Texto de autoria de Alceu Natali com direito autoral protegido pela Lei 9610/98. LEIA O TEXTO AO SOM DA MÚSICA DO VÍDEO POSTADO NO FIM. Sem ela, a vida seria um erro (Friedrich Nietzsche)
Minha homenagem à pequena cidade de Itobi, SP, onde passei os mais felizes Natais e Anos-Novos de minha infância e pré-adolescência. Dedicado aos meus padrinhos Antonio e Isabel, e meus primos Toninho, Maria da Penha, José Urbano(in memorium) e Ênia.
A estrada que leva a vastos
horizontes, Aparentemente familiares, Mas de eternas singularidades, É longa e
infindável, Deixa o infinito para trás, E cada vez que parece ir de encontro ao
céu, Desce como Odisseu ao Hades, Mas para aprender com as almas, E não ser por
elas sentenciado, E rapidamente ela retorna terra a terra, Ainda abrangendo num
mar verdejante o ímpeto retilíneo da ânsia de chegar a algum lugar, E se chega,
Quando se procura, Se desvia e se desce lentamente, Até o que parece ser um lago
como o Aquerúsia, Por onde passam todos pecadores, E de onde saem todos os
perdoados, E logo percebe-se que o paraíso não é diferente do mundo, Com
lugares ruins, Bons, Melhores, Especiais, E únicos, Como o mais sagrado de todos
os santuários, Que pode ser adentrado somente pelo suprassumo dos homens num dia
de arrependimento, Do bom e do melhor, Do ruim e do pior, Todos são comuns, E o
homem comum deles se enfada e até padece, Mas o homem anormal e passional os
engrandece, Com todos hiperbolismos orientais, E a rua principal torna-se tão
interminável quanto a rodovia, Mas outras locações têm espírito mais que o comum
das percepções humanas, Como o bar da esquina, Que marca o limite norte do local
das delícias criado por deus, E que, Irônica e paradoxalmente, É mais santo que
a igreja, No outro extremo, Delimitando a fronteira sul, E além dela parece
existir um umbral, Literal, Sem almas vivas ou mortas, Ao contrário do que se
acha além-bar, Uma trilha percorrida por bicicleta, Onde no meio do trajeto,
Numa paragem de pomar de frutas negras, Farta-se dos pecados originais, Farta-se
da vida, E depois busca-se o além que aterra, Lá na quietude do fim do caminho,
E é novamente a partir do bar que se chega a outro rincão, No sentido leste,
Subindo a mesma alameda larga e íngreme, Aquela que se abre subitamente como uma
janela no meio do nada, E faz nascer, Milagrosamente, Uma pequena cidade que os
olhos abertos na rota não alcançam, Uma cidade de paz lunar e eternidade, Que o
homem incomum segue, A olhos fechados, Arrastado para um abismo, Este outro
recanto parece um recôndito, Mas quando se atravessa seu alto portão,
Descortina-se um enorme ginásio grego, A céu aberto, Reservado somente aos
másculos, Onde a paixão pelos jogos, Precedidos por uma expectativa messiânica,
Faz o coração saltar palpitando pelos olhos, Imortaliza, Como o amor entre Romeu
e Julieta, Quem lá pratica esporte vence sem derrotar o adversário, E tudo mais
nele se esgotaria, Se do que aqui se fala não fosse o paraíso, Que tem entre o
que deveria ser profano e o que deveria ser sagrado, Um ponto de encontro, Só
para ocasiões especiais, Para dançar as pernas em bailes, Para dançar a alegria
em festas de casamento, Para se comungar diretamente com a felicidade num estado
de alma poético, Quase religioso, Quase metafísico, Mas é o bar quem insiste em
monopolizar, Bem à sua frente está o jardim do Éden, Com todos descendentes de
Adão e Eva andando em círculos, Entreolhando-se quando se cruzam, O sorriso
implícito do sexo frágil, Correspondendo ao gracejo explícito do quase
inquebrável, A cidade inteira parece lá se reunir todas as noites, Caminhando em
volta do centro, Onde o coreto está vazio, Onde Deus não é visto, Onde a árvore
com o fruto proibido desaparece, E Baco e suas Bacantes não atrevem-se, Porque
este território fértil em seres simplórios pertence aos carregadores de tirso,
Mas suas lanças são muito curtas, E no lugar de heras e pâmpanos, Suas pontas
sustentam os frutos congelados com mãos caseiras e santificadas, Que vêm lá do
bar, E no recesso menos distante, Abaixo do jardim, Que fecha a cidade no lado
Oeste, Os trilhos estão adormecidos nos dormentes, A estação está vazia, Mas não
solitária, Fecha-se ao silêncio, Mas seu íntimo abre-se às lembranças de todos
que nela desceram e dela partiram, E todos espectros saudosos que fizeram
passagem, Por ela ainda são acolhidos com a mesma hospitalidade, E o bar, Aqui
tanto referido, É, Na verdade, Somente a fachada de um templo, Um ponto de
intercâmbio, De gente, De prazeres, Os adultos trocando dinheiro por aguardente,
E os jovens por guloseimas, E quem está por trás das bancas serve e sorri por
comprazer, E se deixa levar pelos olhares maravilhados sem se preocupar que vai
para onde o impelem, A única moeda de troca aqui é a cordialidade, O templo é
enorme, Suas noites de paz celestial são de tirar o folego de Deus, Suas manhãs
gloriosas são regadas por mesa farta e uma hóstia, Do tamanho de uma broa,
Abençoada com a palavra generosidade ao ser servida, Seu pomar tem o chão
forrado de frutas que caem da árvore preferida, E a maior tentação é subir até o
último galho para apanhar a fruta que quer sair voando pelos ares, Lá sentar, Se
lambuzar, E delirar com uma vida airada, E um de seus vários aposentos,
Improvisado de depósito de bebidas e outras tranqueiras, Nada tem de especial,
Mas retém pessoas por horas, Encanta, Porque lá parece ser o lugar onde a magia
dorme, E muitos dormem com ela, Outros, Porém, Precisam partir, Porque o paraíso
é uma democracia, Chega, Fica e se vai quem quiser, Nasce, Cresce e morre nele
quem quiser, E os que estão só de passagem fazem uma pergunta que Deus não sabe
responder: Para onde vão os que morrem no paraíso?
Boa pergunta!!!!Quando alguém souber a resposta peço que me informe!Parabéns pelo riquíssimo texto!Beijossss
ResponderExcluirSábias palavras. Amei!
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