Texto de autoria de AustMathr Viking Dubliner e Inglesa Luso-Chinesa com direito autoral protegido pela Lei 9610/98.
De vez em quando, Ainda vejo
no espelho, A alma de menino em meus olhos, E quase sempre o reflexo de cabeça
branca, Carquilhas demarcando as fronteiras do rosto, Os ombros um pouco
retacos, Como negro acostumado a bolear o fardo da vida, As sacas de café e
batatas nos ombros portuários, E aos poucos, As madeixas vão lentamente se
perdendo, Preparando-se para setenta e uma primaveras, Mas ainda não para
serem assentadas, Meu coração ainda fervente, Mantém membro e bagos em elevada
temperatura, Com poucos cabelos na mão, De meu amor a paixão em latente ardência
de verão de Fevereiro, De sol, Praia e suores, Penetra-lhe com suave calor suas
carnes, Como de braceletes o ouro em brilho quente, Morde-lhe com volúpia seus
lisos braços, Domina-lhe os nervos, Entra-lhe como vento por uma janela largada
aberta, Sacode-lhe frouxamente as cortinas, Até que um dilúvio de luz cai do
alto de sua fronte como pano sobre o palco do teatro de nossas existências e
cega-me, E às vezes me perco, Como me perdi com menos de trinta e perguntava se,
Quando tivesse meia quatro, Você ainda precisaria de mim, Cuidaria de mim, E me via
como um homem útil, Capaz de trocar uma lâmpada, Você tricotando junto à
lareira, Fazendo piquenique e jardinando aos domingos, Com netos sentados no
colo à tarde, Mas continuo o mesmo soldado desde o dia que nasci, Seu aliado em
guerra contra a aversão do mundo mais de seis décadas afora, Desalojado das
trincheiras, Mantido no front modorrento, Nublado de fumaça asfixiante,
Tresandando corpos putrefatos, Um inferno sufocante, Numa batalha desigual e
solitária, E por saber ainda como manter o nariz fora d´água, Inalar ares finos
e puros que adentram a alma, E nela espalhar obstinação e força, Por ser
árvore que se verga ao peso de mágoas excruciantes, Sem ter um único galho
quebrado, Por não me defender com armas convencionais e letais, Que mutilam e
matam, Sou cunhado como uma incômoda e sintética moeda desumana, Que insiste em manter-se em circulação.