sexta-feira, 19 de maio de 2023

O DIVISOR DE ÁGUAS MUSICAIS

Texto de autoria de Alceu Natali. Direito autoral protegido pela Lei 9610/98. LEIA O TEXTO AO SOM DA MÚSICA DO VÍDEO POSTADO NO FIM. Sem ela, a vida seria um erro (Friedrich Nietzsche)

Bette Midler, americana, cantora, atriz, modelo e comediante, fazia faculdade no Havaí quando começou a ouvir os Beatles pela primeira vez. Ela se interessou pela música deles, mas não ficou muito entusiasmada. No entanto, se extasiou quando ouviu o álbum RUBBER SOUL. No verão de 66, ela estava trabalhando com um tipo de grupo itinerante de atores e o gerente de palco tocava o RUBBER SOUL dia e noite. E este álbum acabou por conquistar a Bette, liberou algo em sua imaginação que ela nunca tinha vivenciado na música popular. Ela se lembra disso como se fosse ontem. Bette confessou que se rendeu ao talento dos Beatles com este álbum, porque ele era uma avassaladora onda de entusiasmo e ideias originais. Depois desta experiência com RUBBER SOUL, Bette resolveu abandonar o teatro, começou a cantar em bares e tornou-se uma cantora e compositora. Ela  nunca foi do tipo de pessoa de se engajar em qualquer modismo passageiro. Mas os Beatles eram diferentes. Vieram para ficar para sempre. Eles tinham algo mais e a dominaram. Bette sempre ficava na defensiva, porque era cínica. Ficava à margem de tudo, só observando. Nunca se entregava ao fascínio de figuras populares. As celebridades eram sempre maquiadas com uma grossa camada de artificialismo. Mas os Beatles não. Eram autênticos. E vejam só, hoje ela é uma celebridade no mundo, por causa de RUBBER SOUL, por causa dos Beatles. Enquanto isso, um garoto de apenas 15 anos, aqui no hemisfério sul, já sacava o que a celebridade do norte não percebeu. Os Beatles eram um divisor de águas. Com o aparecimento deles a música passou a ser dividida em dois tipos: antes e depois dos Beatles. Cada vez que ele ouvia RUBBER SOUL ele não tirava os olhos da capa do álbum, procurando algum aspecto singular que a diferenciasse das demais. Será que são estes narizes alongados por entre os olhos? Eles parecem ser diferentes dos outros seres humanos! E os Beatles criaram um divisor de águas em sua própria música. Seus cinco primeiros álbuns marcaram a chegada deles à lua, com composições cativantes, românticas, de letras ingênuas que enlouqueciam as adolescentes. Mas eles queriam ir mais longe, muito mais longe, ir até a Marte. Mas como fazer esta transição sem privar a juventude feminina das cantigas de amor acostumadas ao luar? Como empreender uma viagem mais longa e arriscada sem comprometer a popularidade que conquistaram? Resolveram fazer um teste: mesclar baladas fáceis de serem lembradas e cantadas com letras e arranjos mais complexos, mais intelectuais, mais introspectivos, mais estranhos que Marte. E esse garoto aqui, menor de idade, já enxergava tudo isso. HELP é o último álbum romântico. RUBBER SOUL marca a transição do romântico para o psicodélico que começou com o insuperável REVOLVER. É por isso que o boy achava um barato John cantar a lírica e melosa GIRL e, ao mesmo tempo, a enigmática NORWEGIAN WOOD. Ele conseguia perceber a enorme diferença entre a inocente YOU WON’T SEE ME e a poderosa DRIVE MY CAR de Paul. E se todos sacaram o que o adolescente brasileiro descobriu em tenra idade sabem que os Beatles não foram só a Marte, mas deixaram o palco dos planetas internos e externos e acabaram saindo do sistema solar.

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