de Mijacão que, segundo a medicina atual, é um tipo de tumor que nasce na planta dos pés quando a gente anda sobre mijo equino. E eu sempre achei que isso era grupo (papo furado/mentira na gíria paulistana de meu tempo). Eu pensava que perigoso mesmo era levar uma cagada de pombo na cabeça. Diziam-me também sobre uma abelha negra, meio redonda e gordinha, de 4 a 5 vezes maior que o zangão, e era chamada de 24 horas, porque a ferroada dela doía todo este tempo. Eu fiz um teste com ela e me ferrei. Isso me faz lembrar de uma história que meu falecido pai me contou. Disse-me que seu irmão mais velho estava com um reumatismo bravo. Minha avó italiana contou a uma vizinha que lhe deu uma receita para cura imediata. A pedido dela, meu pai encontrou e trouxe um vespeiro inteiro. Minha avó enfiou o vespeiro num longo saco de batata e com ele cobriu meu tio da cabeça até a cintura. Ele levou mais de mil picadas e foi parar num hospital. Curou-se do reumatismo, mas voltou para casa todo deformado e irreconhecível. Então, minha avó procurou a mesma vizinha para saber se ela tinha alguma receita para inchaço. Percebo, agora, que mudei o assunto aqui de pato para ganso, ou melhor, de gata angorá para ornitorrinco. Por falar neste bicho, não se esqueçam do senso de humor de deus ao criar este mamífero.

GLOBO:   Personal de Griphao planeja 'puxão de orelha' para volta de 'tanquinho'

OXMAN: Aqui em casa o tanquinho voltou há mais de 5 anos quando nossa máquina de lavar roupas de 15 anos pifou de vez e até hoje não conseguimos grana nem para comprar um tanquinho semiautomático de 300 paus. Minha mulher voltou a se debruçar para esfregar roupas no escorregador ondulado de cimento e já se tornou uma expert. Quem precisar de uma personal trainer de roupa bem lavada com as mãos, é só avisar. Por um preço bem baratinho ela ainda ensina como evitar calos nas mãos, câimbra nos braços e  barriga ralada de tanto esfregar ao ponto de parecer um tanquinho. 

FOLHA: Com preço do bacalhau alto, há opções de cortes e outros peixes.

OXMAN: Com a escassez de alimentos em minha casa, bacalhau é um luxo de dar nojo, é a Ferrari dos frutos do mar. A  melhor alternativa foi recorrer ao nosso amigo Chico que costuma pescar no rio Tietê à noite. Ele nos trouxe tilápia, carpa, bagre e traíra, alguns até bem grandinhos. Primeiro, minha mulher fez uma assepsia nos escamosos com creolina, bicarbonato de sódio, e alguns detergentes que ela usa para limpar banheiro. Depois ela deu marteladas em todos eles até ficarem achatados para parecerem bacalhau. Finalmente, ela os salgou, deixou eles torrando no sol por dois dias e depois eles foram para o forno. Ficou bom. Com gosto típico do rio onde eles foram pescados. Comemos o nosso  Gadus Morhua à la Tietê (como os franceses gostam de dizer), regado com o famoso vinho tinto Ox Blood, envelhecido de um dia para o outro, que minha mulher comprou no mercadinho em 10 parcelas de um real e dez centavos cada no cartão fio de bigode. 

TERRA: Cacau Show atrasa entregas de ovos de Páscoa e revolta clientes,

OXMAN: Isso me lembrou de uma velha piada sem graça mais manjada do que teto de barbearia: Festa no céu, animada por uma orquestra só de bichos, sob a batuta de São Francisco. No ensaio final, Chico pergunta: Cadê o bicho preguiça? Respondem: ele esqueceu o trombone em casa e faz duas horas que ele foi buscá-lo e ainda não voltou. O santo, amante dos animais, enfurecido, esbravejou: putaquepariu, mande alguém urgentemente à casa deste filho da puta e traga-o aqui imediatamente. Então, eis que o zé preguiça surge por detrás de uma pilastra e diz: olha só,  pessoal, se começarem a falar mal de mim não vou mais.

GLOBO: Arão defende Jesus na Seleção, é vaiado no Fenerbahçe e se retrata.

OXMAN: Será que o jornalista não se enganou e quis dizer Abraão recomenda Jesus? De qualquer forma, acredito que o Messias iria preferir uma nova crucificação a pegar este rojão. Por falar no Mestre, neste dia consagrado a ele, lembrei-me da Dra. Sigasmunda Peud, mundialmente reconhecida como a maior especialista em flatulência na história. Certa vez, ela recebeu a seguinte pergunta de um brasileiro: 'Prezada Dra. Peud, gostaria de saber qual é cor do pum. Consultei vários livros, mas não encontrei resposta. Um abraço. Bufaldo Roncado, de Jati Jijoca de Jericoacoara, Ceará'. E a doutora deu esta maravilhosa resposta: 'Caro Sr. Bufaldo, Sua pergunta é muito pertinente visto que, não só a cor, mas também a constituição do flato em si desperta interesse mundial e atinge dimensões incalculáveis, com as mais variadas implicações científicas, sociais e até mesmo religiosas. O assunto tem sido motivo de muitos simpósios internacionais no meio acadêmico. Eu entendo sua dificuldade em encontrar uma resposta para sua pergunta em compêndios ortodoxos, visto que o estudo da bufa é uma especialidade de acesso restrito ao leigo, dai minha ideia de lançar um livro que pudesse ser compreendido pelo público em geral e não somente pelos catedráticos. Vamos lá, então, à sua pergunta. O flato não tem cor. Todos os gases que compõem o pum não têm uma cor inerente. Os românticos veem nisso uma grande vantagem. Dizem eles que se o traque fosse, por exemplo, laranja fosforescente, acabaria a graça e o mistério sobre quem soltou um peditum enrustido. De qualquer maneira, um gás de alto gabarito como é o gás do peido, sempre sugere a ideia de cor nas pessoas. O assunto é polêmico e motivo de várias controvérsias e até mesmo dissensões nas comunidades científicas. Existem as mais variadas e divergentes opiniões. Há pessoas que acham que o  borra-cuecas/calcinhas é amarelo, outras acham que é verde. Há, no entanto, um consenso entre os pesquisadores de que o estoura-tripas deve ser marrom. Logicamente, esta opinião está, diretamente, associada às fezes que, às vezes, sai junto com o espirro do descuidado. Apesar da confirmação científica de que o gás não tem cor, ainda há muitas especulações sobre o assunto. Um cientista americano sugeriu que se o fart, em inglês, fosse visível ele seria parecido com um torresmo. Há um caso curioso de uma criança na Suécia que eu pesquisei e que costumava desenhar fis, nome sueco, na forma de um triângulo amarelo cheio de buracos, como um queijo Suíço. Há também um médium Kardecista na França com quem conversei e que afirma que o péter, em francês, se parece com nódulos de carvão, de cor preta e de forma esférica, mas irregular. As diferentes teses sobre a cor do pierdnięcie, em polonês, têm gerado muitas polêmicas. Na tradição cristã, há fatos, não comprovados por evidências concretas, de que Jesus costumava soltar gases com efeitos especiais. Visionários e gnósticos em geral dizem que seus traques descreviam verdadeiras parábolas no ar e deixavam um lindo rastro de cores como o arco-íris e a aurora boreal, mas, evidentemente, estas elucubrações aparecem somente no contexto da tradição oral, não havendo provas científicas para corroborá-las'. Muito bem, hoje é Sexta-Feira e no Domingo o Cristo está de volta e aproveito para fazer um apelo a ele: Divino, por favor, assuma o comando do nosso escrete nacional e mude a cor da camisa porque, ultimamente, nossos jogadores sempre amarelam na Copa do Mundo.

UOL: Teste da fita crepe: Liga da Beleza prova se gloss labial incha lábio.

OXMAN: Até onde sei, o que incha os lábios das mulheres é beijo do tipo bomba para encher pneu de bicicleta. 

UOL: Muito além das lambidas: 10 outros jeitos de explorar os mamilos no sexo.

OXMAN: O Drácula tinha preferência por pescoços das mulheres, mas, de vez em quando, ele variava: dava um forte mordida nos mamilos de jorrar sangue. O orgasmo feminino era instantâneo. 

TERRA: Quanto ganha um microinfluenciador? Veja exemplos e dicas.

OXMAN: Desempregado há mais de 4 anos e sem poder sair de casa por causa de um câncer, tentei dar uma de influencer na internet, mas me dei mal. Atraí dezenas de credores. Meu (per)seguidor mais assíduo é o Serasa, todos os dias me oferecendo descontos mirabolantes para pagar dívidas impagáveis. 

UOL: Como sapos e rãs eram usados para detectar se mulheres estavam grávidas.

OXMAN: Pois é, entre 1930 e 1960, mulheres nos EUA e Europa usavam suas urinas com sapos e rãs para saber se estavam grávidas. E qual era o índice de acerto? Eu não sei. O que eu sei é que os egípcios de mais de 3 mil atrás não só tinham certeza quando a mulher estava grávida, misturando sua urina com molho de trigo, mas sabiam também, com 100% de acerto, se o bebê era menino ou menina. Como? As mulheres grávidas urinavam sobre dois sacos de areia com sementes de trigo e outro de areia com sementes de cevada. Se o trigo germinasse, era menina, e se a cevada germinasse era menino. Isso demonstra como éramos atrasados em pleno século 20. A humanidade sempre foi inteligente, desde mais de 7 mil anos atrás, começando com os sumérios e passando pelos egípcios, assírios, babilônios, persas, gregos, macedônios e romanos. Nossa inteligência foi tolhida com o advento do cristianismo no século 5 da era comum, nos causando mais de mil anos de atraso intelectual. Voltamos a por nossa inteligência em prática gradativamente, com advento do renascimento na Itália no século 14 da era comum e do iluminismo na França no século 18 da era comum. Avançamos lentamente contra a oposição do dogmatismo retrógado e autoritário da religião cristã, até que, começamos a romper, com dificuldade, as amarras do cristianismo e inventamos a eletricidade, o avião, a fusão nuclear, a conquista da lua, o envio de sondas que exploraram todo sistema solar, fora os super telescópios Hubble e James Webb que, ao contrário da afirmação da igreja de que a terra era o centro de tudo, mostraram que o tamanho do universo é incalculável, com trilhões de galáxias e decilhões  de planetas, e  no meio disso tudo, nós, terráqueos, não somos nada. Somos tão insignificantes como um dos milhares de planetas que cabem num grão de areia. Em verdade, há mais estrelas no universo do que todos os grãos de areia encontrados nas praias, nos desertos e no fundo dos mares de nosso planeta. Uma colega virtual me bloqueou no facebook talvez porque eu lhe disse que se ela tivesse a mínima ideia de quão grande o universo é ela descobriria que para o universo ela nem existe, querendo dizer, nós humanos existimos só para nós. e tendo em vista a imensidão e a idade do universo estimada em 13,8 bilhões, nosso planeta e a raça humana podem ser extintos antes de sermos conhecidos em outras regiões do universo, ou até mesmo em nossa própria galáxia que é apenas uma dos quase 2 trilhões que nossos astrônomos estimam existir até onde nossos telescópios alcançam. Eu sou formado em administração, marketing internacional e cultura/língua/literatura americana e britânica e trabalhei na área de comércio exterior durante quase 50 anos. Mas meu fraco e meu hobby são as artes, especialmente música e literatura. Nós, brasileiros, enaltecemos com razão nossa música e nossa literatura, mas a maioria não se dá conta que a música popular britânica está 60 anos à nossa frente. Tivemos, de fato, grandes escritores e poetas, mas não podemos esquecer que na língua portuguesa os portugueses nos superaram com Camões, Fernando Pessoa e José Saramago, e este último foi o único escritor de língua portuguesa a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura. Mas na literatura, portuguesa e brasileira, ainda perdemos de longe para os britânicos como Shakespeare, James Joyce, Jane Austen, Virginia Woolf, Agatha Christie e Charles Dickens. Nós, brasileiros, costumamos contar piadinhas pejorativas sobre os portugueses. No entanto, os portugueses são muito mais mas cultos que os brasileiros. Leia esta piada contada pelos portugueses: Noé reuniu uma quantidade enorme de animais numa arca para enfrentar um dilúvio de 40 dias. Ocorre que todos animais comiam e defecavam todos os dias. Noé e sua família resolveram costurar um gigantesco saco para guardar todas a fezes. Depois de um mês, o saco ficou tão pesado a ponto de por em risco o equilíbrio da arca. Então, com muito esforço, eles conseguiram jogar este saco no mar e navegaram os 10 dias restantes com mais segurança até encontrar terra novamente. No ano de 1500, Pedro Alvares Cabral encontrou este saco de merda que cresceu em proporções continentais.    

Quando eu era criança eu cantarolava Hoje é domingo, Pede cachimbo, O cachimbo é de barro, Bate no jarro, O jarro é de ouro, Bate no touro, O touro é valente, Machuca a gente, A gente é fraco, Cai no buraco. O buraco é fundo; Acabou-se o mundo.

Agora, com 71 anos de idade completados no dia 3 de Abril, dentro de um hospital, eu canto assim Amanhã é segunda, Descola o cu da bunda, O cu é de ferro, Solta um berro, O berro é estridente, Assusta a gente, Mas a gente é valente, Tapa o buraco com rolha, Mas o cu é insistente e forma uma bolha, E não há quem não se envergonhe, De ver o cu lançar a bucha feito estouro de champanhe.

Quem canta, os males espanta!  



sábado, 4 de novembro de 2023

HUMPHREY BOGART


 Texto de autoria de AustMathr Viking Dublinense com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.

Certa vez, AustMathr viu esta foto postada no Facebook, já não lembra mais por quem, de um casebre com a placa "Consertamos Disco Voador". Logo ele pensou: "Preciso inventar uma história para esta foto, porque um dia ela será exibida no Louvre em Paris, e os guias culturais terão que explicar sua origem aos visitantes". AustMathr surtou. Ele trouxe a icônica Rota 66 americana (que ele mesmo já percorreu de ponta a ponta) para algum lugar desconhecido do Brasil. A personagem Célia, que figura no conto QUARTA PARADA de AustMathr, surtou mais ainda. Ela abandonou a meia idade e voltou à juventude psicodélica, movida a álcool e drogas, e com um estranho desejo de reminiscência de um tempo que ela não viveu. Bernardo, o marido, o mesmo de QUARTA PARADA, levou uma entortada da mulher. Para incendiar o thriller, AustMathr envolveu os misteriosos óvnis na história de uma maneira super original. O resultado é um dos contos mais engraçados que já li. O primeiro parágrafo já paga a entrada.
Gwendolyn Marie-Baxtor (vulga Inglesa Luso Chinesa) 04 de Novembro de 2023.
 
Estávamos procurando um lugar para nos abrigar do sol escaldante, aguardar o amanhecer, e rumar bem cedo para a Rota 66, para ver Casablanca. Passamos a noite num moquiço balangando como muxiba acima de uma loja de artigos de umbanda. Não pregamos os olhos. Fizemos amor quatro vezes em pouco mais de doze horas, um recorde desde os nossos tempos de adolescentes. Nos intervalos entre as transas, fumamos muito baseado. Dizem que fumar é morrer um pouco. Nós, ao contrário, passando da meia-idade, nos sentíamos redivivos. Muitas coisas mudaram em nossas vidas desde aquele mistério no cemitério da quarta parada, quando meu celular foi enterrado junto com meu amigo e passou a fazer ligações por conta própria. De debochado e incrédulo passei a ser um homem desconfiado e medroso. Ironicamente, somente o anarquismo mental da Célia não permitiu que eu me desequilibrasse emocionalmente por completo. É impressionante e inexplicável a súbita e radical mudança de comportamento e pensamento de uma mulher que era tão ciumenta e rabugenta. Ela voltou à sua juventude com outra mentalidade, e embora se mantivesse sempre fiel a mim, gosta de dizer que é uma garota-pissu, daquelas que transam com qualquer um, como se dizia nos anos 60, veste-se como uma hippie, invariavelmente com jeans desbotados, bata indiana multicolorida, flores nos cabelos, pulseiras e colares sobrepostos, bottoms de paz e amor e pés descalços. Cantarola dia e noite ao som dos The Byrds (Mr. Tambourine Man - ela pede ao homem do pandeiro para tocar uma música para ela – também conhecido como o fornecedor de drogas), Lovin´ Spoonful (Daydream - sonha acordada o tempo todo) e The Mamas & The Papas (Creeque Alley - estamos sempre chapados e o único que não emagrece sou eu). Seu apetite sexual é insaciável e não passa um dia sequer sem puxar um fumo e beber uma meia de seda (leite condensado, licor de cacau e conhaque batidos no liquidificador). Quer ser chamada de Sally, nome de uma música do The Who (Sally Simpson), e só me chama de Ernie, outro personagem da ópera rock Tommy de 1969. Como meu nome é Bernardo, pensei que fosse me rebatizar de Ben ou Bernie, mas ela prefere os nomes descolados da década de ouro. De minha antiga mulher, só sobrou uma pitada de romantismo anacrônico que não combina com seu liberalismo atual. Ela quer rever todos os filmes com atores americanos dos anos 40 como Humphrey Bogart, Cary Grant, Katharine Hepburn, Bette Davis, Greta Garbo, Lauren Bacall e muitos outros. Foi dela a ideia de tirarmos uma semana de férias e percorrermos mais de mil quilômetros desta rota submundista e circense, que mais parece um trem fantasma, e onde, segundo ela, há um vilarejo com um cinema retrô exibindo um festival de filmes com Humphrey Bogart. Vira e mexe, ela me vem com umas tiradas em inglês. Não sei onde ela aprendeu a língua com tal fluência. Ela diz que é autodidata e disso já nem duvido mais. Ela passa muitas noites em claro. Também não sei de onde ela tira tanta energia. Ela me acordou antes da aurora, com um pacau aceso. Ela sempre divide seus bagulhos comigo. Se demoro para devolver o boró ela sempre me vem com essa: ''Don´t bogart that joint, my dear, pass it over to me''. Caímos na longa vereda, dominada pelo cerrado e salpicada de arraiais, onde assistem populações mescladas e todos os tipos de biroscas e espeluncas. Passamos por um rancho de calangos, bancas de carnes negras, aquelas que vi no Paquistão, expostas ao sol e cobertas de moscas, um posto de gasolina com uma bomba movida a manivela, feira de índios redutores de cabeça e vários puteiros e pardieiros esquisitos. Logo adiante vi uma placa com o nome Rota 999. Pensei ter pego a entrada errada. Parei no acostamento e desci para conferir. Descobri que algum idiota virou a placa de ponta cabeça e ainda acrescentou à mão um terceiro número seis. Em volta da placa havia galinhas pretas sacrificadas, velas vermelhas, pratos de farofa, charutos, pinga e outras bugigangas. Levei a pinga para a Célia. 
- Onde você arrumou esse marafo,  Ernie?
- Tirei de uma macumba.
- Cacilda, esse deve ser dos bons. Would you like a hit?
- Você não acha que é muito cedo para beber, Sally? Você está queimando fumo desde ontem à noite.
- Deixa de ser careta, Ernie! Lá não tem frango?
- Tem galinha morta, mas cheirando mal. Deve estar lá há dias.
- Afinal, estamos no caminho certo?
- Sim.
- E por que aquela placa 999?
- Coisa do demônio. Inverteram a placa, como satanás faz com crucifixos nas paredes, e ainda acrescentaram mais um seis para parecer o número da besta, o 666.
- Que é isso, Ernie? Você sempre foi ateu. Tá ficando supersticioso agora?
- Deixa pra lá, Sally.
Seguimos viagem e em poucos quilômetros o motor da lambreta começou a ratear.
- Está vendo, Sally? Isso só pode ser coisa do tinhoso porque mexi na macumba e arrumei a placa.
- Não é falta de gasolina?
- Não! O tanque está pela metade.
Menos de um quilômetro mais adiante, o motor pifou de vez. Tivemos que continuar a pé, puxando a maldita motoneta.
- Sally, você que pesquisou tanto para fazer esta viagem deve saber onde se acha uma oficina neste fim de mundo, não sabe?
- Claro que sei, Ernie! Seja otimista. Vamos curtir a natureza, queimar papel de galo e aproveitar o tempo que perdemos. Uma oficina logo aparecerá. Além disso, caminhar também faz bem para a saúde e faz parte do nosso programa.
Se eu dissesse que a Célia levava jeito para médium ninguém na família acreditaria. Cinco minutos depois de caminhada, a Célia exclamou:
- Lá esta ela!
- Aquilo é uma oficina? Você leu o que está escrito na parede?
- Se eles consertam até disco voador, arrumar uma moto deve ser a maior moleza para eles.
-Você deve estar de brincadeira, Sally. Disco voador não existe. Acho que você está abusando da erva.
- Que é isso, Ernie? Fumo e cheiro numa boa, estou feliz e tão bem como nunca estive antes de dobrar o cabo da boa esperança. Agora me diga uma coisa: se dissesse a alguém que o seu celular foi enterrado junto com o defunto e que ele começou a fazer chamadas para a casa, acha que alguém acreditaria?
- Você tem razão. Não acreditaria até acontecer comigo.
- Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay. We never know, Ernie. Accidents will happen...
- Está bem, Sally, chega de provérbios. Vou bater na porta.
A porta rangeu como nas casas mal assombradas, abriu uma fresta e dela despontou a cabeça de um anão, de boca aberta, mostrando dentes navalhados, e vociferou:
- O que vocês querem?
- Boa tarde. Aqui é uma oficina mecânica, não?
- O que você acha?
- Acho que é.
- Então por que pergunta?
- É que não tem nenhuma placa, só este aviso engraçado sobre conserto de disco voador.
- Qual é a graça? Tá rindo do quê? Tenho cara de palhaço? Acha que sou um Umpa-Lumpa e que aqui é fábrica de chocolate? Cai fora!
- Espere, por favor! Não quis ofender. Desculpe-me esta infeliz observação. Vocês consertam motos?
- Sim, mas a oficina está cheia. Volte daqui a 3 meses.
- Espere, por favor. Minha lambreta pifou e não tenho onde ficar. Por favor, dê uma olhada nela. Não deve ser nada. Não vai te tomar tempo.
- O que há com esta bosta caindo aos pedaços?
- Você pode não acreditar, mas viemos de longe até aqui, e ela estava funcionando muito bem. De repente, o motor começou a falhar até parar.
- Está bem, motoqueiro de meia-tigela. Entre pela porta da garagem do outro lado da oficina
- É por lá que entram os óvnis?
- Está querendo tirar sarro com minha cara?
- Não, de jeito nenhum. Desculpe-me mais uma vez. 
- Os discos entram por cima.
- Por cima? Como?
- Você está mesmo querendo tirar uma com minha cara? Por onde entraria?
- Meu Deus, desculpe-me de novo, perguntei só para ter certeza, e não para ofender. É claro, os discos voadores voam, já diz o nome. Eles entram pelo telhado?
- Temos uma abertura no teto da oficina só para eles.
- E o piloto alienígena, como ele é? Se parece com nós?
- Não tem ninguém dirigindo o disco voador.
- Ninguém? Como?
- Cara, você é maluco? Tem algum problema? Não lê jornal, não vê TV, não navega na internet? Nunca viu um disco voador?
- Não, não tive este privilégio. Dizem que a gente vê disco voador uma vez na vida e outra na morte
- Cara, você parece ser de outro planeta. Os discos voadores estão em toda parte. Você já ouviu falar num troço chamado controle remoto?
- Claro!
- Você nunca viu um drone, voando por aí, sem piloto, tirando fotos, jogando bombas e o escambau?
- Claro que já vi.
- Então, como você imagina que uma civilização muito mais avançada que a nossa manobra suas naves? Você acha que eles empinam os discos com linha como se fossem pipas?
- Claro que não. Diga-me uma coisa: você já viu um alienígena?
- Nunca! Ver para quê?
- Quando os discos chegam aqui como você sabe onde está o defeito?
- Quando o disco chega e aterrissa, uma luz fluorescente se acende na parte com defeito e pisca palavras tais como: Acionamento de Invisibilidade Instável.
- Em português?
- É lógico, seu idiota. Se eles estão no Brasil precisam saber português!
- Como você aprendeu a consertar discos voadores? Como você os atraiu? E, principalmente, como eles te pagam?
- Espera aí, cara. Você está fazendo perguntas demais. Tá querendo roubar meu negócio? Vamos dar uma olhada nesta sua geringonça. E preste atenção: vou fazer algo que não costumo fazer para ninguém. Vou deixar você e está palhaça entrar lá dentro e...
- Epa, manera aí, pintor de rodapé. Palhaça é tua mãe...
- Seu anão, não a leve a mal. A Sally está embriagada e não pensa muito para falar.
- Eu bem que percebi que vocês são completamente matusquelas e chapados. Leva logo esta porcaria lá atrás, e entrem logo pela porta da garagem, antes que eu mude de ideia. E você, quenga, cuidado com sua língua.
- Quenga é sua mãe, seu nanico filho da puta. Vái se ferrar!
- Qual é seu nome, cara?
- Ernie.
- Ernie, esta lacraia não entra. Só você, entendeu?
A Sally já ia soltar outro palavrão. Corri e tapei a boca dela.
- Deixe-a entrar comigo, por favor. Prometo que eu a controlo. Se ela falar mais um palavrão, você pode nos expulsar.
- Está bem. Vamos acabar com isso logo que você já tomou muito do meu tempo.
Sussurrei no ouvido da Sally:
- Sally, não fale mais nada, tá? Fique na sua. Essa gozação sobre conserto de disco voador logo perde a graça. Deixa o anão falar a bobagem que quiser. Se ele consertar nossa lambreta, está bom demais. É disso que precisamos. Agora, por favor, diga sim com a cabeça e eu tiro a mão de sua boca.
Sally meneou a cabeça para frente. Fomos até a parte de trás da oficina. A garagem estava aberta, com o anão na porta nos esperando. Entramos e ficamos petrificados, como a mulher de Ló, transformada em estátua de sal. Minha extrovertida e atirada Sally, dado a trautear, de conversar com estranhos pelos cafés, e passear à noite por ruas desertas, pendurou-se em meu braço, arregalou os olhos, congelou e emudeceu. Diante do que meus olhos esbugalhados testemunhavam, aquele sinistro celular que ligava do mundo dos mortos imediatamente desabou do alto do pedestal dos mistérios entre o céu e a terra e foi parar onde deve estar até hoje: a sete palmos. Aquele biango mixuruca por fora, menor que um barracão de canteiro de obras, tinha, por dentro, outra dimensão. Maior que dez hangares de Boeing. Completamente aturdido, vi, deitados no chão, cinco discos voadores, de formatos e diâmetros variados, entre quatro a dez metros cada um. Dois deles eram exatamente como aparecem no folclore ufológico: duas bacias emborcadas e prateadas. Um era ovalado, preto perolado. Outros dois tinham formas e cores esdrúxulas: cilíndrico e fosforescente, e triangular, de coloração indefinida, aquela que chamamos de burro quando foge. Espalhados por todos os cantos do gigantesco galpão trabalhavam ativamente, pelo menos uns vinte anões. O anão chefe pegou minha lambreta e gritou:
- Yelchin!
- Sim, chefe!
- Dê uma olhada neste trambolho e vê o que dá para fazer.
- É pra já, chefe.
Embasbacado e gaguejando fui até o anão chefe.
- Você não me disse seu nome ainda.
- Você não perguntou, imbecil. É Tuffy. O que houve com sua colombina desvairada? Ela está pálida e estática que nem uma múmia?
- É pura emoção, Tuffy. Ela é muito sensível e se comove com extrema facilidade. Por acaso você tem algo para destravá-la? 
- Tenho. Dunga!
- Sim, chefe.
- Traga um pouco daquele cacaréu que encontramos dentro do disco pretinho.
- É pra já, chefe.  
O Dunga trouxe algo parecido com uma pílula, meio esverdeada. Entregou-a ao Tuffy,  e ele me pediu para enfiá-la na goela da Sally.
- Tuffy, isto aqui não é perigoso? Você já tomou?
- Perigoso é o fumo que sua quenga puxa. Não tem erro. Já tomei. É tiro e queda.
Custei para fazer a Sally tomar aquele estranho comprimido. Assim que ela o engoliu, teve um sobressalto, como um drogado que leva uma injeção de adrenalina direto no coração para não morrer de overdose. Ela parecia não se lembrar de que esteve vários minutos paralisada. Já estava irradiante e falante novamente:
- Nossa Senhora de Marijuana! Que negócio é este?
- Estamos na oficina, Sally.
- Putzgrila! Não pode ser! Essa oficina está viajando no LSD!
- Tuffy, como você explica o tamanho aqui dentro comparado ao de fora?
- Não tenho explicação. Quando os discos começaram a chegar, o espaço aqui foi aumentando gradativamente. Isso é coisa deles.
- Chefe! Estamos prontos para testar o pratinha.
- Mande todos se prepararem, Nosey. Ernie, você e sua espantalha devem tiram os sapatos e...
- Putaquipariu, este anão continua me xingando de graça. Vai tomar na peida, seu filho da p......
- Dona boqueira, ou você se retrata, ou te dou um pé na bunda pra fora daqui. 
- Se acalme Sally, eles já estão consertando nossa lambreta. Vamos fazer o que o Tuffy nos pede, está bem?
- Se este anão me xingar mais uma vez eu que vou dar uma porrada na fuça dele.
- Tuffy, deixa pra lá, por favor. Você nos pediu para tirar os sapatos. Para quê?
- O Nosey consertou o pequeno disco prata que estava com problema no dispositivo antigravidade e agora precisa testar para ver se está funcionando. Você e sua chincheira devem calçar estes sapados magnetizados e se posicionarem em cima destas chapas de metal no chão.
A Sally já estava soltando outro palavrão. Tapei a boca dela rapidamente. O Tuffy me entregou uma corda e um cabresto e me pediu para imobilizar a Sally. Na hora, achei um exagero e até me indispus com o ele. Só depois do teste entendi que ele não estava retaliando, mas, ao contrário, livrando nossa barra. Ela esperneou e jurou com os olhos que iria esganar o anão. Ele nos ajudou a calçar os sapatos e nos colocou sobre a chapa de metal. Ficamos literalmente grudados. Não podíamos dar nenhum passo. Em seguida, o Tuffy  deu sinal ao Nosey para iniciar o teste. De repente, o disco prata começou a flutuar. O ambiente todo entrou em gravidade zero. Os outros discos, alguns carros, motos e bicicletas, assim como bancadas e móveis estavam todos ancorados ao chão com correntes. Somente algumas ferramentas estavam soltas e flutuando. Eu e a Sally estávamos atônitos ao ver tudo aquilo acontecendo diante de nossos olhos. O que havia de mais inimaginável ainda estava por acontecer. O Tuffy, calçando um sapato de metal super pesado o suficiente para mantê-lo preso ao chão, veio até nós, desamarrou a Sally, tirou nossos calçados, nos deu um empurrão pelas costas e gritou:
- Saiam voando, seus paus-d'allambas! 
Tuffy resolveu se divertir comigo e a Sally. Flutuamos pelo recinto, e experimentamos a incrível sensação que os astronautas têm no espaço sem gravidade. Voávamos para lá e para cá como pássaros. A Sally parecia uma criança. Dava cambalhotas, piruetas, ria sem parar, de tanta alegria. Ficamos à deriva uns cinco minutos. O disco de prata começou a girar em tono de si, sem um barulhinho sequer. Aliás, o silêncio no galpão era absoluto, só rompido pelas gargalhadas da Sally. Acho que é isso que dizem que os discos provocam quando estão perto de nós: o som de silêncio. O Tuffy nos pediu para descermos e ficarmos sentados no chão porque a gravidade estava prestes a voltar. O enorme teto solar se abriu e o disco saiu como um rojão, numa velocidade alucinante. As ferramentas que estavam suspensas caíram imediatamente. O Tuffy falou com um de seus funcionários:
- Brainy, recolha tudo que está espalhado pelo piso e coloque no lugar.
- É pra já, chefe!
Em seguida, Tuffy falou com o anão que consertava nossa lambreta.
- Yelchin, está porra não está pronta ainda?
- Sim, chefe, quando o pratinha começou a girar a lambreta deu partida sozinha.
- Dê uma volta lá fora e acelere ao máximo.
- É pra já, chefe.
Yelchin saiu pilotando nossa lambreta e voltou cinco minutos depois.
- Chefe, está 100%.
- Que velocidade atingiu? 
- Chegou a 200, chefe.
O Tuffy veio até nós.
- Agora vocês podem pegar esta coivara e se mandar daqui.
- Quanto foi o conserto, Tuffy.
- Nada!
- Sério?
- Sim.
- E aquela pílula alienígena?
- É de graça! Querem mais? Tem um monte aqui. Temos também uma outra amarelada que sua maluquinha vai gostar.
Desta vez, a Sally não se ofendeu. Estava comportadinha e até falou mansinha com o Tuffy.
- Que efeito provoca?
- Tome apenas uma e você se sentirá mais poderosa do que a mulher maravilha tendo um orgasmo.
- Como você sabe disso?
- Eu já experimentei uma.
- Toma sempre?
- Não. Evito isso.
- Por quê?
- A gente sai fora da realidade e entra no mundo deles. 
- Como você sabe disso se nunca viu um deles? São estas pílulas que dão poderes a eles?
- Não. Eles não precisam destas pílulas. Acho que eles as usam para testar em nós.
Entrei na conversa.
- Tuffy, como já disse, não quero roubar seu negócio. Só quero que você me responda uma coisa: se eles são assim tão adiantados, por que eles não são capazes de consertar seus discos sozinhos?
- Eles não precisam de nós. Acho que o que eles fazem com nossa oficina deve ser parte da agenda deles aqui na terra. Uma experiência. Eu nunca vi um deles, mas sinto que eles estão sempre por perto, observando nossas reações.
Depois dessa revelação, chamei a Sally para ir embora. A Sally pediu as pílulas amarelas ao Tuffy. Ele nos deu uma caixa com mais de 500 e nos advertiu para não abusarmos delas.
- Tuffy, você sabe onde fica o vilarejo onde há um festival de filmes de Humphrey Bogart?
- Está a uns 100 km daqui.
Tratei de ir embora. Disse a Sally que deveríamos nos apressar para chegar antes do anoitecer. Agradeci o Tuffy pela sua gentileza. A Sally fez o mesmo, desta vez bem boazinha e educadinha. O Tuffy parou de provocar a Sally e pediu a ela para ter cuidado. Pegamos a Rota 66 em direção ao vilarejo. A lambreta estava com um desempenho extraordinário. 200km por hora! Incrível! De repente, a Sally voltou a me chamar pelo meu nome.
- Bernardo, sabe de uma coisa, ao invés de ir ao vilarejo hoje, eu gostaria de voltar àquele motel e deixar para ver Casablanca amanhã. 
- Aconteceu alguma coisa, Célia?
- Não, Bernardo. Está tudo bem. É que tivemos um dia inusitado. Toda aquela loucura dentro da oficina me deixou muito mais agitada do que a maconha. Eu quero descansar um pouco, dar um tempo para digerir toda aquela estranheza e doideira que vivenciamos naquela oficina comandada por anões. E mais ainda, consertando discos voadores que sempre pensei que eram pura lorota de gente que não tem o que fazer.
- Está bem, Célia, vamos voltar. Aquele pulgueiro não está longe daqui e com nossa motoca agora viajando nesta velocidade espantosa, chegaremos logo.
Passamos pela oficina, chegamos ao motel. Tomamos um banho e fomos para a cama.
- Bernardo, liga a TV!
- Será que pega algum canal aqui, neste lugar tão desolado. E esta porcaria de TV de tubo, sem controle remoto. Será que funciona? Puta merda, foi só eu falar e ela ligou sozinha.
- Olha só, Bernardo, está passando Jeannie é um gênio. Eu gostava muito desta série.
- Eu prefiro mais filmes dos tempos atuais e futuristas.
- Vou experimentar uma daquelas pílulas amarelas.
- Cuidado, Célia.
- Cacete! Que sensação agradável. É impressionante. Mal bateu no meu estômago e parece que estou viajando. Me sinto uma deusa. Capaz de fazer o que eu quero. Estou, finalmente, realizada na vida com esta droga dos anões. Para completar, só falta ver aquele festival do Hamphrey.
Assim que a Sally proferiu estas palavras, a programação da TV foi interrompida e, em seguida, anunciou um festival de filmes de Hamphrey Bogart, começando por Casablanca. A Célia voltou a ser a Sally.
- Puta merda, Ernie. Foi só pensar no Hamphrey e olha só!
A Célia, ou melhor, a Sally acendeu um baseado e o dividiu comigo. Passamos dois dias deitados na cama, sem dormir, e assistimos a trinta e sete filmes do Bogart, um atrás do outro, até que a Sally, finalmente, caiu no sono. Quer saber de uma coisa, pensei, vou experimentar uma destas amarelinhas. Assim que ela bateu no meu quengo a TV anunciou um antigo filme de 2057, com atores que nunca vi na minha vida. O nome do filme era A OFICINA MÁGICA.