sexta-feira, 12 de maio de 2023

ALICE



Texto com direito autoral protegido pela Lei 9610/98

Pequena mãe órfã de um grande filho, De coração deportado, Você precisa saber que no meu mundo tornei-me apenas um maltrapilho, Com espírito aquebrantado, Minha indignação foi não ter vivenciado à plenitude todos os seus dias, Não só este estranho esquecimento é imperdoável, Mas até pode ser providencial e premeditado, Se Deus padeceu-me da moléstia que oblitera a memória, Então dê-me seus pequenos pés para calçá-los, Dê-me seus pequenos pés para beijá-los, Minha pequena tia engrandecida por uma nobre alma, De espírito inconformado, Na encruzilhada de nossos mundos só pude bater-lhe palma, Com contentamento deslembrado, Seu silêncio que parece ser eterno deve ter sido votado em prol de minha liberdade, Seu paradeiro, Revelai-me, Se quiser e puder, A seu tempo, Seu hospedeiro, Deixai-o ao seu discernimento, Você pode ter perdido a direção, Mas não se arrepende desta inexplicável danação, Agora tenho novos cadernos para você ensinar-me a escrever meu nome, Tenho novos cadernos para você gravar a lembrança que não some, Minha pequena avó órfã de um grande neto, De humildade sem igual, Perdi para o seu mundo nosso melhor e único afeto, De entrega incondicional,  Minha redenção só pode ser alcançada com suas deficiências de nascença, Com sua repentina e sinistra premonição, Consequência oportuna de um destino encoberto, Que foi, Em suma, A razão pela qual sua prostração ao chão em agradecimento, Congênita à grandeza de uma mulher corajosa e inseparável dela, Não podia querer estancar a morte no momento em que traga-se a dor, Degrada-se o temor, E subleva-se o amor, Então dê-me seu pequeno colo para me recostar porque ainda não passei de uma criança, Dê-me seu pequeno colo para cochilar porque ainda preciso sonhar com minha infância, Minha pequena irmã, Você precisa saber que ainda tenho dentro de mim sua última bênção, Tenho dentro de mim toda sua solidão.





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